«…Gosto de Paris. Mas há uma profunda amargura
neste amor.
Quando penso na capital francesa, penso em Voltaire
e em Rousseau que ocupam os primeiros lugares neste mausoléu que apelidam de
Panteão, porque no seu interior estão sepultados aqueles que o Estado francês
reconhece como os seus “deuses” há trezentos anos: Voltaire, essa personagem
repulsiva de escárnio diabólico, o pai do laicismo sectário, intolerante e
fanático; Rousseau, esse sentimental duma inconsistência fenomenal, o pai da
filosofia das Luzes, que, por ter negado a existência do mal no homem, criou um
género de homem alheio aos conceitos de desenvolvimento pessoal e de
aperfeiçoamento moral, um género de homem cuja única esperança é o “progresso
social”.
Eis o que se lê à entrada deste mausoléu: “ Aos
grandes Homens, a Pátria reconhecida”.
Lê-se e chora-se, por ser de mau gosto tal mentira.
O Panteão que foi outrora uma Igreja dedicada a uma das maiores mulheres de
França, àquela que salvou Paris da destruição mongol, é, desde a revolução
francesa, um mausoléu dedicado aos “grandes homens” que, na realidade são
grandes inimigos da humanidade.» (Um Caminho Russo, de Alexandre Havard)
A leitura desta obra suscitou-me a curiosidade de
saber algo mais sobre o tempo remoto desta grande mulher esquecida na história
de França – Genevieve.
Genoveva nasceu em Nanterre, perto de Paris, no ano 420, filha única de Severus e Geroncia, uma família muito humilde e modesta.
Nesta época a Britânia (actual Inglaterra) era uma
importante província romana, mas pagã. O Bispo de Auxerre, São Germano, durante sua viagem à Britânia para lhes anunciar
o cristianismo, passou por Nanterre, e uma grande multidão parou para ver o
bispo santo e lhe pedir bênçãos. Foi quando São Germano olhou para os pais de
Genoveva e lhes disse: “Feliz de vós que tendes esta menina! Ela será grande
perante Deus e, atraídos pela sua virtude, muitos pecadores abandonarão o
pecado e seguirão a palavra de Jesus Cristo”.
O Bispo entregou
a Genoveva uma cruz dizendo-lhe para não se iludir com ouro e joias, caso
contrário não alcançaria a Luz eterna, palavras que ela guardou para sempre no
seu coração.
A jovem aos
15 anos formou, com um grupo de amigas, uma associação de mulheres dedicadas ao
apostolado e a ajudar os pobres. Vestiam um hábito que as distinguia das outras
mulheres. Não eram religiosas, mas viviam em santidade, nas suas próprias casas
ou no local de trabalho, dedicando-se às obras de caridade e penitência, orando,
fazendo jejum e ajudando os mais necessitados.
Aos 20 anos, com o falecimento dos pais, mudou-se
para Paris, onde passou a morar na casa da madrinha, mas continuou a vida de
oração, penitência e intercessão pela salvação das almas.
No ano de 451, Átila, “o
flagelo de Deus” com o seu poderoso exército huno, tentou
invadir Paris. A população apavorada, decidiu abandonar a cidade, porém,
Genoveva convenceu-os a ficar e a rezar, pois deviam confiar em Deus, que
impediria a invasão e a destruição da cidade. “Que os homens fujam se
quiserem, se não são capazes de lutar mais. Nós, as mulheres, rogaremos
tanto a Deus, que Ele ouvirá nossas súplicas”.
Mediante este desafio de fé os homens parisienses,
mesmo em desvantagem, resolveram resistir ao invasor. Átila, porém, afastou-se
misteriosamente da cidade e até hoje não se sabe exatamente porque desistiu da
invasão.
A fama de
santidade de Genevieve, a forma humilde como anunciava Cristo e socorria os
doentes e famintos, fez dela uma mulher de caridade.
Mais tarde, 481-511, quando Paris foi ocupada
pelo Rei Childerico I, Genevieve intercedeu junto dele e do seu
sucessor para conseguir a liberdade dos prisioneiros. Posteriormente,
solicitou ao Rei Clóvis, primeiro monarca católico da França, para que
construísse uma Igreja dedicada a São Pedro e a São Paulo.
Quando morreu, a 3 de Janeiro de 502, com 82 anos, o
seu corpo foi sepultado nesta Igreja que ainda estava inacabada. Após a sua
canonização, passou a chamar-se Abadia de Santa Genoveva. O Rei Clóvis, que
morreu em 511 e a Rainha Clotilde, que morreu em 545 também foram sepultados
neste local. A abadia foi saqueada e praticamente destruída pelos Vikings em
847, tendo sido parcialmente reconstruída ao longo das décadas seguintes, só
foi concluída em 1177.
No ano de
1130, surgiu em Paris uma grande peste que causou muitas mortes. O povo começou
a rezar a Santa Genoveva e fez uma procissão com suas relíquias pela cidade.
Milagrosamente a epidemia acabou.
Genoveva,
por estes e muitos outros milagres foi considerada a Padroeira de Paris. O Papa Inocêncio ll, marcou a sua festa litúrgica
e seu culto para o dia 3 de janeiro.
Ao longo
da história, Santa Genoveva sempre foi invocada por ocasiões de grandes
calamidades como as epidemias, para implorar a chuva ou contra as inundações do
Sena.
Em 1744, após uma doença grave, cuja cura foi
atribuída a Santa Genoveva, o Rei Luiz XV fez a promessa de construir um grandioso
templo em homenagem à Santa.
Durante a
Revolução francesa, os jacobinos profanaram a Basílica, retiraram o corpo de
Santa Genoveva, cremaram-no e lançaram as cinzas ao rio Sena. A Basílica perdeu
a sua função religiosa e foi transformada, no que hoje é o Panteão, onde os
líderes da revolução foram sepultados.
Posteriormente o seu túmulo foi reconstruído com as suas
relíquias na Igreja de Saint-Étienne-du-Mont. O Papa João Paulo II, em 2002, aqui
se recolheu em oração a Santa Genevieve, Padroeira de Paris.
Maria Susana Mexia
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