Os cristãos são 10% da população síria, ainda que muitos estão fugindo. |
Ex-guia turístico relata o drama do povo, que, apesar da guerra, ainda lota as igrejas
Roma, 24 de Dezembro de 2014 (Zenit.org) Luca Marcolivio
Os cristãos na Síria se sentem abandonados e arriscam a vida
todos os dias. No entanto, as igrejas estão activas e cheias de fiéis
durante as missas, disse a ZENIT o cristão sírio Damaan Daoud, que
trabalhava como guia turístico para grupos italianos antes do início da
guerra. Daoud é um dos católicos sírios que tiveram a coragem de
permanecer em seu país.
Ele conversou connosco também sobre as tradições natalícias da Síria,
que viverá as festividades deste ano em meio à mistura de desespero e
esperança, um autêntico símbolo da paixão de Jesus na cruz.
ZENIT: Qual era a sua actividade na Síria?
Daoud: Eu comecei como guia turístico para grupos de italianos em
1994, mas, desde 2011, fiquei sem esse trabalho. Continuo trabalhando
como guia, só que agora não é para turistas, e sim para jornalistas, nos
campos de batalha do conflito. Eu estava em Maalula em setembro de
2013, quando a cidade foi tomada pelos fundamentalistas da Frente Nusra,
que é a Al-Qaeda na Síria. Actualmente também faço tradução de livros
dos salesianos.
ZENIT: Como os sírios vivem o Natal? Quais são as tradições particulares?
Daoud: O Natal é uma festa nacional em que todo o povo participa, mas
só os cristãos fazem o presépio. A maioria dos sírios monta a árvore de
Natal em casa. Há cristãos que também fazem o jejum natalício, que dura
quarenta dias e é uma antiga tradição cristã no Oriente Médio. É um
período com muitos concertos nas igrejas e nos teatros. As ruas são
decoradas, mas, nos últimos três anos, não vemos mais os enfeites porque
muitas famílias perderam seus entes queridos e o país está meio
destruído. Nesses três anos, 3 milhões de casas foram destruídas na
Síria. Na vigília de Natal, todos os cristãos vão à igreja para a missa e
depois ceiam. No dia de Natal, todas as famílias se reúnem com o
“chefe” da família e cada região da Síria tem o seu prato tradicional.
Por exemplo, o mais famoso em Damasco é o kibbebh (trigo moído fino com
carne de cabrito, pistache, cebola e iogurte cozido).
ZENIT: Como vai ser este Natal na Síria? As pessoas sentem medo?
Daoud: Os cristãos na Síria têm medo e vivem com muita preocupação.
Estão na mira do fanatismo e do radicalismo islâmico. Somos um alvo
fácil de atacar e tivemos muitos mártires cristãos nesta guerra absurda.
Quase a metade dos cristãos fugiu do país. A maior parte da comunidade
cristã, que está em Aleppo, corre perigo porque tanto o Estado Islâmico e
seus milicianos quanto a Frente Nusra os ameaçam continuamente. Os
cristãos fogem de Aleppo: eu estive lá, faz um mês, e vi muito
sofrimento e medo. O mesmo vale para os cristãos do nordeste de Síria,
na região de Al-Qamishli, onde o Estado Islâmico assassinou e sequestrou
muitos cristãos e se apropriou dos terrenos deles. É impossível ficar
na Síria se não houver garantia de paz e segurança. É impossível pedir
que os cristãos fiquem. No Ocidente, alguns nos criticam porque estamos
com o regime de Damasco, mas não entendem que a oposição ao regime é
mais sanguinária ainda. O milagre é que, apesar das enormes
dificuldades, os refugiados cristãos mantêm uma forte fé em Jesus, o
Emanuel. E as igrejas estão cheias de fiéis.
(24 de Dezembro de 2014) © Innovative Media Inc.
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