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sábado, 8 de outubro de 2022

Activista bielorusso e organizações russa e ucraniana distinguidos

 | 7 Out 2022

Os laureados com o Nobel da Paz 2022 na página do Comité Nobel: Ales Bialiatski (Bielorrússia), Memorial (Rússia) e Centro para as Liberdades Civis (Ucrânia). Ilustração © Niklas Elmehed/Nobel Prize Outreach

 

O activista bielorrusso preso Ales Bialiatski, a organização russa Memorial e o Centro Ucraniano para as Liberdades Civis, que trabalham todos na defesa dos direitos humanos, foram os escolhidos pelo Comité Nobel como laureados deste ano para o Prémio Nobel da Paz. Um prémio que distingue claramente a luta pela democracia, direitos humanos e paz, no contexto da guerra provocada pela invasão da Ucrânia pela Rússia, em Fevereiro.

Ao anunciar a decisão, o Comité elogiou o “esforço notável para documentar crimes de guerra, violações dos direitos humanos e o abuso de poder”, protagonizados pelos três laureados nos respectivos países. “Há muitos anos que promovem o direito de criticar o poder e proteger os direitos fundamentais dos cidadãos.”

O Comité Nobel, seguido de organizações como a Amnistia Internacional, apelou também às autoridades bielorussas que libertem imediata e incondicionalmente Bialiatski, preso há mais de um ano pela sua defesa da democracia no país.

A notícia mereceu uma reacção positiva do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), cujo director da Comissão para os Assuntos Internacionais, Peter Prove, reflectiu que, em situações de conflito e opressão, o espaço para o envolvimento e acção da sociedade civil em prol dos direitos humanos é frequentemente uma das primeiras vítimas. Por isso a atribuição do Nobel da Paz 2022 a Bialiatski, Memorial e Centro para as Liberdades Civis é “um importante reconhecimento da importância crítica de manter e proteger o espaço para os actores da sociedade civil para os direitos humanos, especialmente em situações tão difíceis”, afirmou.

O responsável do CMI apelou ainda às igrejas membros do Conselho – mais de 350 comunidades protestantes, anglicanas e ortodoxas, na sua maioria – a que apoiem e encorajem “o trabalho dos defensores dos direitos humanos, a reconhecerem e a abordarem a experiência das vítimas de violações dos direitos humanos em todo o mundo, incluindo especialmente em situações de conflito violento“.

Quem porventura não ouviu o apelo foi o Patriarca Cirilo, da Igreja Ortodoxa Russa, que preferiu saudar o Presidente russo, que nesta mesma sexta-feira, 7, completa 70 anos. Para este líder religioso, Putin foi mandatado por Deus para governar o país.

“Deus colocou-o no poder para que pudesse desempenhar um serviço de especial importância e de grande responsabilidade pelo destino do país e do povo confiado aos seus cuidados”, disse o patriarca, citado pelo jornal independente The Moscow Times.

Cirilo louvou ainda Putin por “transformar a imagem da Rússia, reforçando a sua soberania e a sua capacidade de defesa, protegendo os seus interesses nacionais” e apelou aos crentes de todo o país para que rezem pela saúde do Presidente.

No Vaticano, embora não haja ainda qualquer comentário oficial, o jornal L’Osservatore Romano referiu-se à atribuição do Nobel como “um prémio aos defensores dos direitos humanos na Bielorrúsia, Rússia e Ucrânia”.

O Papa e o Vaticano têm mantido pressão sobre a Rússia e a Ucrânia no sentido de pôr fim à guerra. Ainda no último domingo, Francisco fez um apelo desesperado nesse sentido. [ver 7MARGENS]


Guterres: “O oxigénio da democracia”


Nas Nações Unidas, o secretário-geral António Guterres afirmou que os defensores dos direitos humanos galardoados este ano com o Prémio Nobel da Paz representam “o oxigénio da democracia”. Numa mensagem de felicitações aos três vencedores, Guterres disse que “o reconhecimento deste ano chama a atenção para o poder da sociedade civil para promover a paz”.

“Os grupos da sociedade civil são o oxigénio da democracia e catalisadores da paz, do progresso social e do crescimento económico.  Eles ajudam a manter os governos responsáveis e levam as vozes dos vulneráveis para os corredores do poder”, acrescentou Guterres, citado na página da ONU.

Agnès Callamard, secretária-geral da Amnistia Internacional (AI), reagiu à notícia do Prémio dizendo que o Comité enviou, com esta decisão, “uma mensagem importante ao mundo: que deve apoiar os defensores dos direitos humanos que demonstraram um esforço notável para documentar crimes de guerra, violações dos direitos humanos e abuso de poder nos seus países”. A mensagem, acrescentou, “é enviada num momento crítico em que a contínua agressão russa conduziu a uma crise dos direitos humanos de proporções incríveis na Ucrânia, e da repressão de qualquer forma de dissidência na Rússia e na Bielorrússia”.

Callamard referiu depois cada um dos laureados: “Esta é também uma mensagem de solidariedade. Desde Julho de 2021, Ales Bialiatski, pioneiro dos direitos humanos na Bielorrússia desde meados da década de 1980, tem estado atrás das grades pelo seu trabalho pacífico documentando, entre outras coisas, a repressão da dissidência na sequência das disputadas eleições presidenciais de 2020. A Memorial, uma das mais antigas organizações russas de direitos humanos, foi encerrada pelas autoridades russas no final de 2021, e o Centro de Liberdades Civis tem documentado os crimes de guerra russos na Ucrânia desde 2014 e continua o seu trabalho na Ucrânia, apesar da guerra de agressão em curso na Rússia.”

Os três “são uma inspiração e um exemplo de coragem e dedicação para todos aqueles que realizam trabalho de direitos humanos na Europa de Leste”, acrescentou a responsável, referida na página oficial da Amnistia Internacional.

Ales Bialiatski, presidente e fundador do Centro de Direitos Humanos Viasna em 1996, está preso preventivamente desde Julho de 2021. Juntamente com os seus colegas, o vice-presidente Valyantsin Stefanovich e o advogado da organização Uladzimir Labkovich, é acusado de “contrabando de grandes somas de dinheiro e financiamento de actividades de grupo que violavam grosseiramente a ordem pública” como retaliação pelo seu trabalho legal em matéria de direitos humanos.

Ales Bialiatski já tinha cumprido uma pena de prisão entre 2011 e 2014, depois de condenado por evasão fiscal, que a Amnistia e outras organizações consideram ser uma acusação falsa. Nos últimos dois anos, o seu envolvimento nos movimentos de protesto contra a reeleição fraudulenta do Presidente Alexander Lukashenko valeram-lhe de novo a perseguição e a prisão.

O Memorial, recorda a AI, é um dos mais antigos e respeitados grupos de direitos humanos na Rússia. Fundado em 1988, teve como seu primeiro presidente o dissidente soviético e laureado com o Prémio Nobel da Paz Andrei Sakharov. A organização dedicou-se a catalogar e registar o sofrimento e as vítimas dos campos de concentração soviéticos, conhecidos como Gulag. Mandado encerrar por ordem judicial em Dezembro de 2021, por ser considerado “agente estrangeiro” desde 2013, ao abrigo da lei conhecida com esse nome, continua a funcionar sem registo oficial.

O Centro de Liberdades Civis, fundado na Ucrânia em 2007, desempenha actualmente um papel crítico nos esforços para identificar e documentar crimes de guerra cometidos em território ucraniano sob controlo russo efectivo desde 2014 e ocupado durante a invasão de 2022.

(A seguir, o vídeo do anúncio do Nobel da Paz, em inglês, feito pela presidente do Comité Norueguês do Nobel, Berit Reiss-Andersen, em Oslo)





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