Não sou muito
ligado em datas e mal lembro a do meu aniversário. Conto com a generosa ajuda
de minha esposa para evitar gafes neste terreno. Assim, não sei exatamente
quando plantamos esta ou aquela árvore, mas o certo é que quando florescem o
termômetro de minha alegria estoura o bulbo. Dos tanto flamboyants plantados,
dois nos presentearam neste verão com vermelhas flores, dignas de Madagascar.
Quem disse que o tempo passa em vão e que envelhecer não tem lá seus prazeres?
As sementes de
nossos flamboyants foram catadas em lugares distintos e distantes: no Campus da
Universidade de São Paulo, no Hospital Alemão, em dois ou três bairros
paulistanos, em Montenegro e em São Lourenço. Planejara olhar para um recanto e
sentir no peito uma alegria particular pela procedência, como se houvesse
transplantado belezas. Uma trapalhada na estufa, entretanto, fez com que
perdêssemos a identificação das mudas. Assim, não sabemos a origem, nem
registramos a data de cada plantio, mas a cada ano ficava na expectativa: será que
desta vez veremos o espetáculo da florescência de pelo menos um dos flamboyants?
É um truísmo, mas
de fato as experiências nos tornam menos tolos e assim fui aprendendo que a
natureza tem seu ritmo, tem seu tempo. Fui observando que árvores coetâneas não
se desenvolvem da mesma forma e esta realidade faz parte da beleza, como nenhum
de nossos filhos é igual ao outro, nem mesmo se forem gêmeos univitelinos. O
mais importante foi notar que o florescimento e a geração de sementes exigem
maturidade. Que só o tempo propicia.
Quando lembro das
bobagens que já disse, sobretudo antes dos trinta, só me perdoo porque não
fazê-lo seria uma atitude de grande vaidade. Quanta presunção, quanta
arrogância, quanta pobreza ... Me redimem um pouco as palavras de Eça de
Queiroz, na obra “Uma campanha alegre”:
“A mocidade tem d'estas esplendidas
confianças; só por amar a verdade imagina que a possue; e, magnificamente certa
de sua infalibilidade, anceia por investir contra tudo o que diverge do seu
ideal, e que ella portanto considera Erro, irremissível Erro, fadado á
exterminação. Assim foi que, chegando da Universidade com o meu Proudhon mal
lido debaixo do braço, me apressei a gritar na cidade em que entrava – Morte á
tolice!”
Pois agora vivemos
a expectativa de um novo governo, de inauguração de um novo tempo, capaz de
desencorajar mediocridades e sepultar grandes erros. Sinto que estamos uma vez
mais na arquibancada, na expectativa de
que os novos contratados deem conta do recado e o país avance. Como no futebol,
após a incorporação de jogadores dos quais esperamos gols ou grandes jogadas.
Não raro nos decepcionamos com os figurões, contratados a peso de ouro e que na
hora do vamos ver se mostram peças de pouca eficiência, quando não notórias
fraudes.
Só o tempo dirá,
mas tenho apreensão quanto ao embate entre semear e colher. Infelizmente o
protagonismo entre ministros tem sido do titular da economia. Desta feita será
comandada por um liberal, antecedido pela credencial da Escola de Chicago.
Quiseram as coincidências que encontrasse num sebo a obra “Memórias de um economista de Chicago”, de George Stigler, Prêmio
Nobel de Ciências Econômicas em 1982. Stigler discorre sobre a instituição e preconiza
que os economistas não são nem bons, nem maus. São apenas analistas da
realidade. Sei não, parece outro truísmo, filho do esquecimento de que a
realidade é também construída por eles.
Não creio na
adoção de mudanças radicais. Um país como o Brasil não é um caiaque que se
manobra com remos. Mudar a direção de um navio exige manobra adequada. Sair
privatizando tudo, desonerando o Estado de forma atabalhoada e abrindo as
portas para um vale-tudo liberal é manobra de alto risco. Ademais, sempre elegemos idéias de fora para
ditar a solução: Keynes para defender um Estado forte, Friedman para confiar na
força dos mercados, Mises para absolutizar esta confiança ... Estas receitas não
consideram os condimentos de que dispomos.
Parece que a
toada da hora será no ritmo do “Laissez-faire,
laissez-passer”. Sem menosprezo de experiências no mundo, sem menoscabo de
estudos acadêmicos de universidades famosas, cá no meu canto acho que carecemos
de reflexões autóctones e receio que encenaremos uma peça sem garantia de
bilheteria. Porque temos o palco, temos os atores, mas nos falta o texto.
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