“Assembleia da República moribunda”
O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), José Ornelas, disse que é necessário o acesso da população mundial às vacinas contra a covid, de modo a evitar “novos contágios, com estirpes mais complicadas do vírus”. No seu discurso de abertura da 201ª assembleia plenária da CEP, em Fátima, o também bispo de Setúbal criticou ainda “uma Assembleia da República moribunda” por ter aprovado a lei da eutanásia.
Não haverá um “futuro mais humano” sem um “espírito de solidariedade e de justiça”, afirmou D. José na intervenção que marca uma assembleia em que também será debatido o tema dos abusos sexuais e que decorre até quinta-feira.
“No contexto da pandemia, sem um acesso da população mundial a vacinas e a recursos para todos, as melhores práticas dos países com mais possibilidades económicas acabarão sempre por naufragar em novos contágios, com estirpes mais complicadas do vírus”, afirmou. “Sem a globalização da justiça e da solidariedade o mundo globalizado torna-se numa confusão de tensões contagiosas, miséria, migrações perigosas e depredação do planeta.”
Precisamente sobre este tema, o presidente da CEP disse que “solidariedade, convergência de vontades e atitudes concretas” é o que se espera da COP, a conferência sobre o clima que decorre em Glasgow. “A evidência científica e a constatação empírica não deixam dúvidas de que não se podem perder estas derradeiras oportunidades para conter ao máximo” as catástrofes que já atingem o mundo inteiro. “A voz do Papa Francisco desafia-nos a todos a colocar na agenda prioritária da Igreja e do mundo este tema fundamental para o futuro do planeta, nossa casa comum”, afirmou o bispo.
Referindo-se à situação do país, José Ornelas falou do momento “delicado” que se vive, entre as dificuldades e a esperança, que exigem “o empenho e a mobilização de todos”. “Depois da rejeição da proposta do Orçamento do Estado e da dissolução anunciada da Assembleia da República e consequente realização de eleições antecipadas, exige-se agora que todos estejamos à altura”. Isso significa, acrescentou, “tomar decisões certas” que devem basear-se no “bem comum, sobretudo numa atenção particular aos mais frágeis e marginalizados e a todos aqueles que por causa da pandemia enfrentam agora tantos problemas sociais e económicos”.
Apesar do processo ter eventualmente provocado cepticismo, esta etapa da vida política deve “contar com a participação acrescida dos cidadãos, na clarificação do panorama político”, apelou o bispo. “É urgente que os partidos e todos os intervenientes encarem com credibilidade e sentido de Estado os grandes desafios e oportunidades que se encontram no futuro imediato de todos nós.”
É o actual quadro político que leva o presidente da CEP a dizer que ele torna “ainda mais incompreensível a discussão e aprovação da lei da eutanásia por uma Assembleia da República moribunda”. Para lá do tema, que já mereceu várias tomadas de posição da CEP, “o modo e o momento desta iniciativa parlamentar lançam um ulterior manto de sombra sobre todo o processo desta lei que não dignifica os últimos dias desta legislatura”. E, garantindo que a Igreja “continuará a fazer tudo para que a dignidade da vida humana seja respeitada sem ser necessário o recurso à morte”, José Ornelas concluiu, com uma afirmação que se pode entender como apelo velado de veto do Presidente da República à lei aprovada na sexta-feira, 5: “As mais altas instâncias do País devem, por isso, pronunciar- se de acordo com as prerrogativas constitucionais de que dispõem”, disse.
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