Os eventos que marcaram a história, contados pelo director da Sala de Imprensa do Vaticano: da renúncia de Bento XVI a eleição de Bergoglio e os seus emocionantes 12 meses de pontificado
Roma, 03 de Março de 2014 (Zenit.org) Wlodzimierz Redzioch
Estamos há um ano da renúncia de Bento XVI. Uma atmosfera
pesada pairou sobre a Igreja católica e a cúria Romana depois dos
escândalos de pedofilia e a traição do mordomo. Os preparativos do
Conclave e a eleição surpreendente do primeiro Papa não europeu fizeram
com que Roma fosse invadida por uma multidão de jornalistas, algo que
não acontecia desde a morte de João Paulo II. Por várias semanas, Pe.
Federico Lombardi, director da Sala de Imprensa do Vaticano teve que
responder as perguntas de cerca de seis mil jornalistas. Em uma
atmosfera tensa e incerta o director da Sala de Imprensa do vaticano
realizou a difícil tarefa de explicar aos jornalistas provenientes de
todo o planeta, o que estava acontecendo. Trata-se de eventos que
marcaram a história da Igreja católica e do mundo. Para conhecer o que
aconteceu neste último ano entrevistamos padre Lombardi.
***
Há um atrás a situação parecia catastrófica. Os escândalos,
reais ou imaginários, eram amplificados pela media com uma agressividade
sem precedentes. Calúnias, suspeitas, insinuações.... Como afrontou a
situação o Director da Sala de Imprensa do Vaticano?
Padre Lombardi: Os meios de comunicação nem sempre são capazes de
avaliar objectivamente determinadas situações. Às vezes criou-se uma
atmosfera emocional em que se enfatizou apenas aspectos negativos, em
vez dos positivos. Em torno da Igreja havia sido criado uma atmosfera de
negatividade. Uma parte do pontificado de Bento XVI foi marcado por
eventos pesados. As acusações de abusos sexuais por parte do clero jogou
mais do que uma sombra sobre a Igreja. Uma história triste, tanto mais
porque o pontificado de Bento XVI foi de grande rigor e coragem ao lidar
com essas situações, criando as condições para uma purificação. Depois,
havia as questões internas que favoreceram a fuga das notícias. E isto
aumentou de forma desproporcional a imagem negativa do Vaticano. Não
quero negar os erros e as coisas erradas, mas generalizando jogou-se uma
sombra de suspeita sobre a instituição e sobre as pessoas que serviram
com absoluta fidelidade o Papa e a Igreja. Para piorar, o mesmo fato
dramático da traição gerou um desconforto forte.
O escândalo no uso de documentos confidenciais envolveu uma
pessoa que todos nós conhecíamos e que estava próxima a Bento XVI. Com
quais sentimentos você recebeu a notícia de que Paolo Gabriele traía o
Papa?
Padre Lombardi: Paolo Gabriele disse durante o julgamento que ele
queria contribuir para a purificação das tensões que havia na Curia.
Pensou que copiando e passando documentos confidenciais teria dado uma
contribuição positiva. Depois, deu-se conta de que era uma coisa errada.
Traiu de forma séria a confiança do Papa. Eu não expresso nenhum juízo
pessoal sobre o comportamento de Paolo Gabriele. As suas acções se
inserem no contexto das discussões sobre a gestão da governadoria com a
rotação do arcebispo Carlo Maria Viganò. Outra questão em discussão era a
do Instituto de Obras Religiosas (IOR) e as actividades
económico-financeiras no Vaticano. Trata-se de problemas que envolvem um
conhecimento dos aspectos técnicos, e é justo que haja discussões, mas
infelizmente a media informou de modo decididamente negativo.
Naquela época, a media criticou severamente o Vaticano
alegando que tinha cometido muitos erros na comunicação. O que acha
dessas críticas?
Padre Lombardi: O fato de que Paolo Gabriele tenha passado centenas
de documentos a um jornalista não tem nada a ver com a capacidade de
comunicar do Vaticano!
Há problemas e acções deste tipo que nenhuma comunicação pode torná-lo
menos grave. Obviamente, sempre é possível melhorar. E por esta razão
na Secretaria de Estado apareceu a figura de um conselheiro de
comunicação na pessoa de Greg Burke. É muito importante que haja uma
ligação entre o governo, as decisões, a elaboração de documentos e a
comunicação. Dessa forma, enquanto são preparados os documentos pensa-se
já como devem ser apresentados e comunicados. Assim, a Sala de Imprensa
não tem que comunicar as decisões e os documentos que caem do céu, como
aconteceu, por exemplo, com a decisão de tirar a excomunhão dos
lefebvrianos. Tendo Greg na Secretaria de Estado estou mais tranquilo e
mais ainda porque tenho uma pessoa que conhece bem a media americana.
No dia 11 de Fevereiro de 2013 Bento XVI convocou um
consistório. Ninguém imaginava o que iria acontecer. Como você
experimentou a notícia da renúncia do pontificado de Bento XVI?
Padre Lombardi: "Repito-o muitas vezes - elevando o espanto dos meus
interlocutores - que para mim não foi algo tão chocante ou
surpreendente! Não porque eu tinha sido avisado antes do 11 de Fevereiro, mas porque quem acompanhava de perto Bento XVI se dava conta
de que ele estava avaliando a consistência das próprias forças que diminuíam. Era possível que pudesse chegar àquela decisão. Já havia
falado explicitamente no livro-entrevista com Peter Seewald, alguns anos
antes. No livro "Luz do Mundo", Bento XVI diz claramente que em
determinadas situações o papa pode, e mais, deve renunciar. Vivi aquele
momento com uma certa lucidez, tentando explicar bem os motivos da
renúncia que, na minha opinião, se encontram todos no papel que Bento
XVI leu durante o Consistório.
Das 12.30 do 11 de Fevereiro, você teve que enfrentar o fogo
cruzado de perguntas de centenas de jornalistas que vieram de todo o
mundo. Em cima, se tratava de uma situação sem precedentes, nova,
“inédita”. Como é que conseguiu gerir aquela situação?
Padre Lombardi: Era necessário explicar as razões da renúncia, mas
também o que teria acontecido nos últimos dias do pontificado do Papa
Bento XVI. Depois, era preciso explicar o que é “sé vacante”. Em seguida
havia as Congregações antes do Conclave e o mesmo Conclave. Tentei
lidar com essas etapas com uma determinada ordem para compreender melhor
os eventos.
Quem eram os seus interlocutores na Cúria?
Padre Lombardi: O maior trabalho naquele momento foi o de procurar
continuamente as fontes para responder as perguntas que os jornalistas
me colocavam. Até o 28 de Fevereiro havia secretário de Estado, depois o
cardeal Tarcisio Bertone assumiu o papel de Camerlengo. Outros
interlocutores foram: o Decano do Colégio Cardinalício, o substituto da
Secretaria de Estado, o secretário da governadoria, a polícia, a
Prefeitura da Casa Pontifícia, os textos jurídicos, os históricos,
especialmente para a história dos conclaves. Muitas vezes eu tinha que
dizer aos jornalistas: “Não sei responder agora. Te darei a resposta
amanhã” e para responder tinha que procurar as pessoas certas para os
esclarecimentos. Muito me ajudaram também padre Thomas Rosica csb, para
os jornalistas de língua inglesa, e mons. José María Gil Tamayo para a
língua espanhola.
(A segunda parte será publicada quarta-feira, 5 de Março)
(Trad.TS)
(03 de Março de 2014) © Innovative Media Inc.
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