Apelo de Roma pela Paz
Porque hoje a paz é gravemente violada, ferida e espezinhada, “a nossa oração tornou-se um ‘grito’”, afirmou o Papa Francisco na oração final do ato de culto realizado no Coliseu, no encerramento do encontro convocado pela Comunidade de Santos Egídio em que participaram três chefes de Estado e alguns dos mais altos representantes das várias religiões. Estes assinaram o “Apelo de Roma pela Paz”, em que se lê: “As religiões são e devem continuar a ser uma grande fonte de paz. A paz é sagrada, a guerra nunca pode ser sagrada!”.
Ao fim da tarde de dia 25 de outubro, o ato de oração protagonizado por diversos líderes de várias religiões concluiu o Encontro Internacional de Diálogo e Oração pela Paz entre as Religiões do Mundo que a Comunidade de Santo Egídio promoveu entre 23 e 25 de outubro. Na sua intercessão, Francisco rezou: “No silêncio da oração, esta noite, ouvimos o clamor pela paz: a paz sufocada em muitas regiões do mundo, humilhada por demasiada violência, negada também às crianças e aos idosos, que não são poupados da terrível dureza da guerra. O clamor pela paz é muitas vezes silenciado não apenas pela retórica da guerra, mas também pela indiferença. É silenciado pelo ódio que cresce enquanto lutam entre si.”
“Mas a invocação da paz não pode ser suprimida – continuou o Papa –, nasce do coração das mães, está escrita nos rostos dos refugiados, das famílias em fuga, dos feridos ou dos moribundos. E este grito silencioso sobe ao céu. Não conhece fórmulas mágicas para sair dos conflitos, mas tem o sacrossanto direito de pedir a paz em nome dos sofrimentos vividos, e merece ser ouvido. Merece que todos, começando pelos governantes, se inclinem para ouvir com seriedade e respeito. O clamor pela paz expressa a dor e o horror da guerra, mãe de toda pobreza.”
Francisco recordou ainda o apelo de São João XXIII em 1962, durante a “crise dos mísseis” que parecia precipitar o mundo na guerra nuclear: “Pedimos a todos os governantes que não permaneçam surdos a este grito de humanidade. Que façam tudo o que estiver ao seu alcance para salvar a paz”, para acrescentar: “Sessenta anos depois, estas palavras soam com uma impressionante relevância. Faço-as minhas. Não somos neutros, mas sim alinhados pela paz. Por isso, invocamos o ius pacis [Direito de Paz] como direito de todos para resolver os conflitos sem recurso à violência”
Apelo de Roma: trabalhar pela paz de todas as maneiras possíveis
Da mesma urgência na construção da paz partilha a declaração final da Assembleia Mundial de líderes das religiões do mundo, “Grito pela Paz”, formada por todos os responsáveis religiosos que participaram nestes dias de encontro promovido pela comunidade de Santo Egídio. Lê-se no “Apelo de Roma pela Paz” que foi lido e assinado no Coliseu: “Estamos diante de uma encruzilhada: ser a geração que deixa morrer o planeta e a humanidade, que acumula e comercializa armas na ilusão de se salvar dos outros, ou então a geração que cria novas formas de convivência, não investe em armas, abole a guerra como instrumento de resolução de conflitos e põe termo à exploração anormal dos recursos do planeta.”
Para além desta constatação dramática, o apelo refere diretamente a responsabilidade dos crentes: “Nós, crentes, devemos trabalhar pela paz de todas as maneiras que nos seja possível. (…) Infelizmente, mesmo entre nós, às vezes dividimo-nos, abusando do santo nome de Deus: pedimos perdão, com humildade e vergonha. As religiões são e devem continuar a ser uma grande fonte de paz. A paz é sagrada, a guerra nunca pode ser sagrada! A humanidade deve acabar com as guerras ou será a guerra que acabará com a humanidade. (…) Vamos reabrir imediatamente um diálogo sério sobre a não proliferação nuclear e o desmantelamento de armas nucleares.”
Pela sua importância, reproduzimos na íntegra o “Apelo de Roma pela Paz” (tradução do 7MARGENS):
APELO DE ROMA PELA PAZ
Reunidos em Roma no espírito de Assis, rezámos pela paz, segundo as várias tradições, mas em concordância. Agora nós, representantes das Igrejas Cristãs e das religiões mundiais, voltamo-nos para o mundo e para os líderes dos Estados. Damos voz àqueles que sofrem com a guerra, dos refugiados e das famílias de todas as vítimas e dos caídos. Com firme convicção dizemos: chega de guerra! Vamos parar todos os conflitos. A guerra traz apenas morte e destruição, é uma aventura sem retorno em que todos somos perdedores. Calem-se as armas, declare-se imediatamente um cessar-fogo universal. Ativem-se de imediato negociações capazes de levar a soluções justas para uma paz estável e duradoura, antes que seja tarde demais. Reabra-se o diálogo para cancelar a ameaça de armas nucleares.
Após os horrores e dores da Segunda Guerra Mundial, as Nações puderam reparar as profundas lacerações do conflito e, por meio de um diálogo multilateral, fazer nascer a Organização das Nações Unidas, fruto de uma aspiração que, hoje mais do que nunca, é uma necessidade: a paz. Que não se perca agora a memória do que é a tragédia da guerra, mãe de toda pobreza.
Estamos diante de uma encruzilhada: ser a geração que deixa morrer o planeta e a humanidade, que acumula e comercializa armas, na ilusão de se salvar dos outros, ou então a geração que cria novas formas de convivência, não investe em armas, abole a guerra como instrumento de resolução de conflitos e põe termo à exploração anormal dos recursos do planeta.
Nós, crentes, devemos trabalhar pela paz de todas as maneiras que nos seja possível. É nosso dever ajudar a desarmar os corações e apelar à reconciliação entre os povos. Infelizmente, mesmo entre nós, às vezes dividimo-nos, abusando do santo nome de Deus: pedimos perdão, com humildade e vergonha. As religiões são e devem continuar a ser uma grande fonte de paz. A paz é sagrada, a guerra nunca pode ser sagrada!
A humanidade deve acabar com as guerras ou será a guerra que acabará com a humanidade. O mundo, nossa casa comum, é único e não nos pertence a nós, mas sim às gerações futuras. Portanto, vamos libertá-lo do pesadelo nuclear. Vamos reabrir imediatamente um diálogo sério sobre a não proliferação nuclear e o desmantelamento ase armas nucleares.
Vamos recomeçar juntos a partir do diálogo que é remédio eficaz para a reconciliação dos povos. Invistamos em todas as formas de diálogo. A paz é sempre possível! Não mais a guerra! Nunca mais uns contra os outros!
Roma, 25 de outubro de 2022
[lida e assinada no final da Assembleia Mundial de líderes das religiões do mundo, “Grito pela Paz”]
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