Um artigo de 10 de Maio de 1975, do economista italiano misteriosamente desaparecido
Roma, 06 de Agosto de 2013
Na noite entre 14 e 15 de Abril de 1987, o economista
italiano Federico Caffè desapareceu misteriosamente, aos 73 anos de
idade [ele foi oficialmente declarado morto em 30 de Outubro de 1998,
ndr]. Professor de Política Económica e Financeira desde 1956 na
Faculdade de Economia e Comércio de Roma, ele ajudou a formar
importantes economistas e banqueiros que actualmente detêm posições de
prestígio no país e no continente, como Mario Draghi (presidente do
Banco Central Europeu) e Ignazio Visco (presidente do Banco da Itália).
A editora Castelvecchi reuniu no livro "Contra os encapuçados das finanças" todos os artigos escritos por Caffè nos jornais Il Messaggero, de Roma, entre 1974 e 1986, e L’Ora, de Palermo, de 1983 a 1987.
Pretendemos publicar na íntegra alguns artigos que tratam de
trabalho, insegurança no emprego e salários, devido à sua extraordinária actualidade.
Começaremos, hoje, com o texto do dia 10 de maio de 1975, publicado em Il Messaggero com o título "Quanto custa a recuperação global?"
***
Alguns meses atrás, um importante semanário económico de reputação e circulação internacional, o The Economist, examinou cuidadosamente que perigos havia de que o mundo rumasse para uma crise de proporções similares à de 1929.
As considerações, embora sublinhassem as diferenças radicais entre os
contextos económicos dos anos trinta e os de hoje, eram essencialmente
pessimistas. Mais recentemente, a mesma revista apresentou a
problemática do próximo boom global, que já estaria à vista e
que envolveria o risco de fugir ao controle, no sentido de se
transformar num sobreaquecimento generalizado e numa acentuação das
pressões inflacionárias.
Não muito diferentes da economia mundial, que parece mover-se em direcção a um período de alternâncias próximas entre rápidas expansões e
drásticas contracções, com as conseguintes políticas de freio-aceleração,
também as opiniões dos inquisidores do futuro imediato estão sujeitas a
fases de pessimismo e de optimismo.
Já nas notas económicas deste mesmo jornal, aliás, foi devidamente
observado, no tocante aos assuntos económicos do nosso país [a Itália,
ndr], que actualmente prevalece a tendência positiva.
É claro que devemos esperar que as coisas se encaminhem para o seu
melhor. Mas faríamos muito bem se não perdêssemos de vista os custos a
ser pagos para que o mundo chegue até a sua esperada recuperação, nem os
elementos perturbadores que continuarão operando mesmo quando a
recuperação se firmar.
Em primeiro lugar, a opção pela moderação da inflação, ainda que à
custa de um aumento do desemprego, levou mais uma vez, na história do
capitalismo moderno, à aceitação de uma enorme falange de desempregados.
Dizer que esta falange, no mundo industrializado, atingiu a magnitude
de dez milhões de unidades envolve uma subavaliação deliberada e injusta. Parece que o destino das novas levas de trabalho que surgem
no mercado é o de ser negligenciadas a tal ponto (infelizmente, pelos
próprios sindicatos) de não entrarem nem mesmo no cálculo dos “efectivos”
desempregados.
Em segundo lugar, a ênfase excessiva dada à questão dos fluxos
financeiros (lavagem de dinheiro, petro-dólares e afins) teve os seus
custos, dentro das economias particulares, ao determinar desacelerações
mais bruscas do que seria estritamente necessário, mesmo em se levando
em consideração a necessidade imperativa do reequilíbrio externo.
A política económica, para libertar-se da impulsividade e tender à
racionalidade, exige uma avaliação razoável dos tempos, dos modos e da
intensidade das intervenções. Não pretendemos que isto deva ser
conseguido com “dosagens refinadas”, que, é preciso ter a humildade de
reconhecer, fazem parte, hoje, das compreensíveis ambições dos
responsáveis pelas decisões de política económica, mas não estão entre
as suas possibilidades concretas. As cartas de navegação entre os
perigos da inflação e a tragédia do desemprego (incluindo aqui a
marginalização, a precariedade de trabalho e os subempregos) ainda são
incertas e confusas, e, inevitavelmente, age-se, em imensa medida, por
tentativa e erro.
Que esses erros, porém, devam sistematicamente resultar em níveis de actividade inferiores aos que são possíveis, mesmo em condições nas quais
esses níveis não devam ser freados, significa não perceber que, entre
todos os "desajustes", o mais grave é aquele em que pode incorrer o
sistema em si.
Para que isto não pareça sem valor para os trabalhadores estagnados,
para os desempregados, para as novas levas de trabalho (e obviamente,
para as famílias), devemos recuperar o ensinamento que apontava, na
incapacidade de oferecer oportunidades de trabalho suficientes e nas
desigualdades de distribuição (dois fenómenos significativamente
conexos), os males insidiosos dos sistemas económicos em que vivemos.
in
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