Enquanto procuramos honrar a memória de
Fernão de Magalhães, recordo, como neta de comandante de veleiros, as
dificuldades e perigos por que passavam esses navegadores até chegarem a bom
porto.
Eis o excerto do
rascunho de uma carta, na qual meu avô, Augusto Serra Costa, pretendia
responder ao apelo do Almirante Gago Coutinho ao preparar a sua heróica viagem
aérea de travessia do Atlântico Sul. Respeita-se a ortografia e linguagem da
época:
“...vou a informar como capitão da marinha
mercante contando algumas dezenas de viagens das ilhas de Cabo Verde e Guiné
para Lisboa, em navios de vela, nunca tentei a navegação de bordejar ao longo
da costa por ser praticamente impossível tanto para barcos latinos como
redondos, usando sim e sempre a de grande bordada ao largo, aproveitando a
bolina, as brisas do NE, e vindo, na sua maioria das viagens, demandar as ilhas
dos Açores para então, aguardando os ventos geraes, demandar o nosso porto.”
A navegação é, como se vê, uma ciência
que sabe prever onde está e de onde vem, conforme a época do ano, o vento
favorável à navegação e como agir de modo a minimizar os riscos e canseiras para os velejadores chegarem sãos
e salvos a bom porto.
Pois bem, para quem espera chegar ao
Céu, ao “bom porto” eterno, a Quaresma é a época do ano em que os ventos estão
de feição. O Papa Francisco convida-nos, tal como a Igreja sempre fez, a buscar
três ventos em particular: a oração, a
mortificação e a esmola. Há, abrangendo todos estes atos de piedade, um
vento particularmente favorável nesta época. Trata-se do sacramento da confissão,
aquele que melhor satisfaz quem busca a misericórdia de Deus. Ali, na
intimidade do confessionário, Deus não resiste ao pecador arrependido e... logo
lhe perdoa, em nome de Deus, tudo e completamente. Ao ouvir as palavras do
sacerdote: “Vai em paz. Os teus pecados estão perdoados”, já está perdoado. O
penitente pode ter a certeza de que, aqueles pecados que tinha, já os não tem.
Está livre deles. Já escapou destes escolhos que o ameaçavam de não chegar ao
bom porto que é o Céu.
Não é de admirar, pois este vento
favorável da Confissão contem os três ventos já mencionados. Quem se vai
confessar, prepara-se rezando (oração)
e, terminada a confissão, reza a penitência, e talvez lhe acrescente um “Obrigado, meu Deus, por seres tão bom para comigo.”
A partir deste momento, já pode comungar o Corpo de Cristo de consciência
limpa. A mortificação, no caso
concreto da confissão, é comum ao confessor e ao penitente. O confessor
sacrifica-se sentando-se num cubículo, quase sem poder mudar de posição, e isto
durante horas, à disposição dos pecadores arrependidos. Há sacerdotes que usam
disciplinas e cilício com o objectivo de seguir o exemplo de Cristo que se
deixou flagelar, coroar de espinhos e crucificar pelos pecadores. Também estes,
se estão arrependidos, travam uma luta consigo próprios ao quererem vencer
todas as tentações que o demónio lhes apresenta nessas ocasiões (a falta de
tempo, a vergonha de dizer o que fizeram mal, o medo do que dirão os outros, a
paciência para esperar a sua vez, o jejum para quem aproveita, por exemplo, a
hora de almoço para se confessar, a preguiça que pode surgir como forma de leve
dor de cabeça ou cansaço, etc. Finalmente, pensemos na esmola que, na confissão toma a sua mais elevada forma: a da
caridade. A caridade está bem patente na esmola que os sacerdotes (isto é,
Cristo que nos perdoa servindo-se da voz dos confessores), nos fazem. Também o
penitente vive a caridade; primeiro porque, ao receber este sacramento, se une
mais a Cristo, passando a amar mais os seus irmãos, depois porque sai com boas
disposições para ser melhor cristão.
Também quem vos escreve aproveita a
brisa favorável dos leitores que, em tempo de Quaresma, têm o coração aberto à
paciência, essa grande manifestação de caridade.
Isabel Vasco Costa
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