A vida mudou, hoje em dia é tudo uma correria.
Horas a cumprir nos empregos, horas para ir pôr e ir buscar os filhos, horas não muito tranquilas para fazer o jantar, pois em seguida há que deitar os filhos cedo, tudo comprimido num período de 24 horas.
Não há tempo para pensar, nem para nos interrogarmos e dedicarmos algum espaço a nós próprios.
A relação com os outros é muitas vezes abaixo daquilo que gostaríamos.
No entanto, há outra forma de viver o dia-a-dia, sem deixarmos de fazer todas as tarefas, conseguindo o melhor para nós, com mais satisfação espiritual e oferecendo mais amor aos outros.
Aqui entra o amor pelas pequenas coisas, a caminho da santidade e da felicidade: entregar a Deus tudo o que fazemos, dia a dia, com amor e com perfeição.
Dizia o Santo Padre, numa audiência na Praça de São Pedro: “Uma senhora vai ao mercado e encontra uma vizinha, e começam a falar, e depois os mexericos, e esta senhora diz: não, não, não posso dizer mal de ninguém”. Isto é uma maneira de amarmos mais os outros, é o amor das pequenas coisas. É o caminho da santidade.
Foi exatamente há 93 anos que um sacerdote espanhol “viu” – é a sua expressão: “viu” – uma forma de amar a Deus e de nos levar a todos, independentemente das várias nacionalidades, culturas e mentalidades, à vocação e ao encontro com o mundo, servindo a Igreja. No dia 2 de outubro de 1928, S. Josemaria Escrivá de Balaguer, sacerdote, fundou o Opus Dei. Estava a fazer um retiro na casa central dos Padres de S. Vicente de Paulo, em Madrid, e encontrou com toda a clareza a missão de que Deus o iria incumbir.
Entre várias obras que nos deixou, muitas delas cheias de ensinamentos da vida comum, passo a citar o ponto 829 do livro Caminho: “Não viste os fulgores do olhar de Jesus quando a viúva deixou no templo a sua pequena esmola? – Dá-Lhe tu o que Lhe puderes dar; não está o mérito no pouco nem o muito, mas na vontade com que o deres”.
Em 14 de fevereiro de 1930, percebeu que esta vocação não ficaria completa sem as mulheres.
E mais tarde, em 1943, foi criada a Sociedade Sacerdotal de Santa Cruz, de forma a atender os fiéis da instituição.
O Opus Dei chegou a Portugal há 75 anos, em 6 de fevereiro de 1946.
Em todos os seus ensinamentos, já em 1928, S. Josemaria demonstrava que através do trabalho se podia chegar à santidade; por meio de coisas pequenas, aparentemente sem importância, que, feitas com amor, se tornam grandes: “Asseguro-vos, meus filhos, que quando um cristão realiza com amor a mais intranscendente das ações diárias, ela transborda da transcendência de Deus”.
A sua mensagem foi uma verdadeira revolução, mesmo na Igreja. Nunca ninguém tinha dito com esta clareza que um cristão normal, de rua, podia ser santo.
Em 2017, o Santo Padre explicava, em resposta a uma pergunta de uma menina: “O mundo muda abrindo o coração, ouvindo os outros, recebendo os outros, partilhando, e vocês podem fazer o mesmo” (Respostas a seis mil crianças sobre a maneira de mudar o mundo).
Vou contar uma pequena história: no Natal do ano passado, no sítio onde moro, com a vontade de celebrar através de pequenas coisas, combinou-se e fez-se um presépio na rua para poder juntar os vizinhos (com a devida distância), e dessa comunhão, saíram três cabazes de Natal; abrimos uma conta num supermercado, permitindo às famílias levantarem os bens alimentares de que precisassem. Mudámos um pouco o que era necessário à nossa volta, e o intranscendente tornou-se transcendente.
Pois o cristão não é só o que crê, é também o que vive aquilo em que crê.
Ana Maria Figueiredo
Pintora
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