Entrevista ao Ímã Kobine Oumar Layama e
ao Pastor Nicolas Guérékoyaméné-Gbangou sobre a situação do país e a
iminente visita do Santo Padre a Bangui
Madrid,
27 de Novembro de 2015
(ZENIT.org)
Ivan de Vargas
O arcebispo de Bangui, Dom Dieudonné Nzapalainga, o presidente do
Conselho Islâmico, Imã Oumar Kobine Layama e o presidente da Aliança
Evangélica, Pastor Nicolas Guérékoyaméné-Gbangou, fundaram em 2013 a
Plataforma Inter-religiosa da República Centro-africana. Uma organização
inter-religiosa que representa as três principais religiões do país e
promove o diálogo como medida preventiva contra a violência religiosa e
como meio para buscar a paz.
No meio da guerra, os três líderes religiosos concordaram em
trabalhar juntos para enfrentar a crescente instabilidade na República
Centro-Africana. Desde então eles continuam a persuadir muçulmanos,
católicos e protestantes para evitar mais violência e a vingança entre
as suas comunidades religiosas.
Os três líderes viajam pelo país, visitando cidades e vilas para
conversar com as comunidades sobre a paz, o respeito mútuo, a tolerância
e a confiança. Além disso, a ação tem impulsionado uma decisão unânime
do Conselho de Segurança das Nações Unidas a estabelecer uma força de
manutenção da paz.
A República Central Africana, um país no coração da África devastado
pela violência, atravessa a pior crise de sua história. Nesta entrevista
exclusiva, realizada durante recente visita a Madrid para participar de
um fórum organizado pelo KAICIID, o Imã Oumar Kobine Layama e o Pastor
Nicolas Guérékoyaméné-Gbangou explicaram a ZENIT a situação que
enfrentam suas comunidades e as expectativas sobre a iminente visita do
Papa Francisco a Bangui.
Qual é a situação na República Centro-Africana?
Ímã Oumar Kobine Layama: Atualmente, o que está
acontecendo tem sido uma surpresa para todos nós. Há um grande esforço
por parte da Plataforma, da comunidade internacional e da sociedade
civil para alcançar a paz no país. Infelizmente, os inimigos da paz
ainda estão lá para colocá-la em perigo, apesar dos esforços feitos por
todos os interessados para denunciar os crimes, o ódio. Esta situação
nos convida a refletir, nos pede, mais uma vez, para ver o que devemos
fazer para pedir à comunidade internacional que nos ajude a restaurar a
paz.
Pastor Nicolas Guérékoyaméné-Gbangou: os cálculos
políticos questionam os esforços feitos tanto pelo governo como pelas
diferentes religiões na República Centro-Africana. Nós nos aproximamos
das eleições gerais e por isso, compreendemos a agitação. Mas não
podemos compreender e aceitar a atitude das pessoas que se dizem
patriotas e utilizam a violência para tentar tomar o poder ou pôr em
perigo a vida da população. Os líderes religiosos não podem entender
isso e muito menos admitir.
Muitos meios de comunicação estão dizendo que há um conflito religioso em curso no país. O que vocês acham?
Ímã Oumar Kobine Layama: Esta é uma manipulação dos
políticos. Quando observamos a composição do Seleka, percebemos que não é
uma milícia cem por cento muçulmana. Parte de seus membros pertencem a
outras religiões. Portanto, não é um grupo muçulmano. É secular. Também
entre os anti-Balaka há membros muçulmanos. Estes grupos rebeldes não
são movidos por qualquer componente religioso. Eles fazem o que é
proibido por todas as religiões. Portanto, não se pode dizer que a
religião provocou essa rebelião. A frente do Seleka, não está uma pessoa
religiosa, assim como os anti-Balaka. Há certas pessoas que pertencem a
uma ou outra religião, mas a causa é puramente política.
Pastor Nicolas Guérékoyaméné-Gbangou: líderes
religiosos muçulmanos, católicos e protestantes se uniram desde 2012, e
até hoje, para trabalhar pela paz. E todo esse esforço se concretizou em
setembro com o Dia da Paz, como parte da semana internacional sobre o
mesmo assunto que teve lugar em Bangui.
As pessoas usam os mais fracos para deslizar no campo religioso e
provocar hostilidades a fim de obter poder. Mas estamos otimistas. Nós
acreditamos que não conseguirão, porque na África Central há 52% de
protestante, 29% de católicos e 15% de muçulmanos, o que representa 96%
da população total. O que isso significa? Mostra que as pessoas da
África Central são profundamente religiosas. Chegará um momento em que
os cristãos dirão: "Eu não sou um inimigo dos muçulmanos". E o
muçulmano: "Eu não sou um inimigo do cristão".
Diante do que está acontecendo, é possível alcançar uma solução negociada?
Pastor Nicolas Guérékoyaméné-Gbangou: cristãos,
muçulmanos e aqueles que não creem dialogam e dialogam sem parar,
regularmente. São os políticos que usam os grupos armados para impedir
esse diálogo. Ainda assim, acreditamos que vai chegar um momento em que
os grupos armados se cansarão de lutar, eles vão enfraquecer e
abandonarão as armas.
Por meio da força das palavras, os líderes religiosos irão desarmar
os corações dos violentos para que um dia possam novamente viver juntos
na República Centro Africana.
O que esperar da visita do Papa Francisco ao país?
Pastor Nicolas Guérékoyaméné-Gbangou: O Papa
Francisco nos deu a honra de nos receber no Vaticano por duas vezes.
Para nós, os três membros da Plataforma Inter-religiosa, é apenas um
retorno de tudo o que ele nos deu. Todos os fiéis da África Central se
mobilizarão para ver o Papa Francisco.
Acreditamos que mais uma vez repetirá as belas mensagens de paz que
lançou ao nosso povo, a fim que os centro africanos deixem as armas e
voltem a viver juntos.
Gostariam de transmitir uma mensagem para a comunidade internacional?
Ímã Oumar Kobine Layama: Pedimos à comunidade
internacional para ajudar a população a se recuperar, a libertar-se dos
grupos armados, ambos os grupos rebeldes Seleka como anti-Balaka. Que
ajude as pessoas, porque elas realmente querem viver juntas.
Pastor Nicolas Guérékoyaméné-Gbangou: A mensagem que
eu gostaria de transmitir à comunidade internacional é de que estamos
cansados. Cansados de promessas não cumpridas. Cansados porque as
resoluções da ONU não são cumpridas na íntegra. Cansados porque não
temos a liberdade de movimento e queremos recupera-la. Esperamos todos
esses gestos da comunidade internacional. Muito obrigado.
(27 de Novembro de 2015) © Innovative Media Inc.
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