Palavra e Pão
73 Domingo de Páscoa
1 – O Senhor ressuscitou! Ressoa por todo o mundo este brado que também
eu quero fazer chegar aos teus ouvidos e ao teu coração, querido irmão que lês estas
linhas: para ti, para nós, para todos aqueles que são escravos do medo de
morrer, o Senhor venceu a morte, o Senhor
ressuscitou verdadeiramente! Como lemos no Evangelho de Lucas, já era noite,
já tinha passado aquele primeiro dia da semana cheio de interrogações e de
surpresas, e os apóstolos e aqueles que estavam com eles, depois de escutarem maravilhados
a narração dos discípulos de Emaús, disseram: é verdade! O Senhor ressuscitou, e apareceu a Simão!
Esta é a boa notícia que todo o
mundo, submetido ao poder da morte esperava, e espera ainda, receber. A criação
inteira, subjugada a uma existência vã pelo pecado dos homens, diz o apóstolo
Paulo, espera, com ânsia, a manifestação dos filhos de Deus que lhe anunciem e lhe
ofereçam a libertação dessa existência corrupta que é fruto do medo de morrer e
nos escraviza ao poder do mal (cf. Rm 8,18-21; Hb 2,15). Mortos com Cristo para
o pecado e com Ele ressuscitados para vivermos como filhos de Deus, nós,
cristãos, somos proclamadores desta palavra nova, portadora do futuro bom da
humanidade já reconciliada com o Pai: humanidade libertada da escravidão da
soberba, da avareza, da luxúria, da ira, ou seja, do mal; humanidade onde
crescem já as virtudes da piedade, da humildade, da generosidade, da castidade,
da mansidão, da caridade, virtudes que levam a terra a ser vizinha do céu. E,
por isso, não nos cansaremos de proclamar, aos quatro ventos, a boa nova da
Ressurreição de Jesus.
2 – Acreditar na ressurreição do
Senhor é o início da vida cristã. Alguns discípulos, começando por Maria
Madalena e as outras mulheres, encontraram o túmulo vazio e escutaram o anúncio
dos anjos. Depois, viram o Senhor que os saudou e lhes deu a paz, censurou a
sua lentidão de espírito para acreditarem nas suas palavras, desfez as dúvidas
dos seus corações e enviou-os pelo mundo a anunciar o Evangelho. E a pregação
viva destes apóstolos fez surgir a resposta da fé cristã no coração de muitos
dos seus ouvintes. O seu testemunho, no qual sempre se conjugam o anúncio
verbal que entra pelos ouvidos e a ação do Espírito Santo que dá testemunho ao
nosso espírito, chegou até nós que agora estamos vivos e temos hoje esta mesma
missão de anunciar a vitória de Jesus Cristo sobre o pecado e a morte.
O túmulo vazio ou, melhor ainda,
o vazio do túmulo, é o ponto de partida. Que é a Páscoa? É um tempo vazio, sem
celebração da Eucaristia, desde a Última Ceia de Jesus em Quinta-feira Santa,
até à Vigília Pascal. É um tempo vazio no qual passa Cristo Senhor Nosso que nos
arrasta, com a Sua graça, deste mundo para o Pai. Para que atue profundamente
em nós a celebração da Ressurreição de Jesus, têm de estar vazios os nossos
corações. Para isso, a santa Mãe Igreja deu-nos os quarenta dias da Quaresma
para praticarmos, com a oração mais intensa, com o jejum e com a esmola, o esvaziamento
e a morte de tudo o que é pecado, e assim darmos cada vez mais espaço ao Senhor
em nossas vidas. Também a nossa profissão de fé, na noite da Páscoa, é
precedida por aquele esvaziamento que é a renunciação ao pecado e ao demónio. Mais
ainda: como escutámos na segunda leitura do domingo passado, tirada da Carta
aos Filipenses, todo o percurso de Jesus, Filho de Deus, neste mundo, consistiu
num esvaziamento de Si mesmo. De facto, Ele, sendo Deus, não Se apegou
avidamente à sua condição divina, mas fez-Se homem. Este esvaziamento do Senhor
que, por nosso amor, Se fez Servo obediente até á morte de cruz, deve
reproduzir-se em nós, pois esse é também o percurso do discípulo que acredita e
segue o seu Mestre. Esse seguimento, essa fé, cresce e manifesta as obras de
Cristo naquele que acredita e que pode dizer com verdade, as palavras de S.
Paulo: Já não sou eu que vivo: é Cristo
que vive em mim! (Gl 2,20) e verificar, em sua vida, a verdade das palavras
do Salmo: como nos contaram, assim o
vimos (Cf. Sl 48,9).
3 – Onde poderemos encontrar-nos
com Jesus ressuscitado? Os Evangelhos mostram-nos que Ele aparece no meio dos
discípulos reunidos em Seu nome, segundo a Sua promessa: onde dois ou três estiverem reunidos em Meu nome, eu estarei no meio
deles (Mt 18,20). Estarmos reunidos em Nome do Senhor é estarmos juntos para
realizar as Suas obras, quer dizer, com o poder da Sua pessoa, com o poder que
o Pai Lhe confiou de nos fazer passar da morte para a vida e deste mundo para o
Pai. O próprio Senhor Jesus, aparecendo no meio dos Seus no primeiro dia da
semana e oito dias depois, nos ensinou a celebrar o domingo saboreando a Sua
presença salvadora no meio de nós. E, por isso, a participação na assembleia
celebrante de cada domingo, ou seja, na Eucaristia dominical, é o nosso
encontro semanal com o Senhor ressuscitado.
O outro lugar onde podemos
experimentar a força da sua presença é na Galileia, para onde o Senhor Ressuscitado
envia os Seus discípulos: lá Me vereis
(Mt 28,10)! A Galileia onde Jesus Se manifesta poderosamente é a evangelização.
Como podemos ler na conclusão do Evangelho de S. Marcos, eles saíram a pregar por toda a parte, e o Senhor colaborava com eles
confirmando a Palavra com os sinais que a acompanhavam (Mc 16,20). E, ainda
hoje, Cristo ressuscitado envia os Seus discípulos e os acompanha na pregação
do Evangelho.
4 – Queridos irmãos, celebremos a
Ressurreição de Jesus Nosso Senhor para nos refontalizarmos na nascente deste
rio de vida que é Ele, para nos saciarmos nas fontes da salvação que são as Suas
chagas, para voltarmos de novo ao Seu túmulo vazio e aí escutarmos o anúncio
dos anjos: porque buscais entre os mortos
Aquele que vive? Não está aqui, ressuscitou! (Lc.24,5) Ressuscitados com
Ele, comecemos a viver de novo, não já como quem busca a felicidade e a vida
entre os mortos, mas como quem testemunha que foi encontrado pelo Senhor Jesus,
vencedor da morte e fonte e rio de Vida para quantos n’Ele acreditam. É esta
santa Páscoa, com o Senhor ressuscitado, que desejo a todos vós, caros irmãos!
A graça e a paz do Senhor Jesus Ressuscitado estejam convosco!
+ J. Marcos, bispo de Beja
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