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domingo, 26 de abril de 2020

Escola de Chicago

Não sou muito ligado em datas e mal lembro a do meu aniversário. Conto com a generosa ajuda de minha esposa para evitar gafes neste terreno. Assim, não sei exatamente quando plantamos esta ou aquela árvore, mas o certo é que quando florescem o termômetro de minha alegria estoura o bulbo. Dos tanto flamboyants plantados, dois nos presentearam neste verão com vermelhas flores, dignas de Madagascar. Quem disse que o tempo passa em vão e que envelhecer não tem lá seus prazeres?

As sementes de nossos flamboyants foram catadas em lugares distintos e distantes: no Campus da Universidade de São Paulo, no Hospital Alemão, em dois ou três bairros paulistanos, em Montenegro e em São Lourenço. Planejara olhar para um recanto e sentir no peito uma alegria particular pela procedência, como se houvesse transplantado belezas. Uma trapalhada na estufa, entretanto, fez com que perdêssemos a identificação das mudas. Assim, não sabemos a origem, nem registramos a data de cada plantio, mas a cada ano ficava na expectativa: será que desta vez veremos o espetáculo da florescência de pelo menos um dos flamboyants?

É um truísmo, mas de fato as experiências nos tornam menos tolos e assim fui aprendendo que a natureza tem seu ritmo, tem seu tempo. Fui observando que árvores coetâneas não se desenvolvem da mesma forma e esta realidade faz parte da beleza, como nenhum de nossos filhos é igual ao outro, nem mesmo se forem gêmeos univitelinos. O mais importante foi notar que o florescimento e a geração de sementes exigem maturidade. Que só o tempo propicia.

Quando lembro das bobagens que já disse, sobretudo antes dos trinta, só me perdoo porque não fazê-lo seria uma atitude de grande vaidade. Quanta presunção, quanta arrogância, quanta pobreza ... Me redimem um pouco as palavras de Eça de Queiroz, na obra “Uma campanha alegre”: “A mocidade tem d'estas esplendidas confianças; só por amar a verdade imagina que a possue; e, magnificamente certa de sua infalibilidade, anceia por investir contra tudo o que diverge do seu ideal, e que ella portanto considera Erro, irremissível Erro, fadado á exterminação. Assim foi que, chegando da Universidade com o meu Proudhon mal lido debaixo do braço, me apressei a gritar na cidade em que entrava – Morte á tolice!

Pois agora vivemos a expectativa de um novo governo, de inauguração de um novo tempo, capaz de desencorajar mediocridades e sepultar grandes erros. Sinto que estamos uma vez mais  na arquibancada, na expectativa de que os novos contratados deem conta do recado e o país avance. Como no futebol, após a incorporação de jogadores dos quais esperamos gols ou grandes jogadas. Não raro nos decepcionamos com os figurões, contratados a peso de ouro e que na hora do vamos ver se mostram peças de pouca eficiência, quando não notórias fraudes.

Só o tempo dirá, mas tenho apreensão quanto ao embate entre semear e colher. Infelizmente o protagonismo entre ministros tem sido do titular da economia. Desta feita será comandada por um liberal, antecedido pela credencial da Escola de Chicago. Quiseram as coincidências que encontrasse num sebo a obra “Memórias de um economista de Chicago”, de George Stigler, Prêmio Nobel de Ciências Econômicas em 1982. Stigler discorre sobre a instituição e preconiza que os economistas não são nem bons, nem maus. São apenas analistas da realidade. Sei não, parece outro truísmo, filho do esquecimento de que a realidade é também construída por eles.

Não creio na adoção de mudanças radicais. Um país como o Brasil não é um caiaque que se manobra com remos. Mudar a direção de um navio exige manobra adequada. Sair privatizando tudo, desonerando o Estado de forma atabalhoada e abrindo as portas para um vale-tudo liberal é manobra de alto risco.  Ademais, sempre elegemos idéias de fora para ditar a solução: Keynes para defender um Estado forte, Friedman para confiar na força dos mercados, Mises para absolutizar esta confiança ... Estas receitas não consideram os condimentos de que dispomos.

Parece que a toada da hora será no ritmo do “Laissez-faire, laissez-passer”. Sem menosprezo de experiências no mundo, sem menoscabo de estudos acadêmicos de universidades famosas, cá no meu canto acho que carecemos de reflexões autóctones e receio que encenaremos uma peça sem garantia de bilheteria. Porque temos o palco, temos os atores, mas nos falta o texto.

J. B. Teixeira



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