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sábado, 4 de fevereiro de 2023

Francisco aos jovens: “Das vossas mãos pode vir o que falta a este país”

Terceiro dia na RD Congo

 | 2 Fev 2023

papa francisco em encontro com jovens no estadio dos martires em kinshasa congo, foto twitter papeenrdc

As bancadas do estádio dos Mártires, em Kinshasa, encheram-se de jovens para o encontro com o Papa. Foto reproduzida a partir da página de Twitter @#PapeEnRdc.

Mais de 80 mil jovens e catequistas provenientes de todas as partes da República Democrática do Congo (RDC) encheram o estádio dos Mártires, o maior do país, na manhã desta quinta-feira, 2 de fevereiro, para o muito aguardado encontro com o Papa. O entusiasmo era tal que o discurso de Francisco foi várias vezes interrompido por aplausos e cânticos. O Papa não se importou. É que esse entusiasmo só reforçava a mensagem que queria transmitir: é das mãos dos jovens “que pode vir o que falta” ao Congo, e ao mundo.

“Jovem que sonhas com um futuro diferente, é das tuas mãos que nasce o amanhã; das tuas mãos, pode vir a paz que falta a este país”, disse o Papa, visivelmente feliz e contagiado pelo ambiente de alegria que se vivia no estádio. E insistiu: “És indispensável e responsável pela tua Igreja e pelo teu país; fazes parte duma história maior, que te chama a ser protagonista: criador de comunhão, campeão de fraternidade, corajoso sonhador dum mundo mais unido”.

Mas Francisco não se ficou pelas palavras bonitas. Como um pai, fez questão de explicar aos jovens “concretamente, como fazer”. E, voltando às mãos, pediu-lhes que olhassem para elas e se perguntassem: “Para que servem estas minhas mãos? Para construir ou destruir, dar ou reter, amar ou odiar? Vê! Podes apertar a mão e fechá-la, torna-se um punho; ou podes abri-la e colocá-la à disposição de Deus e dos outros. Aqui está a opção fundamental, desde os tempos antigos”, afirmou.

Apontou então cinco “ingredientes para construir o futuro” que podem ser associados “aos dedos duma mão”: oração, comunidade, honestidade, perdão e serviço.

O polegar, o dedo mais forte, simboliza a oração, “que faz pulsar vida” e é o que permite que uma pessoa cresça e amadureça. “A oração é a arma mais poderosa que existe. Transmite-te o conforto e a esperança de Deus. Abre-te sempre novas possibilidades e ajuda-te a superar os medos”, garantiu Francisco, exortando os jovens a falarem com Jesus com liberdade e franqueza, permitindo-lhe assim intervir na sua vida diária.

Quanto ao dedo indicador, simboliza a comunidade, porque “com ele, indicamos algo aos outros”, explicou o Papa, pedindo: “não deixeis que a vossa juventude seja arruinada pela solidão e o isolamento. Imaginai-vos sempre juntos, e sereis felizes, porque a comunidade é o caminho para estar bem connosco mesmos, para ser fiéis à própria vocação”. Apesar de ir sozinho poder por vezes parecer “aliciante”, reconheceu Francisco, “depois deixa dentro apenas um grande vazio”.

O Papa alertou então para os perigos das drogas, que segundo ele muitas vezes levam as pessoas a esconderem-se dos outros e “da vida verdadeira, para te sentires omnipotente”, quando na realidade nos tornam “privados de tudo”. E pediu também aos jovens que se guardem “do regionalismo, do tribalismo, que parecem reforçar-vos no vosso grupo quando, pelo contrário, representam a negação da comunidade”.

Um grito em uníssono: “Não à corrupção!”

“Nada e ninguém pode substituir a força de estar juntos, a luz dos olhos, a alegria da partilha”, afirmou Francisco, convidando todos os presentes a dar as mãos. Foto © Vatican Media.

Referindo-se ao facto de os jovens quererem estar “conectados com os outros” o Papa lembrou ainda que “o mundo virtual não é suficiente”, porque “nada e ninguém pode substituir a força de estar juntos, a luz dos olhos, a alegria da partilha”. De resto, aquele momento dos jovens com Francisco estava a ser a prova disso mesmo, mas o Papa quis reforçar a mensagem e propôs uma “experiência”: “Durante alguns momentos, por favor, dai a mão a quem está ao vosso lado. Senti-vos uma única Igreja, um único Povo”. Os jovens acederam e, de repente, os 80 mil estavam de mão dada, e a cantar a uma só voz. O estádio vibrava.

Quando finalmente voltou a fazer-se silêncio e o Papa pôde fazer-se ouvir, assegurou-lhes: “Nesta aventura, não estais sozinhos; apoia-vos a Igreja inteira, espalhada por todo o mundo. Trata-se dum desafio difícil, mas possível. E tendes também amigos que, das bancadas do Céu, vos impelem para estas metas”. Referia-se aos mártires congoleses Beato Isidoro Bakanja e Beata Maria Clementina Anuarita. Os jovens, alguns deles com cartazes que pediam que estes mártires fossem “santos subitos”, aplaudiram mais uma vez.

Francisco retomou depois o raciocínio e, voltando-se para o dedo médio, o mais alto, disse que simboliza a honestidade, “uma coisa imprescindível” e que “significa não se deixar enredar nos laços da corrupção”. Mas mais uma vez parou o discurso e fez uma pergunta diretamente aos jovens: “Uma pessoa corrupta é honesta ou não é honesta?”. A resposta foi um forte “não!”. “Então digamos todos juntos: não à corrupção!”, pediu o Papa. O grito de Francisco e dos jovens ecoou pela cidade.

“Não vos deixeis manipular por indivíduos ou grupos que procuram servir-se de vós para manter o vosso país na espiral da violência e da instabilidade, para continuarem a controlá-lo sem consideração por ninguém”, insistiu. E mais uma vez fez questão de mostrar que acredita neles: “Sede vós os transformadores da sociedade, os conversores do mal em bem, do ódio em amor, da guerra em paz. Quereis sê-lo? Se quiserdes, é possível… E sabeis porquê? Porque cada um de vós tem um tesouro que ninguém vos pode roubar: são as vossas opções”.

Um pedido final

papa francisco em encontro com jovens no estadio dos martires em kinshasa congo, foto twitter papeenrdc (1)

“A alegria que hoje tendes, guardai-a e não deixeis que se apague”, pediu o Papa aos jovens. Foto reproduzida a partir da página de Twitter @#PapeEnRdc.

Chegou a vez de falar do quarto dedo da mão, o anelar, que significa perdão, ou seja: “poder recomeçar” sem esquecer o passado, mas sem se “resignar com o facto de poder repetir-se”.

O perdão significa também aceitar a ideia “de que ninguém é perfeito e que todos, não apenas eu, têm o direito de começar de novo”, disse Francisco, lembrando no entanto que é impossível perdoar os outros sem primeiro ser perdoado por Deus e exortando os jovens confessar-se regularmente.

“Oração, comunidade, honestidade, perdão. Chegamos ao último dedo: o mindinho.” Sendo o dedo mais pequeno, representa o serviço, pois “quem serve faz-se pequenino, como “uma semente minúscula que parece desaparecer na terra e, em vez disso, dá fruto”.

Francisco pediu então aos jovens que se perguntem diariamente o que podem fazer pelos outros e como podem servir melhor a Igreja, as suas comunidades e o seu país, e agradeceu aos muitos catequistas presentes pela forma como já se colocam ao serviço: “para muitas comunidades, sois vitais como a água! Fazei-as crescer sempre com a clareza da vossa oração e do vosso serviço”.

No final, Francisco deixou um pedido a todos os presentes: “A alegria que hoje tendes, guardai-a e não deixeis que se apague. (…) Juntos, saí do pessimismo, que paralisa. A República Democrática do Congo espera, das vossas mãos, um futuro diverso, porque o futuro está nas vossas mãos”.



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