Sabes decerto,
amor, que existiu um poeta que escreveu que
todas as cartas de amor são ridículas. Talvez. Pois eu sou ridícula! Tenho
escrito tantas…
Ridícula quando conjecturo sobre o que fomos no passado e
o que somos no presente. No passado distante, jovens e apaixonados, navegámos
em ondas alterosas, teimosas e quentes, muito quentes. Soltámos gritos ao vento
e fizemos amor à sombra dos pinheiros e sobre o dourado do areal. No jardim, em
casa, aqui e ali…
Depois vieram as tristes rotinas e os mais variados
percalços, as responsabilidades inadiáveis, os filhos… Não estávamos
preparados, mas insistimos. Enfrentámos, caímos e levantámo-nos. É isso a vida:
essa montanha rugosa, com a qual devemos lutar, evitando contudo chegar ao topo
com um empenho exagerado. Quanto mais alta a subida, mais estrondosa a queda!
E agora, amor, os filhos estão criados, já vieram os
netos e… é tão doce e tranquilo o nosso amor. O mesmo decerto, mas mais
verdadeiro, menos arrebatado e louco talvez, mas muito, muito mais amor… Claro
que ainda recordo, não tanto com saudade, mas com uma certa melancolia, esses
anos loucos, esse Verão escaldante, e
logo abraço com prazer este Outono
sereno. Os nossos olhos já falam mais do que as palavras. Basta olhar e já
sabemos o que outro pensa ou quer. Isto é maturidade. Isto vale a pena. Valerá?
Dizem que todo o amor nasce da paixão. E agora, que boas
as escapadinhas que podemos fazer de quando em vez, por esse Alentejo fora, que
adoramos, por aqui e por ali.
Curioso. Este mês em que estás longe, as saudades
acordaram a velha paixão. Não durmo, faço as refeições a sós com lágrimas nos
olhos, e procuro o teu amor no aconchego dos lençóis. Será que este novo amor
sereno se transformou em paixão? Afinal a paixão é boa. O tempo não recua, mas
nós podemos recuar.
Que aborrecimento afinal a maturidade e a tranquilidade!
Nada como a descoberta, a aventura, a loucura… Definitivamente renasci. E tu?
Pensas em mim? Tens dificuldade em adormecer? Que descoloridos têm sido estes
dias…
Já sei. Vou enlouquecer e voltar a ser a mulher
apaixonada do passado. Espera por mim. Vou apanhar o avião amanhã e esperar-te
na praia. Afinal, na Natureza tudo renasce. Vamos ser o fruto suculento e não o
botão em flor naquela árvore perdida no vale do amor. Reverter a história. O
amor transformou-se em paixão?
Que fiquem os dois. Concordas?
Até sempre, ou melhor, até amanhã.
Margarida Haderer |
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