4.000 crianças sem pais pelo ébola; os salesianos actuam
Jorge Crisafulli, missionário salesiano em Serra Leoa, explica a necessidade de responder a uma nova realidade - órfãos estigmatizados nos seus clãs e famílias |
Actualizado 20 de Novembro de 2014
Cristina Sánchez Aguilar /Alfa y Omega
O missionário salesiano padre Jorge Crisafulli passou por Madrid para recordar aos espanhóis que há 4.000 crianças órfãos de ébola na Serra Leoa, Libéria e Guiné.
Uns morrem na rua, outros são arrojados nos aterros, e alguns mais continuam na porta do hospital esperando a que a sua mãe morta volte a recolhê-los. São os filhos do ébola que os salesianos se encarregam de recolher.
O caso da jovem Promise
Promise tem 16 anos. Há uns meses, a sua mãe começou a queixar-se de uma forte dor de cabeça. Tinha febre muito alta. Até vários dias depois, não decidiu ir a um hospital. Mas o centro estava demasiado longe. A mãe de Promise faleceu pelo caminho. Não tinha passado um mês, quando o seu pai começou a queixar-se de uma forte dor de cabeça. Tinha febre muito alta. Foi nesse momento quando a jovem liberiana soube que o que afligia a sua família não era a malária.
Tinha escutado falar do ébola pela rádio. Assim que, quando ajudou o seu pai a meter-se na cama, ou a mudar-se de roupa, ou depois de dar-lhe de comer..., lavava rapidamente as mãos.
Pediu aos seus três irmãos pequenos que jogassem fora de casa e que entrassem na cabana, de um só quarto, o menos possível. Mas era David contra Golias. E desta vez, o mais pequeno perdeu a batalha.
O pai de Promise faleceu e a sua irmãzinha recém-nascida também. Emmanuel, um dos irmãos, de 11 anos, caiu enfermo e foi transferido para um centro de isolamento.
Não foi suficiente com estas perdas. A adolescente, que ficou na casa com os seus outros dois irmãos, tem agora que lutar contra o estigma dos seus vizinhos, que isolaram os órfãos.
Nem sequer se aproximam os seus avôs, que lançam algo de comida desde fora da cabana, como se alimentassem as feras do zoológico. No mercado, negam-se a atendê-los. E as mulheres do povoado dão autênticos rodeios para não passar próximo da casa.
Os órfãos do ébola
Como eles, há cerca de 4.000 crianças na Libéria, Serra Leoa e Guiné Conacri. Podem-se encontrar vagueando pelas ruas. Alguns morrem de inanição. Outros, vêem-se nas portas dos hospitais, esperando a sua mãe, que entrou dias antes. Mas a sua mamã nunca sai.
Inclusive há crianças que são atiradas para os aterros, como se via na sexta-feira numa foto no Liberian Observer, na qual um recém-nascido aparecia morto entre mantas no meio do lixo.
Esta inumanidade é um dano colateral da crise do ébola, porque em muitos centros de saúde se negam a tratar mulheres grávidas por medo de entrar em contacto com o sangue. O que provoca que morram. Mães e filhos.
Cristina Sánchez Aguilar /Alfa y Omega
O missionário salesiano padre Jorge Crisafulli passou por Madrid para recordar aos espanhóis que há 4.000 crianças órfãos de ébola na Serra Leoa, Libéria e Guiné.
Uns morrem na rua, outros são arrojados nos aterros, e alguns mais continuam na porta do hospital esperando a que a sua mãe morta volte a recolhê-los. São os filhos do ébola que os salesianos se encarregam de recolher.
O caso da jovem Promise
Promise tem 16 anos. Há uns meses, a sua mãe começou a queixar-se de uma forte dor de cabeça. Tinha febre muito alta. Até vários dias depois, não decidiu ir a um hospital. Mas o centro estava demasiado longe. A mãe de Promise faleceu pelo caminho. Não tinha passado um mês, quando o seu pai começou a queixar-se de uma forte dor de cabeça. Tinha febre muito alta. Foi nesse momento quando a jovem liberiana soube que o que afligia a sua família não era a malária.
Tinha escutado falar do ébola pela rádio. Assim que, quando ajudou o seu pai a meter-se na cama, ou a mudar-se de roupa, ou depois de dar-lhe de comer..., lavava rapidamente as mãos.
Pediu aos seus três irmãos pequenos que jogassem fora de casa e que entrassem na cabana, de um só quarto, o menos possível. Mas era David contra Golias. E desta vez, o mais pequeno perdeu a batalha.
O pai de Promise faleceu e a sua irmãzinha recém-nascida também. Emmanuel, um dos irmãos, de 11 anos, caiu enfermo e foi transferido para um centro de isolamento.
Não foi suficiente com estas perdas. A adolescente, que ficou na casa com os seus outros dois irmãos, tem agora que lutar contra o estigma dos seus vizinhos, que isolaram os órfãos.
Nem sequer se aproximam os seus avôs, que lançam algo de comida desde fora da cabana, como se alimentassem as feras do zoológico. No mercado, negam-se a atendê-los. E as mulheres do povoado dão autênticos rodeios para não passar próximo da casa.
Os órfãos do ébola
Como eles, há cerca de 4.000 crianças na Libéria, Serra Leoa e Guiné Conacri. Podem-se encontrar vagueando pelas ruas. Alguns morrem de inanição. Outros, vêem-se nas portas dos hospitais, esperando a sua mãe, que entrou dias antes. Mas a sua mamã nunca sai.
Inclusive há crianças que são atiradas para os aterros, como se via na sexta-feira numa foto no Liberian Observer, na qual um recém-nascido aparecia morto entre mantas no meio do lixo.
Esta inumanidade é um dano colateral da crise do ébola, porque em muitos centros de saúde se negam a tratar mulheres grávidas por medo de entrar em contacto com o sangue. O que provoca que morram. Mães e filhos.
A resposta salesiana
É urgente por fim a esta epidemia, que passou, de ser una crise sanitária, a ser uma crise humanitária. Por isso, o padre Jorge Crisafulli, missionário salesiano argentino e responsável dos países de fala inglesa da África Ocidental, está de passagem por Espanha e Europa.
Para contar que os que permanecem na Serra Leoa ou Libéria não tem medo, mas sim muita necessidade de ajuda: «Estamos muito preocupados. Não há sinais de que a enfermidade se detenha, mas sim que continua aumentando. Só na Serra Leoa, há 80 novas infecções por dia», afirma o missionário, que assinala que «estes países não estão preparados para afrontar a situação. Já não há camas nos hospitais, assim as pessoas estão morrendo nas suas casas. As famílias, durante a noite, atiram os cadáveres -altamente infecciosos - para a rua. Algo muito perigoso, já que até dois ou três dias depois não passam os dispositivos do Governo a recolhê-los».
O Governo serra-leonês pediu à congregação, conhecida pelo seu trabalho com as crianças e jovens, que se encarregasse destes pequenos despejados.
«Como o Governo decretou o encerramento dos colégios, um dos nossos centros habilitámo-lo para resguardar estos pequenos. Temos posto camas, um refeitório, e a capela», assinala. Nestes momentos, cuidam de 68. E outros 50 estão numa casa próxima, isolados.
«Todas as crianças que se aproximam passam primeiro por 21 dias de quarentena. E aqueles que lidam com eles são pessoas que superaram o vírus», explica o padre Crisafulli.
Por certo, que são eles mesmos, as crianças, os que chamam à missão: «Muitos vem através do Ministério do Bem-estar Social, mas outros contactam connosco por uma linha telefónica que temos habilitada de propósito. Dizem-nos que estão sós e famintos».
Orar, aprender, jugar, deixar a tristeza
Essa tristeza que carregam, vai desaparecendo pouco a pouco, quando chegam ao centro salesiano. «Aqui rezamos juntos, jogamos, aprendemos Matemáticas e Ciências... E, sobretudo, chegam a um ambiente onde não se sentem julgados, mas sim queridos, acolhidos e amados. Isto é o único que transforma a vida destes rapazes», acrescenta Crisafulli.
O ébola, se Deus quiser, terá fim. Mas as crianças órfãs não desaparecem.
«Tentaremos reunificá-los com familiares, ou com famílias substitutas..., mas, se isto continua crescendo, vai ser um problema grande. O ébola está-nos ganhando a batalha», reconhece. Ainda assim, recalca, «não perdemos a esperança».
De facto, estão chegando à zona médicos desde Espanha, China, Cuba, Alemanha e Estados Unidos. E «a ajuda internacional vai chegando, ainda que no meu entender, um pouco tarde».
"Quando se apagarem as luzes, quando os medias deixem de falar da Serra Leoa, da Guiné, da Libéria, de África e ninguém pense já no ébola, as crianças ficarão connosco e teremos que cuidar delas".
"Nós vamos ficar até ao final. Não importam os riscos, nós vamos ficar com a nossa gente. Vamos viver com eles e vamos sair deste poço lutando todos juntos", assegurou o religioso.
(É possível apoiar as missões através de Obras Missionárias Pontifícias)
É urgente por fim a esta epidemia, que passou, de ser una crise sanitária, a ser uma crise humanitária. Por isso, o padre Jorge Crisafulli, missionário salesiano argentino e responsável dos países de fala inglesa da África Ocidental, está de passagem por Espanha e Europa.
Para contar que os que permanecem na Serra Leoa ou Libéria não tem medo, mas sim muita necessidade de ajuda: «Estamos muito preocupados. Não há sinais de que a enfermidade se detenha, mas sim que continua aumentando. Só na Serra Leoa, há 80 novas infecções por dia», afirma o missionário, que assinala que «estes países não estão preparados para afrontar a situação. Já não há camas nos hospitais, assim as pessoas estão morrendo nas suas casas. As famílias, durante a noite, atiram os cadáveres -altamente infecciosos - para a rua. Algo muito perigoso, já que até dois ou três dias depois não passam os dispositivos do Governo a recolhê-los».
O Governo serra-leonês pediu à congregação, conhecida pelo seu trabalho com as crianças e jovens, que se encarregasse destes pequenos despejados.
«Como o Governo decretou o encerramento dos colégios, um dos nossos centros habilitámo-lo para resguardar estos pequenos. Temos posto camas, um refeitório, e a capela», assinala. Nestes momentos, cuidam de 68. E outros 50 estão numa casa próxima, isolados.
«Todas as crianças que se aproximam passam primeiro por 21 dias de quarentena. E aqueles que lidam com eles são pessoas que superaram o vírus», explica o padre Crisafulli.
Por certo, que são eles mesmos, as crianças, os que chamam à missão: «Muitos vem através do Ministério do Bem-estar Social, mas outros contactam connosco por uma linha telefónica que temos habilitada de propósito. Dizem-nos que estão sós e famintos».
Orar, aprender, jugar, deixar a tristeza
Essa tristeza que carregam, vai desaparecendo pouco a pouco, quando chegam ao centro salesiano. «Aqui rezamos juntos, jogamos, aprendemos Matemáticas e Ciências... E, sobretudo, chegam a um ambiente onde não se sentem julgados, mas sim queridos, acolhidos e amados. Isto é o único que transforma a vida destes rapazes», acrescenta Crisafulli.
O ébola, se Deus quiser, terá fim. Mas as crianças órfãs não desaparecem.
«Tentaremos reunificá-los com familiares, ou com famílias substitutas..., mas, se isto continua crescendo, vai ser um problema grande. O ébola está-nos ganhando a batalha», reconhece. Ainda assim, recalca, «não perdemos a esperança».
De facto, estão chegando à zona médicos desde Espanha, China, Cuba, Alemanha e Estados Unidos. E «a ajuda internacional vai chegando, ainda que no meu entender, um pouco tarde».
"Quando se apagarem as luzes, quando os medias deixem de falar da Serra Leoa, da Guiné, da Libéria, de África e ninguém pense já no ébola, as crianças ficarão connosco e teremos que cuidar delas".
"Nós vamos ficar até ao final. Não importam os riscos, nós vamos ficar com a nossa gente. Vamos viver com eles e vamos sair deste poço lutando todos juntos", assegurou o religioso.
(É possível apoiar as missões através de Obras Missionárias Pontifícias)
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