Entrevista exclusiva com o Camerlengo da Santa Romana Igreja
Roma, 18 de Julho de 2014 (Zenit.org) Antonio Gaspari
Em 19 de Julho, o cardeal Tarcisio Bertone, secretário de 
Estado durante o pontificado de Bento XVI, vai visitar o Centro "Papa 
Luciani" de Santa Giustina, na província de Belluno.
Na ocasião, juntamente com o organizador professor Vincenzo 
Buonomo, dará uma conferência de apresentação do seu livro "A diplomacia
 pontifícia em um mundo globalizado" (publicado na LEV - Libreria 
Editrice Vaticana).
O cardeal Bertone, Camerlengo da Santa Igreja Romana, se reunirá com 
Mons. Giuseppe Andrich, Bispo de Belluno/Feltre e presidirá a Solene 
Missa Pontifical na Catedral de San Martino.
ZENIT entrevistou-o para saber um pouco mais das suas actividades e 
também das críticas que apareceram em parte da imprensa nos últimos 
tempos, sobre o seu trabalho e sua pessoa.
***
ZENIT: Eminência, o senhor publicou um livro intitulado "A diplomacia papal em um mundo globalizado", publicado pela Libreria Editrice Vaticana, com o prefácio do Papa Francisco. O que caracteriza a ação diplomática da Santa Sé? 
Card. Tarcisio Bertone: Especialmente na história moderna a Santa Sé 
tem realizado um papel intensivo e contínuo para evitar guerras, 
promover a paz, alimentar o desenvolvimento, promover o respeito pelos 
direitos humanos e a fraternidade entre os povos. Se pensamos nos dois 
últimos conflitos mundiais, a Santa Sé procurou de todas as maneiras 
impedi-los, e, uma vez começados, realizou um trabalho grande para 
ajudar as vítimas e curar as feridas da guerra. No ano passado ficou 
mais que evidente o intenso trabalho da Santa Sé e do Papa Francisco 
para tentar trazer a paz na Síria e na Terra Santa.
O que caracteriza a diplomacia papal pode ser visto até mesmo dando 
uma olhada no índice do meu livro. Recordando alguns momentos da minha 
experiência pessoal e algumas viagens que eu fiz, posso destacar a 
importância das questões que eu tive a oportunidade de apresentar nos 
vários fóruns internacionais. Por exemplo, a protecção dos direitos 
humanos, a dignidade humana como fundamento dos direitos, a necessidade 
de uma garantia internacional da liberdade religiosa, hoje ameaçada em 
tantos lugares, o desenvolvimento dos povos, que se baseia na 
solidariedade compartilhada.
Lembro-me, em particular, das reuniões que tive com o presidente da 
Argentina e o Presidente do Chile, no 25º aniversário da paz do Baegle,
 ou mesmo a participação na Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da 
Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) realizada na 
Astana, no Cazaquistão.
ZENIT: Estamos nos preparando para celebrar o 200º 
aniversário do nascimento de Dom Bosco. O senhor é filho espiritual 
deste grande santo. Como o fato de ser salesiano tem influenciado no 
desempenho da sua missão na Igreja?  
Card. Tarcisio Bertone: Desde a juventude fui marcado pelo carisma 
vocacional de Dom Bosco: o diálogo e o encontro, a alegria e a 
esperança, a educação, a humildade e a caridade. E o seu lema "Façamos o
 bem a todos, o mal a ninguém!" sempre me inspiraram. Estas foram as 
lições que fortaleceram a minha fé, iluminaram toda a minha vida 
sacerdotal e episcopal e apoiaram o meu compromisso nesses sete anos 
como secretário de Estado.
É bem conhecido que um dos dons que a Igreja oferece a nível 
universal é a acção educativa e a promoção humana em todos os sentidos, 
bem como a proclamação do Evangelho. E este é o ponto focal do carisma 
de Dom Bosco. Conhecendo a minha origem Salesiana, alguns chefes de 
Estado, espontaneamente, se referiam à acção educativa da Igreja nos seus
 países, até mesmo lembrando os estudos realizados em institutos 
religiosos e a formação recebida, que os tinham preparado para assumir 
também cargos de responsabilidade nos vários governos ou na sociedade. 
Era natural falar sobre questões da juventude, da educação, dos projectos
 e também receber pedidos de ajuda na área da educação por parte dos 
responsáveis dos diferentes países, não somente aqueles de religião 
cristão, mas também muçulmana, budista ou outra crença.
ZENIT: Mas, Eminência, alguns criticaram o modo como o senhor
 governou a Cúria e o Vaticano. O que você responde a essas acusações? 
Card. Tarcisio Bertone: Eu li nos jornais a crítica que me fizeram e 
tive a impressão de que, às vezes, mais que desejar conhecer a verdade, 
preferem o estilo da zombaria ou do “copy-paste" de pedaços publicados 
sem muito discernimento. Um exemplo é a construção da notícia do meu 
apartamento com a falsa área de 700 metros quadrados, que continua a ser
 repetida, apesar da negação, para descrever a minha pessoa de modo 
distorcida, bem distante da realidade.
Me utilizo aqui das palavras do Papa Francisco no prefácio do meu 
livro: “A medida da vida dos Servos da Igreja não é ditada por aquela 
“impressão de uma notícia em letras grandes, para que as pessoas pensem 
que seja uma verdade inquestionável" (J.L. Borges), ao contrário, é 
tecida, dentro dos limites inerentes à condição e possibilidade de cada 
um, pela dedicação silenciosa e abnegada ao verdadeiro bem do Corpo de 
Cristo e ao serviço duradouro pela causa do homem”.
Sobre o governo, deve-se notar, em primeiro lugar, que o Secretário 
de Estado institucionalmente não governa de forma autoritária e 
independente, mas cumpre as directrizes e disposições específicas da 
Autoridade Suprema da Igreja e, portanto, colabora de perto com o Sumo 
Pontífice em sua missão. Em tudo isto é apoiado por colaboradores 
capazes e pelos departamentos das suas Secções da Secretaria de Estado, 
competentes nas várias matérias, estabelecidos pelos diversos documentos
 pontifícios, como, por exemplo, a Constituição Pastor Bonus especifica 
que a Secretaria de Estado deve respeitar as diferentes competências e 
responsabilidades dos Discastérios, como as Congregações, os Tribunais, 
os Conselhos, a Administração, a Prefeitura dos Assuntos Económicos da 
Santa Sé, etc. A tarefa da Secretaria de Estado é a de favorecer as 
relações com os diferentes dicastérios sem prejuízo da sua autonomia e 
de coordenar o seu trabalho.
ZENIT: Uma dessas críticas, ultimamente, envolveu um 
investimento em Lux Vide, penhorado pelo senhor. Este investimento 
também aparece no relatório apresentado pelo IOR no dia 9 de Julho. O 
senhor poderia comentar? 
Card. Tarcisio Bertone: Foi um longo processo de estudo e de 
discernimento que começou em 2009 e que chegou ao fim em Dezembro de 
2013, quando, durante a reunião conjunta da Comissão cardinalícia de 
Supervisão com a assistência do Prelado e o Conselho de Superintendência
 (portanto, diante dos órgãos de gestão do IOR) com parecer favorável, 
apresentei a proposta de colaborar com a Lux Vide para as suas produções
 de ficção e de verdadeiros filmes com inspiração bíblica e cristã, com 
fundo educacional e de acordo com os projectos eclesiais de 
evangelização. A aprovação desta proposta, obtida com unanimidade, foi registada na acta. O problema de estudar os detalhes técnicos desta 
operação financeira não dependia de mim, mas dos órgãos de direcção do 
IOR, que teriam mantido as finalidades do Instituto expressas de várias 
maneiras em favor da Igreja universal. A Lux Vide é uma sociedade 
relevante no cenário das comunicações na indústria do cinema e da 
televisão com as características que eu disse. Lembro-me de que o mesmo 
fundador do IOR, Pio XII, tinha financiado o instituto Luce com a 
produção do filme "Pastor Angelicus".
ZENIT: Agora que é Secretário de Estado emérito, como são as 
suas relações com o papa Francisco e com o Papa Bento XVI? Vocês se 
encontram de vez em quando? 
Card. Tarcisio Bertone: As relações são boas e cordiais. A última vez
 que tive um encontro pessoal com o Papa Francisco, no final de maio, 
comentamos exactamente este fato do filme "Pastor Angelicus", e ele 
lembrou de tê-lo visto quando criança em Buenos Aires.
Com o Papa Bento XVI continua uma relação afectuosa e amigável. Ele 
teve a gentileza de me convidar para o almoço no dia do aniversário do 
meu sacerdócio, 1 de Julho. Lembramos os "bons velhos tempos" passados 
juntos no trabalho e na partilha das preocupações, tanto na Congregação 
para a Doutrina da Fé, quanto durante o meu mandato como secretário de 
Estado.
ZENIT: Uma última pergunta: como é que você passa o seu tempo? 
Card. Tarcisio Bertone: Estou convencido de que um bispo não 
"abandona” jamais o seu dever pastoral e, enquanto Deus me dá forças, o 
meu compromisso com a Igreja permanece inalterado, mesmo após a 
conclusão do serviço da Secretaria de Estado. Por agora, participo na 
vida e no trabalho de alguns Dicastérios vaticanos na qualidade de 
Membro, aceito de bom grado ir às paróquias ou comunidades, para as 
celebrações eucarísticas ou eventos com conferências, etc. (Por exemplo,
 me preparo para ir à Belluno, no Centro Papa Luciani para a 
apresentação do meu livro sobre a diplomacia do Vaticano, que depois 
farei em Pordenone no mês de Setembro), recebo pessoas e grupos que 
precisam de ajuda e conselhos, recebo correspondência de várias partes e
 tento responder todas. Estou trabalhando em uma série de publicações. 
Além disso, me dedico a uma vida de oração, em comunhão com as pessoas 
que o Senhor me coloca ao lado. (Trad.T.S.)
  (18 de Julho de 2014) © Innovative Media Inc. 
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