“Tivemos muito medo mesmo. Vimos muitas pessoas que se afogaram e muitas casas a serem levadas pelas inundações. As nossas colheitas foram todas destruídas. Conseguimos salvar um pequeno cacho de bananas e temos vindo a geri-lo para que dure o maior tempo possível. Vimos aqui à escola para conseguirmos uma porção de arroz ou feijão para toda a família.”
Foi assim que Juan Carlos, 45 anos, testemunhou o que lhe estava a acontecer, e à sua família, após os dias 14 e 15 de Março, quando a região da Beira (Moçambique) foi atingida pelo ciclone Idai que, de forma severa, destruiu a região central do país. Um mês depois, o Instituto Nacional de Calamidades de Moçambique registava 603 mortes em consequência do Idai, mas calcula-se que o número de vítimas mortais tenha excedido as mil. Mais a norte, poucos dias depois, o país foi também atingido pelo ciclone Kenneth, que terá provocado pelo menos 41 mortos.
Após o trauma inicial, a comunicação mediática do acontecimento foi esmorecendo. Mas a Cáritas Internacional pretende que o acontecimento permaneça na consciência da comunidade internacional, ajudando os que sofreram e auxiliando o Governo moçambicano na reconstrução do que se perdeu.
Será essa fase de reconstrução que começa em breve, fazendo para já que a tragédia se torne de novo relevante – um dos fatores que pode recolocar Moçambique no mapa mediático internacional pode ser a visita do Papa à capital do país, Maputo, entre 4 e 6 de setembro, naquela que será a primeira etapa de uma viagem que o levará também a Madagáscar e Ilhas Maurícias.
“Durante esta fase de reconstrução, é importante que as pessoas se lembram de Moçambique”, diz Isabel Quintão, gestora de projetos na Unidade Internacional da Cáritas Portuguesa e coordenadora da campanha “Cáritas Ajuda Moçambique”. O principal investimento será centrado na construção de escolas, mas o conjunto traduziráum “grande investimento”. Da verba necessária, que o Governo moçambicano calcula em 2,8 mil milhões de euros, a Cáritas Moçambicana fixou o seu programa para a fase de reconstrução em 2.317.112 euros, valor esse que ainda não foi angariado na totalidade (e dos quais 450 mil euros foram disponibilizados pela Cáritas Portuguesa). Aquela verba permitirá apoiar cinco mil famílias, nas áreas da habitação, agricultura e meios de subsistência, e água e saneamento.
Um ano para reconstruir
O plano “Cáritas ajuda Moçambique” começou em Julho de 2019 e vai ter uma duração de doze meses, terminando em Junho de 2020, explica Isabel Quintão. “As áreas que este projeto pretende contemplar inserem-se nos meios de subsistência e dinamização da economia familiar, como habitação, agricultura, água e saneamento”. No caso da água e saneamento e dos bens de subsistência, procura-se, ao mesmo tempo, dar formação às populações, ensinando-as e instruindo-as com campanhas de sensibilização para o uso da água e noções de higiene.
“A rede internacional Cáritas, onde se inclui a Cáritas Portuguesa, está a acompanhar e a apoiar a Cáritas Moçambicana, em articulação com as entidades que são responsáveis pela coordenação da resposta de emergência criada pelo Governo Moçambicano e pelas Nações Unidas” de acordo com um comunicado da Cáritas. Desta forma, a Cáritas de Moçambique serve como equipa de coordenação de entidades como as equipas diocesanas e pessoas no terreno, que chegam às cinco dezenas.
“No âmbito das contribuições mais comuns, valorizamos mais as financeiras” afirma Isabel Quintão. “A razão porque a Cáritas fez esta escolha foi para valorizar a economia de Moçambique e dar às povoações a opção sobre o que querem.” As regiões intervencionadas após o furacão foram Quelimane, Chimoio e Beira, onde foram ajudadas 11.659 pessoas – número que chegou às 27.500 pessoas até final de junho. Na nova fase agora iniciada, serão concretizados projetos nas províncias de Sofala, Manica, Zambézia e Cabo Delgado.
Além da ajuda financeira, a Cáritas dos Estados Unidos da América (CRS) distribuiu oito mil lonas adicionais, que serviram as populações de Chibavava e Nhamatanda, no território da diocese da Beira e outras à volta. A ajuda dada aos agricultores incluiu uma fase de emergência, com entrega de equipamentos agrícolas e sementes, e ações de formação e irrigação, destaca a responsável da Cáritas Portuguesa. “O objetivo foi tentar que as famílias tenham, de uma forma gradual, os bens de subsistência”.
Sementes e escola, instrumentos de futuro
Depois da passagem dos ciclones, Alexandre Uate foi um dos muitos pequenos agricultores moçambicanos apoiados: “Como não tínhamos nada, tudo o que recebemos foi muito relevante. Recebemos os kits de ferramentas para trabalhar e os kits de cozinha. Cada um deles foi realmente importante, mas o que nos falta agora é a casa. Mas agora que tenho as ferramentas para a agricultura e as sementes, posso começar a construir a minha vida e pensar no futuro dos meus filhos e da minha família”, diz, num testemunho recolhido pela Cáritas Internacional.
Também a educação dos filhos é um objetivo de Uate: “O futuro em que estou pensando inclui escolarização para meus filhos e uma casa para a minha família. Adoraria ver meus filhos poderem ficar na escola. Continuarei a trabalhar com as ferramentas que me foram dadas para poder alimentar a minha família e garantir que o seu futuro seja brilhante. Fico feliz quando posso trabalhar e fazer as minhas atividades normais e posso cuidar da minha família. O milho que veem crescer no campo foi plantado em abril com sementes que recebi das distribuições da Cáritas.”
“A ajuda da Cáritas ao povo moçambicano nunca se poderia esgotar na fase de emergência e esta segunda etapa é também muito importante”, afirma Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas Portuguesa, para explicar a importância desta nova etapa da ajuda. “Agora é o momento de dar às pessoas que foram vítimas desta catástrofe um sinal claro de esperança. Depois da resposta imediata, esta é a resposta que lhe vai dar uma nova oportunidade de futuro, de poderem planear as suas vidas.”
O apoio à população de Moçambique pode ser feito através do Fundo de Emergências Internacionais da Cáritas Portuguesa (IBAN PT 50 0033 0000 01090040150 12). Em alternativa, podem ser usadas as caixas da rede Multibanco (entidade 22 222 e referência 222 222 222). Para mais informações, pode consultar-se a página oficial da Cáritas Portuguesa.
Sem comentários:
Enviar um comentário