O modo de constituir empresas nos EUA, que não proíbe a distribuição de lucros e a remuneração justa do capital, se encaixa na experiência de economia civil proposta pela Caritas in Veritate
Roma, 18 de Julho de 2013
A economia civil católica sempre considerou maniqueísta
dividir as empresas entre "boas" e "más" com base exclusivamente na
busca ou não do lucro. Esta visão é fruto da matriz cultural estatista
ou neoliberalista.
A Doutrina Social da Igreja (DSI) sempre denunciou os limites dessa
visão e, mais recentemente, em meio à crise financeira, mostrou um
caminho às sociedades pós-modernas com a Caritas in Veritate.
Para a DSI, a empresa deve poder combinar o lucro com valores como a
generosidade, a fraternidade, o bem comum, as virtudes cívicas, o doar, o
incluir, e assim por diante.
No tocante ao crowdfunding cívico, a Consob (Comissão
Nacional para as Empresas e a Bolsa de Valores), na Itália, deu uma
sacudida inicial no baluarte ideológico sobre a distribuição de lucros
nas empresas de tipo social. A regulamentação da captação online
de capital, publicada na última sexta-feira pela comissão, reconhece o
status de empresa social também para as empresas sociais que no futuro
poderão remunerar o capital de risco.
Mais especificamente, o regulamento incorpora os conceitos da lei anterior e estabelece que, para entrar no civic crowdfunding, uma empresa deve ser uma "startup
inovadora". Mas o alcance ultrapassa as fronteiras tecnológicas. No
item C do artigo 2 do regulamento, a Consob define como "emissor" do crowdfunding cívico "as startups inovadoras, incluindo as startups com vocação social, como definidas no artigo 25 do decreto" (decreto-Lei 179, de 18 de Outubro de 2012).
Em outras palavras, é reconhecida a figura jurídica das startups com vocação social.
O decreto configura a empresa inovadora e descreve a dimensão social prevendo como startups
de vocação social aquelas que operam exclusivamente nas áreas “de
utilidade social”, como a assistência social e a protecção do meio
ambiente. A única condição restritiva para se encaixar na figura legal
da startup inovadora: não distribuir lucros aos próprios sócios
durante quatro anos. No regulamento Consob, porém, não há nenhuma
referência ao polémico artigo 3 da Lei 155, que reafirma a necessidade,
nas empresas sociais, de não visar o lucro e de não distribuir lucros.
O debate já dura décadas, entre aqueles que permanecem ancorados à
ideologia do “sem fins lucrativos” e do terceiro sector. Infelizmente, o carácter ideológico também afectou os resultados esperados pela Lei 155.
Uma tentativa de mudar as regras italianas sobre a empresa social foi a
proposta de emenda da Lei de Estabilidade 2013, que visava eliminar a
proibição absoluta da distribuição de lucros (substituindo-a por um tecto
de 50%) e para categorias específicas de sócios que não pudessem ter
cotas de controle da empresa. A proposta de emenda, infelizmente, foi
fortemente contestada pela oposição e o governo a retirou.
Esta derrota parlamentar representa o húmus cultural maniqueísta que
confunde "a distribuição de lucros" com a "especulação". Espera-se que o
crowdfunding cívico e a regulação Consob reformem o conceito de empresa social na Itália e, de modo mais geral, também o conceito de empresa civil.
Infelizmente, porém, este bloqueio ideológico acontece justo na
pátria histórica da economia civil [a Itália], ao passo que nos EUA, a
terra da diferenciação entre “sem” e “com fins lucrativos”, o tabu foi
superado e empreendeu-se o caminho do "for benefit".
Trata-se de um modo de fazer empresa que não nega a possibilidade de
distribuir lucros e remunerar o capital ao mesmo tempo em que se faz uma
empresa social.
Este ponto de vista, quando unido aos valores da generosidade e da
fraternidade, se encaixa na experiência de economia civil proposta pela Caritas in Veritate
e pode abrir caminho para uma quarta forma de empresa, contribuindo
para o desenvolvimento económico civil e para a solução dos problemas
sociais. Em última análise, é um novo modelo de política económica
civil.
Neste sentido, está em andamento um equity crowfunding
aplicado à empresa social, o primeiro do seu tipo no mundo a produzir
um resultado como este: levantar capital difuso junto a pessoas que
querem combinar valores sociais com remuneração do capital. Em outras
palavras, a bondade social da ideia consiste exactamente em dar a partida
a uma trajectória empresarial de sucesso, capaz, ao mesmo tempo, de dar
respostas de valores e ser sustentável economicamente, remunerando com
equidade o capital. Acciona-se, assim, um círculo virtuoso e civil. De
outra forma, o equity crowfunding não seria necessário: “bastariam” as doações.
in
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