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domingo, 12 de dezembro de 2021

Acordo final não garante limite dos 1,5º Celsius

Cimeira do clima termina sem ambição

 | 14 Nov 21

Alterações climáticas

Para ficar dentro do limite dos 1,5º Celsius, é preciso que “mais de 40 por cento das 8.500 centrais de carvão existentes no mundo tenham que fechar até 2030, e nenhuma nova” seja construída”. Foto © Future of Life Institute

 

Sem ambição, nem brilho, deixando “o nosso frágil planeta preso por um fio”, no dizer de António Guterres, terminou ontem, dia 13 de novembro, a Cimeira do Clima de Glasgow aprovando um acordo final que ninguém é capaz de defender como contendo compromissos suficientes para garantir que em 2050 a temperatura média da terra não esteja 1,5º Celsius acima da que existia antes da era industrial.

Apesar de toda a investigação científica garantir que acima desse limite de crescimento da temperatura estaremos perante uma inevitável “catástrofe climática” com a subida do nível dos mares sepultando países inteiros, sucessivos fenómenos climáticos extremos, seca severa e persistente ocupando cada vez maiores áreas do planeta e destruição massiva e irreversível da biodiversidade, apesar de tudo isto, os  representantes oficiais de 198 países reunidos na conferência sobre o clima não estabeleceram compromissos que permitam evitar tal  catástrofe.

Os avanços conseguidos não chegam para fazer esquecer esta desilusão. Os mais otimistas referem que o Pacto pelo Clima de Glasgow prevê a revisão anual dos planos (reforçados) de cada país para reduzir as suas emissões de gases com efeitos de estufa e que refere pela primeira vez o carvão e os combustíveis fósseis. Mas, no último minuto, a Índia impôs a troca do objetivo de acabar com a queima do carvão por uma mera intenção não quantificada de reduzir o recurso ao carvão.

 

Países mais pobres de mãos vazias

Inundações em Abril 2021, Luanda: a ajuda financeira aos países mais pobres destina-se a permitir-lhes enfrentar os desastres ambientais provocados pelas emissões dos mais ricos. Foto © Cecília Prudêncio, cedida pela autora.

 

Outro enorme fracasso de Glasgow – neste caso um evidente retrocesso em relação ao acordado em Paris em 2015 – diz respeito ao financiamento a conceder aos países mais pobres. Se a promessa de Paris era criar um fundo com 100 mil milhões anuais a partir de 2020 (o que não aconteceu), o acordo de Glasgow esquece essa promessa e institui um grupo de trabalho que discutirá “os procedimentos necessários” para tal fim. O pacote financeiro de ajuda aos países mais pobres destina-se a permitir-lhes enfrentar os desastres ambientais (danos e perdas) que enfrentam devido à destruição do clima provocada pelas emissões das economias mais ricas e para poderem crescer ao mesmo tempo que garantem a sua neutralidade carbónica.

No termo da conferência, o seu presidente, Alok Sharma, procurando ser o mais otimista possível não conseguiu afirmar mais do que isto: “Podemos dizer, com credibilidade, que mantivemos vivo o objetivo dos 1,5º Celsius. Mas o seu pulso é fraco e ele só sobreviverá se cumprirmos as promessas [incluídas no acordo final] e traduzirmos os compromissos em ações rápidas.” Nem todos os participantes e observadores estão de acordo que tal afirmação possa ser credível e alguns não duvidam de que o objetivo dos 1,5º Celsius está já perdido.

O secretário-geral da ONU, António Guterres foi mais contundente na sua avaliação do acordo alcançado: “Estamos no limiar da catástrofe climática. Temos de entrar imediatamente em modo de emergência, ou a nossa chance de reduzir a zero [as emissões] será zero.”

Vários avanços técnicos significativos, como a clarificação do mercado de carbono (“desconto” nas emissões com efeito de estufa por contrapartida do investimento feito, muitas vezes em países terceiros, para, por exemplo, plantação de árvores, ou na criação de outros “sumidouros” de carbono), assim como na exatidão dos relatórios anuais fornecidos pelos entidades nacionais, não bastaram para evitar o desapontamento de muitos países e de responsáveis de agências multilaterais, ou internacionais.

É o caso do diretor executivo da Agência Internacional de Energia, Fatih Birol, que afirmou, citado pelo The Guardian, ser necessário, para se ficar dentro do limite dos 1,5º Celsius, que “mais de 40 por cento das 8.500 centrais de carvão existentes no mundo tenham que fechar até 2030, e nenhum nova possa ser construída”. Ora, sobre este assunto, nenhuma decisão concreta foi tomada.

“Hoje vivemos numa outra crise climática. Um clima de desconfiança envolve o nosso planeta. A ação climática pode ajudar a reconstruir a confiança e restaurar a credibilidade”, afirmou Guterres na sua mensagem final  à Cimeira de Glasgow. Como não podia deixar de ser, a mensagem terminava, depois de referir os sucessos e insucessos desta, com uma palavra de esperança: “Estamos na luta de nossas vidas. Nunca desistiremos. Nunca recuaremos. Continuaremos a avançar.”





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