Superior Carmelita no Egipto reflecte para ZENIT sobre a vida
consagrada e o encontro com o Papa Francisco no dia 2 de Fevereiro de
2016
O Ano da Vida Consagrada encerrou-se com solenidade no dia dois de Fevereiro. O Papa se encontrou, segundo as informações, com mais de
5000 consagrados, vindos de todos os lados do mundo, para rezar, para
meditar, para escutar a palavra do pai e pastor da Igreja, o Papa
Francisco. Ele é jesuíta, e como consagrado, durante estes anos do seu
pontificado, falou mais do que os outros Papas em muitos anos de
pontificado. Conhece bem a vida religiosa, a sua beleza, as suas
necessidades para a vida da Igreja, e conhece também muito bem os
“defeitos ,os pecados, os lados fracos e débeis” da vida consagrada.
Está consciente que, sem a vida consagrada, especialmente a feminina, a
acção da Igreja nos lugares de extremas fronteiras, e nos ambientes das
periferias existenciais, dos sofrimentos humanos, seria deficiente.
O Papa vê na vida religiosa uma força evangelizadora única. Há
muitos religiosos e religiosas, como tem dito o Papa, que vivem com
fidelidade a própria consagração a Deus e ao serviço dos irmãos. O Papa
Francisco, deixando de lado o texto preparado, falou espontaneamente e
se movimentou com tranquilidade única nos campos “próprios da vida
consagrada”, que só um religioso pode fazer. Sabemos que a sua maneira
de abordar os assuntos mais espinhentos “são reais e humorísticos”,
entre um sorriso e outro, diz verdades que tocam profundamente as
feridas abertas da vida consagrada. A escassez de vocações que não se
resolve, como diz o Papa, “com inseminação artificial”, convidando e
aceitando todos os que se apresentam e dizem que querem ser religiosos.
É necessário examinar bem, com amor, com profundidade, com todos os
meios espirituais e psicológicos para verificar se se trata de uma
autêntica “vocação” de seguir a Cristo com todas as consequências que
este seguimento comporta. Diz-nos que ver mosteiros grandes, vazios,
ou levados para frente por quatro ou cinco velhinhas, “quase lhe faz
perder a esperança no futuro”. Mas retoma a esperança com coragem
porque ela se fundamenta não nas coisas materiais, mas sim em Deus, em
Cristo Jesus. O Papa falou com abertura, com a “coragem profética” de
três realidades absolutamente necessárias para redoar à vida consagrada
o brilho, a beleza, a alegria: a profecia, a proximidade, a esperança.
A profecia: o Papa falou da “profecia da “obediência”, uma
obediência que é oferenda total de nossa vida, de fazer o que devemos
fazer. Ele nos ensinou que podemos rezar: “ó Pai, afasta de mim este
cálice”, mas depois dizer, “seja feita a tua vontade e não a minha”.
Podemos espernear, conversar, manifestar todas as nossas objecções e ao
final dizer: “vou fazer!” Engolir e fazer. Uma obediência que custe, é
a profecia da obediência. Sobre a proximidade nos recordou que o
primeiro próximo é a nossa comunidade, os que vivem connosco. Devemos
amá-los e deu o exemplo de Santa Teresinha. É a magistral página na
História de uma Alma, do serviço alegre com o sorriso à Irmã São Pedro.
Recordo-me de um acto de caridade que Deus me inspirou fazer
quando ainda era noviça. Era pouca coisa, mas nosso Pai, que vê o que é
secreto, que olha mais para a intenção do que para o vulto da acção, já me recompensou
sem esperar a outra vida. Era no tempo em que irmã São Pedro ainda ia
ao coro e ao refeitório. Para a oração vespertina, estava acomodada à
minha frente: às 15h50, uma irmã devia levá-la ao refeitório, pois as
enfermeiras tinham então muitas doentes e não podiam levá-la. Custava-me
muito oferecer-me para prestar esse pequeno serviço, pois sabia não ser
fácil contentar essa pobre irmã São Pedro, que sofria tanto que não
gostava de mudar de condutora. Mas eu não queria perder tão boa ocasião
de praticar a caridade, lembrando-me de que Jesus disse: “Tudo o que
fizerdes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fareis”.
Ofereci-me, portanto, muito humildemente, para levá-la. Não foi sem
dificuldade que consegui fazê-la aceitar meu serviço! Enfim, pus mãos à
obra e tinha tão boa vontade que consegui perfeitamente.
Toda tarde, quando via irmã São Pedro sacudir sua ampulheta,
sabia o que aquilo significava: partamos. É incrível como me era custoso
dispor-me a levá-la, sobretudo no início. Assim mesmo, fazia-o
imediatamente e começava todo um cerimonial. Era preciso mover e levar o
banco de um jeito preestabelecido, sobretudo, não se apressar; depois,
empreendia-se o passeio. Tratava-se de seguir a pobre enferma
segurando-a pela cintura, o que eu fazia com a maior delicadeza
possível; mas se, por infelicidade, ela dava um passo em falso
parecia-lhe logo que não a segurava direito e que ela ia cair. “Ah!, meu
Deus! andais depressa demais, vou me arrebentar.” Se eu procurava andar
mais devagar: “Mas me acompanhai, não sinto mais a vossa mão, ides
largar-me, vou cair, ah! bem sabia que sois jovem demais para me levar”.
No final, chegávamos sem incidente ao refeitório. Aí surgiam novas
dificuldades, pois era preciso fazê-la sentar e agir com jeito [29v]
para não machucá-la. Depois, era preciso arregaçar suas mangas (ainda de
uma maneira predeterminada). Depois, ficava livre para ir. Com mãos
estropiadas, ela ajeitava, como podia, o pão em seu godê. Logo percebi
e, toda noite, só a deixava após ter–lhe prestado mais esse servicinho.
Como não me tinha pedido para fazê-lo, ficou muito comovida e foi por
esse gesto, que eu não tinha planeado, que conquistei seu afecto e
sobretudo (soube mais tarde) porque, depois de ter cortado o pão,
despedia-me dela com meu mais lindo sorriso.(Manuscrito A, 29f)
A esperança que é saber rezar pelas vocações com coragem. Falta
oração! Quais vocações pedimos a Deus e como as pedimos… O resto cada um
pode ler. As palavras do Papa me colocaram em crise. Mas não sei se vou
mudar, se tenho capacidade, coragem… O que vai mudar depois do encontro
com o Papa? Tudo, se nós queremos; nada, se nós não queremos.
Rezem para mim, que eu queira mudar e eu, desde o Egipto, rezarei para
vocês mudarem. Aí sim, se nós mudarmos, tudo será diferente depois
deste Ano da Vida Consagrada. É preciso deixar-se mudar por Jesus. Como
carmelita fiquei orgulhoso em ver o Papa citar a minha “secretária,
amiga e mestra” Santa Teresinha. Ela mudou. Que ela me ajude e nos
ajude a mudar!
in
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