Homilia do Papa Francisco na Santa Missa com os novos cardeais
Cidade do Vaticano, 24 de Fevereiro de 2014 (Zenit.org)
Apresentamos a homilia do Papa Francisco pronunciada durante
a Santa Missa com os novos cardeais neste domingo, 23 de Fevereiro, na
Basílica Vaticana.
«A vossa ajuda, Pai misericordioso, sempre nos torne atentos à voz do Espírito» (Colecta).
Esta oração, pronunciada no início da Missa, convida-nos a uma
atitude fundamental: a escuta do Espírito Santo, que vivifica a Igreja e
a anima. Com a sua força criativa e renovadora, o Espírito sustenta
sempre a esperança do povo de Deus que caminha na história, e sempre
sustenta, como Paráclito, o testemunho dos cristãos. Neste momento,
todos nós, juntamente com os novos Cardeais, queremos ouvir a voz do
Espírito que nos fala através das Escrituras proclamadas.
Na primeira Leitura, ressoou este apelo do Senhor ao seu povo: «Sede
santos, porque Eu, o Senhor, vosso Deus, sou santo» (Lv 19, 2). E
faz-lhe eco, Jesus, no Evangelho: «Haveis, pois, de ser perfeitos como o
vosso Pai celeste é perfeito» (Mt 5, 48). Estas palavras interpelam-nos
a todos nós, discípulos do Senhor; e hoje são dirigidas especialmente a
mim e a vós, queridos Irmãos Cardeais, de modo particular a vós que
ontem começastes a fazer parte do Colégio Cardinalício. Imitar a
santidade e a perfeição de Deus pode parecer uma meta inatingível;
contudo, a primeira Leitura e o Evangelho sugerem os exemplos concretos
para que o comportamento de Deus se torne a regra do nosso agir.
Lembremo-nos, porém, todos nós…, lembremo-nos de que o nosso esforço,
sem o Espírito Santo, seria vão! A santidade cristã não é,
primariamente, obra nossa, mas fruto da docilidade (deliberada e
cultivada) ao Espírito do Deus três vezes Santo.
O Levítico diz: «Não odieis um irmão vosso no íntimo do coração
(...). Não vos vingueis; não guardeis rancor (...). Amai o vosso
próximo» (19, 17-18). Estas atitudes nascem da santidade de Deus. Nós,
porém, habitualmente somos tão diferentes, tão egoístas e orgulhosos... e
no entanto a bondade e a beleza de Deus atraem-nos, e o Espírito Santo
pode purificar-nos, pode transformar-nos, pode moldar-nos dia após dia.
Fazer este trabalho de conversão, conversão no coração, conversão que
todos nós (especialmente vós, Cardeais, e eu) devemos fazer.
Conversão!
No Evangelho, também Jesus nos fala da santidade e explica a nova lei
– a sua. Fá-lo através de algumas antíteses entre a justiça imperfeita
dos escribas e fariseus e a justiça superior do Reino de Deus. A
primeira antítese do texto de hoje tem a ver com a vingança. «Ouvistes
que foi dito aos antigos: “Olho por olho e dente por dente”. Pois Eu
digo-vos: (...) se alguém te bater na face direita, apresenta-lhe também
a outra» (Mt 5, 38-39). Não só não devemos restituir ao outro o mal que
nos fez, mas havemos também de esforçar-nos por fazer o bem
magnanimamente.
A segunda antítese refere-se aos inimigos: «Ouvistes que foi dito:
“Hás-de amar o teu próximo e odiar o teu inimigo”. Pois Eu digo-vos:
Amai os vossos inimigos e orai por aqueles que vos perseguem» (5,
43-44). A quem quer segui-Lo, Jesus pede para amar a pessoa que não o
merece, sem retribuição, a fim de preencher as lacunas de amor que há
nos corações, nas relações humanas, nas famílias, nas comunidades e no
mundo. Irmãos Cardeais, Jesus não veio para nos ensinar as boas
maneiras, as cortesias; para isso, não era preciso que descesse do Céu e
morresse na cruz. Cristo veio para nos salvar, para nos mostrar o
caminho, o único caminho de saída das areias movediças do pecado, e este
caminho de santidade é a misericórdia, aquela que Ele usou e usa cada
dia connosco. Ser santo não é um luxo, é necessário para a salvação do
mundo. Isto é o que o Senhor nos pede.
Queridos Irmãos Cardeais, o Senhor Jesus e a mãe Igreja pedem-nos
para testemunharmos, com maior zelo e ardor, estas atitudes de
santidade. É precisamente neste suplemento de oblatividade gratuita que
consiste a santidade de um Cardeal. Por conseguinte, amemos aqueles que
nos são hostis; abençoemos quem fala mal de nós; saudemos com um sorriso
a quem talvez não o mereça; não aspiremos a fazer–nos valer, mas
oponhamos a mansidão à prepotência; esqueçamos as humilhações sofridas.
Deixemo-nos guiar sempre pelo Espírito de Cristo: Ele sacrificou-Se a Si
próprio na cruz, para podermos ser «canais» por onde passa a sua
caridade. Este é o comportamento, esta é deve ser a conduta de um
Cardeal. O Cardeal (digo-o especialmente a vós) entra na Igreja de
Roma, Irmãos, não entra numa corte. Evitemos todos (e ajudemo-nos
mutuamente a evitar) hábitos e comportamentos de corte: intrigas,
críticas, facções, favoritismos, preferências. A nossa linguagem seja a
do Evangelho: «Sim, sim; não, não»; as nossas atitudes, as das
bem-aventuranças; e o nosso caminho, o da santidade. Rezemos mais uma
vez: «A vossa ajuda, Pai misericordioso, sempre nos torne atentos à voz
do Espírito».
O Espírito Santo fala-nos, hoje, também através das palavras de São
Paulo: «Sois templo de Deus (…); o templo de Deus é santo, e esse templo
sois vós» (1 Cor 3, 16-17). Neste templo que somos nós, celebra-se uma
liturgia existencial: a da bondade, do perdão, do serviço; numa palavra,
a liturgia do amor. Este nosso templo fica de certo modo profanado,
quando descuidamos os deveres para com o próximo: quando no nosso
coração encontra lugar o menor dos nossos irmãos, é o próprio Deus que
aí encontra lugar; e, quando se deixa fora aquele irmão, é o próprio
Deus que não é acolhido. Um coração vazio de amor é como uma igreja
dessacralizada, subtraída ao serviço de Deus e destinada a outro fim.
Queridos Irmãos Cardeais, permaneçamos unidos em Cristo e entre nós!
Peço-vos que me acompanheis de perto, com a oração, o conselho, a
colaboração. E todos vós, bispos, presbíteros, diáconos, pessoas
consagradas e leigos, uni-vos na invocação do Espírito Santo, para que o
Colégio dos Cardeais seja cada vez mais inflamado de caridade pastoral,
cada vez mais cheio de santidade, para servir o Evangelho e ajudar a
Igreja a irradiar pelo mundo o amor de Cristo.
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(24 de Fevereiro de 2014) © Innovative Media Inc.
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