Palmilho as ruas da cidade tão
repletas de recordações à procura de luzes do Céu para uma difícil situação que
vivencio a nível de saúde de um familiar. E nesse caminhar regresso ao passado
ao passar pelo Palácio do Vinho do Porto. Aqui num andar alto, em casa de uns
tios, de onde se avistava de uma forma admirável a cidade de Lisboa e o
elevador da Glória, passei alguns momentos da minha infância. Recordo em
particular um almoço servido por uma empregada muito diligente e atenciosa.
Pelo meu tio, empresário, fiquei a saber que possuía uma loja de brinquedos no
Chiado. Que bom! Podia ir visitar. E assim pedi-lhe para o fazer. Deparei-me
com o olhar reprovador da empregada, o olhar gélido do tio, o olhar doce da tia
Marquinhas que colecionava pagelas as partilhava carinhosamente comigo. Percebi
então como era austero aquele ambiente. Enquanto criança não me era permitido formular
qualquer pedido ou tecer uma opinião, à mesa, em sinal de respeito. E eram
almoços infindáveis com prato de peixe e de carne. Na verdade, nunca viria a
visitar a loja de brinquedos. Eram outros tempos, contudo, posso afirmar que
fui feliz nas férias em casa dos tios. Às vezes a avó Isabel vinha-me buscar para
lanchar na pastelaria Suíça ou na pastelaria Ferrari no Chiado. Gostava muito
de mim. Nenhum destes locais existe hoje em dia. Quer seja por terem sido
vendidos ou devido ao devastador incêndio que deflagrou no dia 25 de agosto de 1988
e cuja origem se desconhece até aos dias de hoje.
Continuo a minha caminhada.
Tencionava visitar o Convento do Carmo. O dia estava repleto do sol. O Largo do
Carmo com muitos turistas num vaivém constante. Admirei o belíssimo Chafariz do
Carmo datado do século XVIII que tanto embeleza o largo, situado em frente à
entrada do Convento que afinal se encontrava fechado por ser domingo. Admirei a
sua fachada recordando que constitui um dos principais testemunhos com vida do
terramoto de 1755 mas que ficou em ruínas não tendo sido reconstruído. Reza a
história que no reinado de D. Maria I teve início a reconstrução de uma ala do
convento cujos trabalhos foram interrompidos aquando da extinção das ordens
religiosas em 1834. O Convento fora mandado construir por D. Nuno Álvares
Pereira, hoje São Nuno de Santa Maria, que, aquando a Batalha de Aljubarrota,
fez o voto de erguer um templo que viria a ser a principal igreja gótica da
cidade, pela sua grandeza e monumentalidade concorrendo com a própria Sé de
Lisboa. Atualmente as ruínas albergam o Museu Arqueológico do Carmo. Contornei
o convento e deparei-me com uma paisagem assombrosa da cidade de Lisboa de
cortar a respiração. Maravilhosa mesmo. Torna-se importante dar valor a cada
momento que vivenciamos. “Uma alma que se eleva, eleva o mundo”.
Uma vez que não podia visitar o
convento, resolvi, em alternativa, aproveitar o magnífico dia de sol e usufruir
da beleza do rio Tejo, fazendo uma caminhada a pé do Cais de Sodré até ao
Terreiro do Paço. Tudo aqui é história. Revejo em pensamento o terramoto, o maremoto
e o incêndio que durou 3 dias. Afastei esses pensamentos. Como era belo o
momento que vivenciava. O Terreiro do Paço é de uma beleza sem par. Olhei para
o Cais das Colunas embevecida. De ambos os lados devido à baixa-mar tinham-se
constituído duas pequenas praias. Logo, logo, passou-me pela mente a minha
familiar doente a quem tinha prometido, quando recuperasse, levá-la a passear
nesta zona da cidade que se estende com um caminho pedonal até à estação de
Santa Apolónia. Deus permita que ainda possa cumprir essa promessa. Recordei a
frase de S. Francisco Xavier: “De que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro
se perder a sua alma”. É mesmo preciso aproveitar bem o tempo recordando o que
tem valor face à eternidade.
Na véspera tinha acompanhado a
minha familiar ao IPO (Instituto Português de Oncologia) no sentido de fazer as
análises necessárias antes do tratamento de quimioterapia. Já se encontravam
marcadas. A senha tinha o número 333. Alguém comentava que nunca tinha
observado um número tão elevado de análises e eram 13H30. O número de doentes
tinha aumentado imenso nos últimos tempos. A seguir às análises tornava-se
necessário fazer o teste Covid-19. Com muita dificuldade de locomoção da minha
familiar, tornou-se necessário chamar uma carrinha da Liga Portuguesa Contra o
Cancro. No caminho fui observando o mau estado em que o IPO se encontra. A
necessidade de dar algum conforto aos doentes e profissionais que aqui
trabalham é evidente. As distâncias entre pavilhões causam inúmeros
constrangimentos aos doentes. A doença já é suficientemente grave. Chorei
interiormente. Instalações obsoletas, falta de pessoal. Valha-nos a simpatia do
pessoal e o apoio da Liga Portuguesa Contra o Cancro. Mas não é suficiente.
Concluo este artigo denominado “A Oração e As Luzes do Céu” recorrendo à Virgem Maria, com a oração de S. Bernardo: “Lembrai-vos” intercedendo por todos os doentes que sofrem alguma necessidade espiritual ou material. Lembrai-vos, ó puríssima Virgem Maria, de que nunca se ouviu dizer que algum dos que recorreram à vossa proteção, imploraram a vossa assistência e clamaram por vosso socorro tenha sido por Vós desamparado. Animado eu, com igual confiança, a Vós, Virgem entre todas singular, como a Mãe recorro…não rejeiteis as minhas súplicas…mas dignai-vos de as ouvir propícia e de alcançar o que vos rogo.
Maria Helena Paes |
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