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segunda-feira, 25 de março de 2019

Ventos a favor

Enquanto procuramos honrar a memória de Fernão de Magalhães, recordo, como neta de comandante de veleiros, as dificuldades e perigos por que passavam esses navegadores até chegarem a bom porto.

Eis o excerto do rascunho de uma carta, na qual meu avô, Augusto Serra Costa, pretendia responder ao apelo do Almirante Gago Coutinho ao preparar a sua heróica viagem aérea de travessia do Atlântico Sul. Respeita-se a ortografia e linguagem da época:

...vou a informar como capitão da marinha mercante contando algumas dezenas de viagens das ilhas de Cabo Verde e Guiné para Lisboa, em navios de vela, nunca tentei a navegação de bordejar ao longo da costa por ser praticamente impossível tanto para barcos latinos como redondos, usando sim e sempre a de grande bordada ao largo, aproveitando a bolina, as brisas do NE, e vindo, na sua maioria das viagens, demandar as ilhas dos Açores para então, aguardando os ventos geraes, demandar o nosso porto.

A navegação é, como se vê, uma ciência que sabe prever onde está e de onde vem, conforme a época do ano, o vento favorável à navegação e como agir de modo a minimizar os riscos  e canseiras para os velejadores chegarem sãos e salvos a bom porto.

Pois bem, para quem espera chegar ao Céu, ao “bom porto” eterno, a Quaresma é a época do ano em que os ventos estão de feição. O Papa Francisco convida-nos, tal como a Igreja sempre fez, a buscar três ventos em particular: a oração, a mortificação e a esmola. Há, abrangendo todos estes atos de piedade, um vento particularmente favorável nesta época. Trata-se do sacramento da confissão, aquele que melhor satisfaz quem busca a misericórdia de Deus. Ali, na intimidade do confessionário, Deus não resiste ao pecador arrependido e... logo lhe perdoa, em nome de Deus, tudo e completamente. Ao ouvir as palavras do sacerdote: “Vai em paz. Os teus pecados estão perdoados”, já está perdoado. O penitente pode ter a certeza de que, aqueles pecados que tinha, já os não tem. Está livre deles. Já escapou destes escolhos que o ameaçavam de não chegar ao bom porto que é o Céu.

Não é de admirar, pois este vento favorável da Confissão contem os três ventos já mencionados. Quem se vai confessar, prepara-se rezando (oração) e, terminada a confissão, reza a penitência, e talvez lhe acrescente um “Obrigado, meu Deus, por seres tão bom para comigo.” A partir deste momento, já pode comungar o Corpo de Cristo de consciência limpa. A mortificação, no caso concreto da confissão, é comum ao confessor e ao penitente. O confessor sacrifica-se sentando-se num cubículo, quase sem poder mudar de posição, e isto durante horas, à disposição dos pecadores arrependidos. Há sacerdotes que usam disciplinas e cilício com o objectivo de seguir o exemplo de Cristo que se deixou flagelar, coroar de espinhos e crucificar pelos pecadores. Também estes, se estão arrependidos, travam uma luta consigo próprios ao quererem vencer todas as tentações que o demónio lhes apresenta nessas ocasiões (a falta de tempo, a vergonha de dizer o que fizeram mal, o medo do que dirão os outros, a paciência para esperar a sua vez, o jejum para quem aproveita, por exemplo, a hora de almoço para se confessar, a preguiça que pode surgir como forma de leve dor de cabeça ou cansaço, etc. Finalmente, pensemos na esmola que, na confissão toma a sua mais elevada forma: a da caridade. A caridade está bem patente na esmola que os sacerdotes (isto é, Cristo que nos perdoa servindo-se da voz dos confessores), nos fazem. Também o penitente vive a caridade; primeiro porque, ao receber este sacramento, se une mais a Cristo, passando a amar mais os seus irmãos, depois porque sai com boas disposições para ser melhor cristão.

Também quem vos escreve aproveita a brisa favorável dos leitores que, em tempo de Quaresma, têm o coração aberto à paciência, essa grande manifestação de caridade.

Isabel Vasco Costa



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