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quinta-feira, 5 de junho de 2014

Tiram a Ayaan o Honoris Causa por denunciar o islamismo: o seu discurso denuncia os censores

Fatwa na Somália, expulsa da Holanda, humilhada nos EUA 

Ayaan Hirsi Ali, perseguida na Somália, humilhada no Ocidente.
Actualizado 1 de Maio de 2014

Anna Bono / La Nuova Bussola Quotidiana

“Vós mereceis recordações melhores que o 11 de Setembro e o atentado à maratona de Boston”, estas eram as palavras que Ayaan Hirsi Ali ia dirigir aos estudantes da Brandeis University de Boston ao receber o doutoramento honoris causa, dias antes da realização da edição de 2014 desta competição. Recordemos que em 2013 duas bombas explodiram próximo da meta da maratona, matando diferentes pessoas e ferindo mais de 100.

Ayaan Hirsi Ali é a mulher somali, muçulmana, que em 2004 ousou escrever o texto de uma curta-metragem intitulada Submission (Submissão), dirigido pelo director holandês Theo Van Gogh, na qual se relata a história de cinco mulheres islâmicas vítimas de abusos e maltratos seguindo o nome de Alá e no respeito da lei corânica. Foi uma ofensa intolerável para os integristas islâmicos. Dois meses depois da sua saída nas salas, Theo Van Gogh pagava a sua valentia com a vida: um imigrante marroquino preparou-lhe uma emboscada na rua, em pleno dia, em Amesterdão e matou-o com quatro disparos, degolou-o e espetou-lhe no corpo uma faca em cuja lâmina estava espetada uma carta de cinco páginas destinada a Ayaan que continha uma fatwa, uma sentença islâmica que a condenava à morte.

Acusada de "islamofobia"!
A edição 2014 da maratona de Boston realizou-se em 21 de Abril sem incidentes. Mas Ayaan Hirsi Ali não pronunciou o seu discurso na Brandeis University porque, por causa da pressão dos docentes e de estudantes indignados pela sua “islamofobia”, as autoridades académicas decidiram não conceder-lhe o título.

Um discurso que envergonha aqueles que o proibiram
«Nós, ocidentais (ia dizer aos estudantes a propósito das reivindicações das mulheres nos países islâmicos) devemos oferecer a dose justa de ajuda (...) devemos voltar às nossas raízes convertendo-nos de novo no farol do pensamento livre e da liberdade do século XXI. Perante uma injustiça temos que reagir, não só condenando-a, mas também com acções concretas.

Um dos melhores lugares para fazê-lo é nas nossas instituições de ensino superior. Devemos fazer que as nossas universidades sejam templos não da ortodoxia dogmática, mas sim do verdadeiro pensamento crítico, onde todas as ideias sejam bem-vindas e onde se impulsione o debate civil. Estou acostumada a que me assobiem nas universidades, pelo que estou muito agradecida de poder falar aqui hoje. Não espero que todos estejais de acordo comigo, mas aprecio muitíssimo a vossa abertura à escuta.

Estou perante vós aqui como alguém que está combatendo pelos direitos das mulheres e das raparigas de todo o mundo. E estou perante vós como alguém que não tem medo de colocar perguntas incómodas sobre o papel da religião nesta batalha. A vinculação entre violência, sobretudo a violência contra as mulheres, e o islão é demasiado clara para ser ignorada. Não ajudamos os estudantes, as universidades, os ateus e os crentes quando fechamos os olhos perante esta vinculação, quando procuramos desculpas em lugar de reflectir.

Por isto pergunto: o conceito de guerra santa, é compatível com o nosso ideal de tolerância religiosa? É blasfémia, castigada com a morte, por em discussão a aplicação na nossa era de certas doutrinas que remontam ao século VII? Tanto o cristianismo como o judaísmo tiveram as suas reformas. Chegou o tempo também para uma reforma do islão.

São inadmissíveis estas argumentações? Certamente deveriam ser admissíveis para uma universidade que foi fundada depois do escândalo do Holocausto num tempo no qual muitas universidades estadunidenses ainda impunham restrições aos estudantes judeus. O lema da Brandeis University é: “A verdade, também a mais inacessível”. É também o meu lema».

A dupla perseguição de Ayaan
Em 2004 todo o mundo ocidental se levantou contra o assassinato de Theo Van Gogh e a condenação à morte de Ayaan. A ela, imigrante chegada à Holanda em 1992, nessa época cidadã holandesa e deputada do Partido Social-democrata, concedeu-se-lhe uma escolta e o consolo de inumeráveis manifestações de solidariedade. Submission foi projectado em todo o mundo ocidental.

Mas dois anos depois, em 2006, o ministério de Imigração holandês, com o pretexto de dados errados no seu pedido de cidadania apresentado em 1997, decidiu considerar nulo o acto de naturalização de Ayaan Hirsi Ali. Concederam-lhe seis semanas para recorrer. Ao mesmo tempo, um juiz emitia uma sentença favorável aos seus vizinhos de casa que tinham solicitado o seu despejo sustentando que a sua intimidade tinha sido violada por causa das medidas de segurança adoptadas para protege-la e temiam que a sua presença pudesse por em risco a sua segurança.

A sentença requeria-lhe deixar no prazo de quatro meses a vivenda-refúgio posta à sua disposição pelo estado para defendê-la. Deste modo, Hirsi Ali decidiu aceitar uma oferta de trabalho no American Enterprise Institute de Washington e mudou-se para os Estados Unidos.

Feio papel das autoridades académicas
O que sucedeu na Brandeis University, com o agravante por parte das autoridades académicas de ter tentado apresentar a renúncia ao doutoramento honoris causa como uma decisão acordada com Hirsi Ali, coisa que não é certa, é um sinal dos tempos: e desta vez o mundo ocidental não se levantou em defesa de Ayaan, e dos próprios ideais.

Os dois magníficos livros autobiográficos escritos por Ayaan Hirsi Ali foram publicados em Itália por Rizzoli: Infedele (Infiel), em 2007, e Nomade (Nómada), em 2010. Meles Ayaan relata a sua vida, desde a sua infância na Somália (marcada pelo facto da lacerante infibulação (ablação) que lhe impôs a sua avó sem o saberem os seus pais e pelos acontecimentos na sua família, que sofreu a perseguição do ditador Siad Barre contra o cual combatia o pai de Ayaan) até os acontecimentos que a levaram à Arábia Saudita, Etiópia e Quénia, passando pelo casamento que lhe impôs o seu pai, o acto liberatório de subtrair-se ao destino de mulheres como ela e aos seguintes anos passados na Europa e nos Estados Unidos: “Sabia que uma vida diferente era possível (escreve Hirsi Ali em Infiel, recordando o início da sua nova vida no Ocidente) tinha-o lido nos livros e agora podia vê-lo, ou lê-lo no ar: o tipo de existência que tinha sempre querido, com uma verdadeira instrução, um trabalho de verdade, um matrimónio de verdade. Queria converter-me numa pessoa, um indivíduo, com uma vida própria”.

O Deus cristão
O preço que pagou é altíssimo. O seu pai e toda a sua família rejeitaram-na e perdeu a fé. Se agora também o Ocidente a rejeita, que lhe resta? Talvez o apoio da comunidade cristã à qual apelava na introdução de Nómada? “Tive o prazer de encontrar cristãos cujo conceito de Deus está muito longe de Alá (lê-se na sua introdução ao livro); este Deus cristão moderno é sinónimo de amor: os sacerdotes não pregam o ódio, a intolerância e a discórdia; este Deus é misericordioso, não procura o poder temporal e não está em competição com a ciência; os seus seguidores consideram a Bíblia um livro feito de parábolas, não de ordens taxantes às que há que atender rigorosamente. O cristianismo do amor e a tolerância é um dos mais potentes antídotos do Ocidente ao islão do ódio e a intolerância”.

Publicado originalmente em La Nuova Bussola Quotidiana.
 
Tradução de Helena Faccia Serrano.

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