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terça-feira, 2 de setembro de 2014

Não odiar é uma necessidade, não uma escolha

O testemunho do enviado de guerra Domenico Quirico um ano depois de ter sido sequestrado na Síria


Roma, 01 de Setembro de 2014 (Zenit.org) Luca Marcolivio


O êxodo dos cristãos da Síria e do Iraque, infelizmente, é um fato definitivo, assegura Domenico Quirico, enviado pelo jornal italiano La Stampa, sequestrado por rebeldes sírios perto de Al Qusayr no dia 08 de Abril de 2013 e liberado no 08 de Setembro do mesmo ano. Cinco meses de terror, após o qual o repórter disse que “viu o inferno" e que várias vezes teve medo de ser assassinado.

Palestrante do encontro conclusivo de Rimini, acontecido no último sábado, 30, com o tema Testemunhas de liberdade, inteiramente dedicado ao drama do Oriente Médio, Quirico reiterou as suas opiniões radicais sobre, denunciando em particular os graves erros do Ocidente.

Em entrevista com ZENIT, o enviado especial da imprensa manifestou o seu desejo de voltar para a Síria, ainda que pessoalmente, confiando também como é difícil perdoar os próprios sequestradores. O caminho da renúncia ao ódio, porém, ressaltou ele, é o único caminho possível.

ZENIT: Você veio à Rimini para testemunhar a liberdade religiosa...
Domenico: ...ou melhor, a falta de liberdade religiosa! Eu trouxe o testemunho do fato de que no Oriente Médio, onde o cristianismo nasceu, em seis meses ou um ano, muito provavelmente, não haverá mais nem sequer um só cristão. No Iraque, dos cerca de quatro milhões do 2002, hoje os cristãos são 400 mil, embora todos refugiados: ninguém ficará lá. Certamente, não é a primeira vez que os cristãos estão sendo caçados, perseguidos, expulsos de suas casas, mas, anteriormente, sempre voltavam. Mas desta vez não votarão de novo, porque o fenómeno que está ocorrendo naquela região do mundo é uma nova entidade, muito mais complexa e perigosa do que até mesmo as coisas terríveis que aconteceram no passado, de modo que os cristãos não têm mais a coragem de fugir outra vez e retornar. Concluiu-se assim a história de uma parte essencial do cristianismo naquela região.

ZENIT: Após um ano, a experiência do sequestro ainda lhe incomoda? Conseguiu perdoar os seus algozes?
Domenico: A palavra "perdão" é uma palavra muito complicada e muito difícil de respeitar, por isso o perdão é algo que, de certa forma, requer a santidade e eu – infelizmente – não me sinto um santo mas um simplíssimo mortal. Se, no entanto, eu sentisse ódio por aqueles que me mantiveram na sua casa por um pouco de tempo, estaria forçosamente ligado àquelas pessoas e o meu sequestro continuaria indefinitivamente. A única maneira de fechar essa história é que eu não sinta hostilidade ou ódio em relação a essas pessoas. Só assim eu posso cortar os laços com essa história da minha vida. Mais do que uma escolha, portanto, não odiar é uma necessidade.

ZENIT: Depois do que aconteceu, planeia voltar à Síria?
Domenico: Voltaria à Síria amanhã mesmo se fosse enviado! O problema é que ninguém mais quer me mandar... Voltarei pessoalmente, como “turista”. Provavelmente os jornais não têm mais o interesse de enviar-me lá, por vários motivos. Eu, porém, gostaria de voltar á Síria: também de um ponto de vista pessoal, voltar é algo que preciso fazer. Isso significa que, em vez de uma reportagem jornalística, escreverei um cartão postal...

ZENIT: Nunca recomendaria a um jovem repórter na grama para fazer correspondente de guerra?
Domenico: A um jovem jornalista, eu recomendaria apenas fazer uma coisa básica: ir pessoalmente ver as coisas que conta, seja que aconteça na Síria ou na periferia de Bologna ou em Nova York. Para contar os problemas do homem não é necessário ir aos antípodas: pode-se ir à periferia ou ao centro de qualquer cidade. Antes de escrever, ir ver: esta é uma regra muito simples, se for respeitada faz-se um bom jornalismo, caso contrário, faz-se algo que não tem nada a ver com o jornalismo. Se então o que precisa ver aconteceu na Suíça, vai-se lá, se na Síria, em Nápoles ou em outro lugar. 

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