Sim, seria mais correto escrever “o nosso livro” no título do artigo, já que cada livro é, em princípio, um presente do escritor aos seus leitores. A sua posse começa quando o nosso olhar é atraído pela capa, o título, o nome do autor, ou o tema e pegamos nele, e o folheamos, e lemos o índice ou alguns trechos. A partir daí, já é um pouco mais “nosso”. Podemos adquiri-lo, para o oferecer ou para ser “meu”.
Uma vez comprado, o
livro está já na minha casa, mas ainda não é completamente “meu”. Os
estudantes mais jovens, por exemplo, possuem livros de estudo que os podem interessar
ou deixar indiferentes. Apesar disso, devemos muito aos bons livros de estudo.
Graças a eles, e aos professores, aprendemos os primeiros rudimentos da “nossa”
cultura. Se nos serviram para aumentar os nossos conhecimentos, isso significa
que a razão captou na memória e inteligência as ideias escritas nesses manuais.
Assim, eles tornaram-se mais “nossos”. Esses conhecimentos irão
acompanhar-nos ao longo da vida, permitindo que a inteligência se desenvolva e se
torne capaz de entender novas ciências, idiomas, ideias... Em algum momento,
ficamos aptos a escolher as nossas leituras (romances, astronomia, aventuras,
filosofia...)
Alguns autores
dizem “o meu livro”, querendo significar com isso que são os seus autores.
Têm razão. Os escritores costumam estudar, investigar, pensar, trocar impressões
com amigos antes de pôr por escrito as suas ideias. Mas, ao publicá-las, estão
a oferecê-las, dando-as a conhecer, aos leitores que, por sua vez, as assimilarão
(ou rejeitarão), intelectualmente, como acontece com os alimentos que tomamos.
Há que ter o mesmo cuidado na escolha dos livros como na escolha dos alimentos.
Há que usá-los nas devidas quantidades e capacidades; também com alguma diversidade.
Há bons livros de humor inteligente e formativo[1]. Também
a boa poesia ajuda a pensar e a sentir, graças à inspiração do poeta. A métrica
e a rima levam a memorizar poesias que aprendemos na juventude que ainda
podemos recitar... Não esqueçamos igualmente a ciência da sabedoria popular própria
dos provérbios, e alcançar o seu significado. Eis um exemplo: “Água mole em
pedra dura/ Tanto dá até que fura”.
Recordemos, por
fim, os livros de Filosofia. São talvez aqueles que mais incentivam ao diálogo.
Lendo-os, somos levados a concordar ou discordar, a imaginar exemplos a favor
ou contra, a reler para melhor compreender as ideias do escritor, a sublinhar,
fazer traços verticais nas margens para marcar as linhas ou parágrafos que nos
interessam. Há quem tome nota, nas folhas em branco do final dos livros, de
frases ou tópicos que desejam rever.
Enfim, os adultos
acabam sempre por falar do “meu livro”, aquele que mais os inspira para
a vida, o que mais sabedoria lhes transmitiu, aquele que levariam consigo para
uma ilha deserta, o que os faria sentir livres e seguros em qualquer circunstância.
Um dos mais mencionados de tais livros como sendo “o meu livro” é a Bíblia. Qual é o seu?
[1] Em
Portugal, é popular a personagem “Mafaldinha” de Quino. Em castelhano, é
conhecida a “História de la Gente”, de Mingote.
Sem comentários:
Enviar um comentário