Tradição e renovação
No dia 25 de Novembro do corrente ano a Unesco declarou o Cante Alentejano património imaterial da humanidade. Parabéns aos alentejanos por terem sabido conservar viva a sua cultura musical, expressão profunda e bela do seu modo de comunicar e conviver em sociedade. A influência do poder comercial e mediático dos modernos cantores de outros países não conseguiu abafar a alma alentejana. Mas espero que a crise demográfica também não o consiga, relegando o cante para os ambientes museológicos e retirando-o das igrejas, das festas populares, da rua e das tabernas.
No dia 25 de Novembro do corrente ano a Unesco declarou o Cante Alentejano património imaterial da humanidade. Parabéns aos alentejanos por terem sabido conservar viva a sua cultura musical, expressão profunda e bela do seu modo de comunicar e conviver em sociedade. A influência do poder comercial e mediático dos modernos cantores de outros países não conseguiu abafar a alma alentejana. Mas espero que a crise demográfica também não o consiga, relegando o cante para os ambientes museológicos e retirando-o das igrejas, das festas populares, da rua e das tabernas.
A tradição cultural, o clima e a natureza fazem parte da identidade de um povo. No panorama nacional o Alentejo ainda é das poucas zonas onde a tradição se mantém. Mas sabemos que sem evolução e renovação não será possível ter futuro, no cante e em todas as expressões da vida de um povo. Por isso será necessário estudar esta expressão cultural, torná-la presente nas escolas elementares e superiores, para que não degenere.
Este reconhecimento trouxe honra aos alentejanos, mas também compromissos em ordem à preservação deste património. Quem se encarrega disso, contando com a colaboração de todos? Autarquias, escolas, igrejas, festivais, clubes? Aqui está uma área em que todos somos co-responsáveis e devemos colaborar. E não é favor nenhum, pois o cante encanta, junta, une e fraterniza as pessoas e os ambientes. Da nossa parte tudo faremos para que o cante na sua versão religiosa continue a ecoar nas nossas igrejas e procissões.
Mas muito mais coisas, modos de ser, valores e ideais precisamos de transmitir às novas gerações e adequá-las aos novos tempos. O Papa Francisco, nos discursos feitos recentemente no Conselho da Europa e no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, desafiava estas instituições importantes na construção de uma Europa de paz e de progresso a não ficarem apenas pela dimensão económica e financeira da comunidade europeia, mas a colocarem no centro das suas decisões a dignidade da pessoa humana nas suas relações multipolares e transversais. A verdade, a solidariedade, a subsidariedade, o bem comum, o nós integral das pessoas em sociedade são património da doutrina social da Igreja sobre o qual os fundadores da Europa quiseram construir uma Europa que resolve os seus conflitos e divergências pelo encontro das pessoas e dos povos através do diálogo e não pela violência das armas, pelo consenso e entreajuda.
Este rico património da Europa, criado ao longo de séculos, cultivado pelos filósofos, escritores, artistas, igreja, escolas e universidades, expresso de muitos modos, tem raízes profundas que é preciso conhecer e amar, para que daí surjam novos dinamismos de desenvolvimento global para toda a humanidade, sem marginalizar ninguém, pessoa, grupo ou povo, nem reduzindo as pessoas a números ou objectos descartáveis. A visão bíblica e cristã do mundo contem potencialidades benéficas para a construção duma nova civilização de paz e de amor, como se exprimia o bem-aventurado Papa Paulo VI.
Olhando para os obreiros de um mundo novo
No alvoroço de notícias, comentários e opiniões acerca do estado da nossa sociedade podemos ser levados a esquecer as pessoas concretas, que vivem ao nosso lado e os acontecimentos do dia a dia, que fazem parte do nosso quotidiano, que são os verdadeiros obreiros do mundo novo, mais justo, solidário e humano. Neste panorama os meios de comunicação dão realce a algumas personalidades e a determinados acontecimentos, como as palavras e gestos do Papa Francisco, alguns acontecimentos de violência causada por pessoas, grupos ou por fenómenos da natureza.
Da minha última semana quero hoje realçar algumas pessoas e instituições, que me lembraram quanto nós e a sociedade lhes devemos pelo seu testemunho fiel de vidas dedicadas ao serviço de Deus e dos outros. Em primeiro lugar, a celebração de 90 anos de vida de dois sacerdotes da nossa diocese, os padres José Carvalho e Olavo, e dos 60 anos de sacerdócio deste último e também dos 60 anos da fundação do Carmelo de Beja. Todos estes anos de vida e de consagração a Deus e à sociedade, através de muitas dificuldades e carências, mas sempre com a firmeza da fé, das convicções bem arraigadas e da sua dedicação generosa despertou em mim e em muitos outros grande gratidão e admiração. No meio da instabilidade dos tempos que correm, estas pessoas e instituições são um património precioso, que nos ajudou a chegar até aqui e que precisa de ser continuado, mas com novos dinamismos, para não retrocedermos no caminho da nossa humanização e da construção do povo de Deus.
No ano da vida consagrada queremos aprender a ser gratos por tantos dons que Deus nos concedeu nas pessoas e comunidades dos mais diversos institutos de vidas totalmente dedicadas a Deus e ao serviço dos mais débeis da nossa sociedade. Sem gratidão não seremos beneficiados com novos dons de vidas consagradas.
No fim do verão deixou-nos a comunidade das Irmãs do Bom Pastor, que estavam em Colos há vários anos. Na próxima semana vai deixar a nossa diocese a comunidade das Irmãs Doroteias, que estavam em Montes Velhos, S. João de Negrilhos e que durante muitos anos foram preciosa ajuda ao trabalho pastoral, social e educativo lançado Padre Olavo. Felizmente recebemos também este verão uma comunidade brasileira dos Servos de Maria do Coração de Jesus, que agora residem em Colos e na solenidade da Imaculada Conceição, dia 8 de Dezembro, ordenamos 3 diáconos para o serviço na diocese.
Sem cair numa avaliação pessimista a partir da quantidade de comunidades e pessoas consagradas, temos de reconhecer que as palavras evangélicas de Jesus mantêm a sua actualidade: A seara é grande e os operários são poucos, pedi ao Senhor da Messe que envie operários para a sua messe (Mt 9, 37-38). Este pedido faço a todos os diocesanos. Peçamos ao Senhor mensageiros para a messe alentejana, mas também não esqueçamos de ser gratos por todos aqueles que desgastaram as suas vidas ao serviço deste povo.
† António Vitalino, Bispo de Beja
Nota semanal em áudio:
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