Homilia do Santo Padre na santa missa da Jornada dos catequistas
Roma, 29 de Setembro de 2013
Na manhã desse domingo às 10.30 (hora de Roma), o santo
padre celebrou a santa missa pela Jornada dos Catequistas, por ocasião
do Ano da Fé, na praça de São Pedro. Publicamos a seguir a homilia:
***
1 . “Ai dos despreocupados de Sião e daqueles que se consideram
tranquilos... Deitados em leitos de marfim” (Am 6,1.4 ), comem, bebem,
cantam, se divertem e não se preocupam com os problemas das outras
pessoas.
Estas palavras do profeta Amós são duras, mas chamam a atenção sobre
um perigo que todos nós corremos. O que é que este mensageiro de Deus
denuncia, o que é que coloca diante dos olhos de seus contemporâneos e
até mesmo diante de nossos olhos hoje? O risco do conforto, da
comodidade, da mundanidade na vida e no coração, de colocar no centro da
nossa vida o nosso bem-estar. É a mesma experiência do rico do
Evangelho, que vestia roupas de luxo e todos os dias se dava abundantes
banquetes; isto era importante para ele. E o pobre que estava à sua
porta e não tinha nada para matar a fome? Não era problema dele, não lhe
dizia respeito. Se as coisas, o dinheiro, a mundanidade se tornam o
centro da vida, elas nos prendem, nos possuem e nós perdemos a nossa
própria identidade de homens: olhem bem, o rico do Evangelho não tem
nome, é simplesmente “um rico”. As coisas, o que possui, são o seu
rosto, não tem outros.
Mas tentemos perguntar-nos: por que é que isso acontece? Como é
possível que os homens, talvez também nós, caiamos no perigo de
encerrar-nos, de colocar a nossa segurança nas coisas, que no final das
contas nos roubam o rosto, o nosso rosto humano? Isso acontece quando
perdemos a memória de Deus. " Ai dos despreocupados de Sião", dizia o
profeta. Se não há memória de Deus, tudo fica nivelado, tudo vai para o
ego, para o meu bem-estar. A vida, o mundo, os outros, perdem a
consistência, não contam para nada, tudo se reduz a uma única dimensão: o
ter. Se perdemos a memória de Deus, até nós mesmos perdemos
consistência, até nós nos esvaziamos, perdemos o nosso rosto como o rico
do Evangelho! Quem corre atrás do nada torna-se ele mesmo um nada – diz
outro grande profeta, Jeremias (cf. Jer 2,5 ) . Nós somos feitos à
imagem e semelhança de Deus, não à imagem e semelhança das coisas, dos
ídolos!
2 . Agora, olhando para vocês, me pergunto: quem é o catequista? É
aquele que protege e nutre a memória de Deus; a guarda em si mesmo e
sabe despertá-la nos outros. É bonito isso: fazer memória de Deus, como
Nossa Senhora que, diante da acção maravilhosa de Deus na sua vida, não
pensa na honra, no prestígio, nas riquezas, não se fecha em si mesma.
Pelo contrário, depois de ter acolhido o anúncio do Anjo e de ter
concebido o Filho de Deus, o que faz? Vai, visita à anciã parente
Isabel, também grávida, para ajudá-la; e no encontro com ela o seu
primeiro acto é a memória do actuar de Deus, da fidelidade de Deus na sua
vida, na história do seu povo, na nossa história: “A minha alma
engrandece ao Senhor ... pois olhou para a humildade da sua serva... de
geração em geração a sua misericórdia " (Lc 1,46.48.50 ) . Maria tem
memória de Deus.
Neste cântico de Maria tem também a memória da sua história pessoal, a
história de Deus com ela, a sua própria experiência de fé. E assim é
para cada um de nós, para cada cristão: a fé contém precisamente a
memória da história de Deus connosco, a memória do encontro com Deus, que
se move primeiro, que cria e salva, que nos transforma; a fé é memória
da sua Palavra que aquece o coração, das suas acções de salvação com que
nos dá vida, nos purifica, nos cura, nos alimenta. O catequista é
precisamente um cristão que coloca esta memória ao serviço do anúncio;
não para se mostrar, não para falar de si, mas para falar de Deus, do
seu amor, da sua fidelidade. Falar e transmitir tudo o que Deus revelou,
ou seja, a doutrina na sua totalidade, sem tirar ou acrescentar.
São Paulo aconselha especialmente ao seu discípulo e colaborador
Timóteo uma coisa: “lembra-te, lembra-te de Jesus Cristo, ressuscitado
dentre os mortos, que eu anuncio e pelo qual sofro (cf. 2 Tm 2, 8-9).
Mas o apóstolo pode dizer isso porque ele se lembrou primeiro de Cristo,
que o chamou quando era um perseguidor dos cristãos, o tocou e
transformou com a sua Graça.
O catequista, então, é um cristão que carrega consigo a memória de
Deus, se deixa guiar pela memória de Deus em toda a sua vida, e sabe
como despertá-la no coração dos outros. Isso é exigente! Compromete toda
a vida! O que é o mesmo Catecismo, senão memória de Deus, memória da
sua acção na história, do seu ter-se feito próximo em Cristo, presente na
sua Palavra, nos Sacramentos, na sua Igreja, no seu amor? Caros
catequistas, pergunto-lhes: nós somos memória de Deus? Somos realmente
como sentinelas que despertam nos outros a memória de Deus, que aquece o
coração?
3. "“Ai dos despreocupados de Sião", diz o profeta. Qual o caminho a
ser seguido para não virar pessoas “despreocupadas”, que colocam a sua
segurança em si mesmas e nas coisas, mas homens e mulheres da memória de
Deus? Na segunda leitura, São Paulo, escrevendo a Timóteo, dá algumas
indicações que podem marcar também a trajectória do catequista, o nosso
caminho: seguir a justiça, a piedade, a fé, o amor, a paciência, a
mansidão (cf. 1 Tm 6 , 11).
O catequista é homem da memória de Deus se tiver um relacionamento
constante, vital com Ele e com os outros; se for homem de fé, que confia
realmente em Deus e coloca Nele a sua segurança; se for homem de
caridade, de amor, que vê a todos como irmãos; se for homem de
“hypomoné”, de paciência, de perseverança, que sabe lidar com as
dificuldades, provações, fracassos, com serenidade e esperança no
Senhor; se for homem manso, capaz de compreensão e de misericórdia.
Peçamos ao Senhor para sermos todos homens e mulheres que guardem e
alimentem a memória de Deus na própria vida e saibam despertá-la no
coração dos outros. Ámen.
in
Sem comentários:
Enviar um comentário