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terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

C.S. Lewis «inscreve» outro convertido: um ex bateria «punkie» que lia as suas páginas sobre a soberba

Terry Chimes tocou com The Clash e Black Sabbath 

A inconfundível estética dos oitenta de The Clash:
Terry Chimes é o terceiro pela esquerda.
Actualizado 3 de Fevereiro de 2014

C.L. / ReL

Há escritores que, como pistoleiros no revólver, poderiam fazer moscas nos seus livros para recordar o número de convertidos provocados pelas suas páginas-bala. G.K. Chesterton (1874-1936) é um deles, e recentemente Joseph Pearce incluía essa "abundância de frutos da sua tarefa como evangelizador" entre os argumentos a favor da sua beatificação.

Outro "fabricante" de católicos (ainda sem chegar a sê-lo ele mesmo nunca formalmente, por mais que a sua proximidade doutrinal à Igreja era quase absoluta) foi C.S. Lewis (1898-1963), e em particular o seu ensaio Mero cristianismo, que levou à fé, entre outros, o teólogo Scott Hahn ou o genetista Francis Collins.

A celebridade através da percussão
A estes haveria que acrescentar agora Terry Chimes, ex bateria de duas míticas bandas de punk rock dos 80, The Clash (sobretudo) e Black Sabbath, com quem tocou um curto período de tempo.

Nascido em 1956 no distrito londrino de Stepney, desde 1976 e durante uma década uniu-se a diversos grupos e adquiriu fama com as baquetas. De facto, em 2003 o seu nome foi incluído no Rock and Roll Hall of Fame, que perpetua em Cleveland (Ohio) os maiores entre os músicos do género.

Então, sem dúvida, tinha mudado bombos e pratos pela quiroprática, uma técnica de tratamento de moléstias músculo-esqueléticas de controvertida base científica e pretensões espirituais à qual se entregou profissionalmente desde 1993.

Porquê? Em 1985, durante uma tournée com os Black Sabbath, tinha-se lesionado num braço depois de jogar três horas seguidas bowling. O quiroprático que viajava com a banda de Ozzy Osbourne  tratou-o, possibilitando que pudesse tocar, e Terry decidiu substituir uma profissão por outra.

Aos 17 anos tinha planeado ser médico, deixou-o para entregar-se à percussão, e algo do bichinho de curar os outros quis matar com as clínicas quiropráticas que acabou fundando.

É ao que se dedica na actualidade, mas além disso em Novembro do ano passado escreveu em e-book a sua autobiografia, The Strange Case of Dr Terry and Mr Chimes (humorística referência a si mesmo ao modo de O estranho caso do Dr Jekyll e Mr Hyde, de Robert Louis Stevenson [1850-1894]). Nela, conta a sua vida como roqueiro, a sua transição profissional, e "as percepções espirituais que guiaram a sua vida". 

Esses livros de segunda mão comprados ao azar...
Um artigo no Catholic Herald ofereceu na passada terça-feira alguns detalhes a respeito, em concreto do seu regresso ao catolicismo no qual tinha sido baptizado. Foi em 1998, e na origem estão as três palestras radiofónicas de C.S. Lewis (o autor de As Crónicas de Narnia) recolhidas no volume que baptizou Mero cristianismo. 

O Grande Pecado
Comprou-o por casualidade numa livraria de ocasião, e ao embeber-se nas suas páginas encontrou-se com o capítulo ("O Grande Pecado") no qual Lewis aborda a soberba.

"O grande pecado é a soberba, a tendência que todos temos a pensar que somos melhores que os demais. Sempre tinha sabido que existia a soberba, mas perguntava-me porquê se a considerava o Grande Pecado. Até que compreendi o significado da soberba como um obstáculo ao crescimento espiritual", explica Chimes.

"O problema da soberba", continua", "é que aqueles que mais a tem são aqueles que menos a vêem. C.S. Lewis dizia que se fizeste algumas boas obras, leste alguns livros espirituais, talvez praticado a meditação ou deixado de beber e te orgulhas disso, pensando que és mais espiritual que os demais, então Satanás esfregará as mãos de satisfação, porque te terá caçado numa armadilha espiritual da qual é muito difícil escapar".

Lágrimas, introspecção, "presença"...
Ler essas palavras foi decisivo para Terry: "Tive a espantosa consciência de ter estado nessa armadilha durante vinte anos. Deixei o livro e fui sentar-me no sofá. Dar-me conta de que tinha estado atolado durante todo este tempo fazia-me cambalear. Em apenas uns minutos estava vivendo a mais extraordinária experiência da minha vida".

De certo modo, foi uma experiência mística. Afirma que sentiu como se uma "presença" o atravessasse "em fortes ondas": "Nesse momento, todo o material e o sensível parecia nada comparado com o poder e a majestade dessa presença. Tudo no meu mundo parecia fazer-se em pedaços, deixando-me minúsculo, desnudo e exposto. Mas ao mesmo tempo senti o amor mais extraordinariamente poderoso. Essa presença sabia tudo sobre mim, e sem dúvida amava-me".

"Houve muitas lágrimas", confessa, "mas também o mais profundo sentimento de que eu sempre seria amado, até ao final dos tempos e mais além. Compreendi nesse momento que a minha vida não poderia nunca mais ser a mesma".

A confissão, âncora de salvação
Chimes determinou dar um giro radical à sua forma de ver as coisas: "Decidi reordenar todas as minhas prioridades. Quando li aquilo de Santo Agostinho: ´Fizeste-nos, Senhor, para ti, e o nosso coração andará inquieto enquanto não há descanso em ti´, compreendi que expressava perfeitamente os meus sentimentos daquele momento".

Foi ao sacramento da confissão, porque guardava dele uma boa recordação infantil. Junto com um amigo, tinha cometido um pequeno roubo, e quando foi a dormir a consciência remoía-o: "A minha educação católica dizia-me que roubar é pecado e uma ofensa a Deus". Essa inquietude não se ia.

Os seus padres notaram-na, mas ele não quis abrir-lhes o seu coração. Até que decidiu levá-lo ao confessionário, onde o sacerdote obteve dele a promessa de devolver o roubado, não fazê-lo mais e cumprir a penitência imposta: "Quando a cumpri, senti como um grande peso que se me tinha tirado dos ombros, e nunca quis voltar a ter um sentimento de má consciência outra vez".

Assim que, já retornado à fé e à Igreja, o ex bateria punkie nos dá um conselho: "Apesar das críticas que ouçais a receber uma educação católica e à ideia da confissão, tenho que dizer que no meu caso particular funcionou".



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