Nossa Senhora de Paris! Notre Dame de
Paris! Ou simplesmente Notre Dame. O mundo incrédulo ouviu que Notre Dame
estava a arder. Depois viu na televisão. Era mesmo verdade. Amigos telefonavam.
Não se acreditava até se ligar a T.V. e ver, claramente visto, que era mesmo
verdade. Vermos a Catedral, a Notre Dame, roída pelas chamas, ver a sua flecha
com as labaredas subindo lentamente, como se alguém fosse trepando por ela
acima! Finalmente ver o pináculo dobrar-se, inclinar-se e cair! Não era um
filme de ficção. Era um filme de horror, mas da vida real.
Oitocentos anos de História a serem
consumidos pelas chamas! A torre central, que se erguia para o céu, como duas
mãos unidas em prece, agora, aparece-nos decepada. Metáfora do mundo atual?
Talvez.
Mas a Catedral, que sempre congregou
milhares, continuou com milhares à sua volta, solidários com o seu sofrimento.
Milhares que choravam, rezavam, cantavam, num uníssono de fé e de esperança,
muitos de joelhos. E isto numa França profundamente secularizada, em que o laicismo
é um dos valores da república, onde muitas manifestações de religiosidade são
proibidas em público.
Perto da Catedral, há um restaurante,
misto de cabaré antigo e de piano-bar, que já se encontrava cheio à hora do
incêndio. Nessa noite, a música foi outra: cerca de trinta pessoas, de joelhos
sobre o asfalto, de mãos postas, olhos fechados, cantavam Ave-Marias. E ninguém
se ria. Todos respeitavam ou juntavam-se ao grupo.
Outro grupo optou por cantar a Salve
Rainha, em latim, para que todos, independentemente da língua, pudessem
acompanhar. Um grupo de pessoas mais idosas vem cantar Chez nous soyez reine,
que podemos traduzir por Sede a nossa rainha.
Nossa Senhora de Paris! Todas as catedrais
de França são chamadas apenas pelo nome da cidade: Catedral de Chartres,
Catedral de Reims, Catedral de Poitiers e tantas outras. Mas a Catedral
de Paris introduziu a invocação especial da Mãe de Jesus, confiando-lhe a
proteção da cidade.
E assim aconteceu ao logo da História.
Paris viveu cinco anos sob a terrível
ocupação nazi. Depois do desembarque das tropas aliadas na Normandia, Hitler
deu ordem ao Comandante Von Choltitz, que governava Paris, para que destruísse
a cidade, o que atrasaria um pouco a derrota da Alemanha nazi. Choltitz
desobedeceu e não houve destruição alguma. Nossa Senhora de Paris salvou a sua
cidade. E salvou a sua Catedral: ela ficou ferida mas de pé.
Notre Dame está situada numa ilha natural
no meio do Sena, com o formato de um barco à vela. O brasão da cidade, que é
tão antigo como a Catedral, é um barco sobre mar encapelado, com a inscrição em
latim: Fluctuat nec Mergitur , que podemos traduzir por Flutua mas
não se afunda.
E daqui a
cinco anos teremos novamente Notre Dame em todo o seu esplendor e beleza.
Cecília Rezende
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