Em junho de 2020, Héber Marques, líder da banda HMB, deu uma entrevista inicialmente para a Blitz, e posteriormente republicada na revista E do Expresso. O músico é reconhecido nacionalmente e internacionalmente pelo seu talento. É louvável ter música de qualidade produzida em português e em Portugal.
Héber terá dito nessa entrevista: “Tenho dois filhos e com a experiência do confinamento claramente não vou ao terceiro”.
É um sentimento perfeitamente normal e natural. Quantas vezes me sinto frustrada, incapaz e até a falhar na educação dos meus filhos? Várias vezes ao dia.
No entanto, esta é uma mensagem muito batida e repetida em Portugal, que se aplica a todos os setores da vida. Não é uma mensagem que os portugueses precisem de ouvir, especialmente nesta crise. Portugal tem a 5ª taxa de natalidade mais baixa da Europa e uma das mais baixas do mundo. Os óbitos superam nascimentos. Portugal é um dos países mais pobres da Europa. De acordo com a estimativa do Eurostat para 2018, Portugal estava em 21º lugar no ranking do PIB dos países europeus. Há dez anos, o PIB per capita de Portugal estava 20% abaixo da média da EU. Portugal tem níveis de produção interna baixíssimos.
Parece que os portugueses têm uma dose a mais de “responsabilidade”, cuidado e prudência e uma dose a menos de audácia, coragem, criatividade e capacidade de arriscar.
Por isso, a propósito da natalidade e da frase de Héber Marques, gostaria de afirmar que vou ao quinto filho e com muito gosto!
A nossa geração adotou um modelo de paternidade ultra-cuidadosa, baseada na ciência e em estudos: a chamada “paternidade helicóptero”. Os pais pairam sobre o seu filho único ou sobre os seus dois filhinhos, controlando e “educando” cada movimento.
Para a cultura hedonista e viciada em entretenimento, os bebés, geralmente, não são bem-vindos. Vivemos um colapso generalizado da vida familiar, num mundo hostil ao estabelecimento e florescimento saudável da família. A nossa cultura vê os bebés como um gasto financeiro, uma ameaça à visão do mundo que iguala o prazer à felicidade. As famílias numerosas tornam-se desconcertantes.
Acredito que é preciso muita responsabilidade e generosidade para assumir a tarefa de educar as crianças. É claro que há pais negligentes que nunca assumiram essa tarefa, mas aqueles que a assumem são muito mais responsáveis e generosos. As exigências que surgem com a educação dos filhos fazem os pais cultivarem uma grande variedade de virtudes e bons hábitos, como ter paciência, acordar cedo, gastar menos dinheiro, trabalhar mais arduamente em casa e ser um bom exemplo. Se temos uma família numerosa, essas exigências serão maiores. É uma oportunidade para todos crescerem.
Na vida profissional, as pessoas valorizam virtudes como a laboriosidade, a tenacidade e a resiliência, que ajudam a superar obstáculos e formar melhores trabalhadores. Então, porque não valorizar o mesmo na vida familiar? Numa família numerosa são mais as oportunidades de partilhar, de aprender a brincar e a trabalhar com outros.
Impõe-se a necessidade de controlar melhor os gastos financeiros, de reduzir materialmente algumas necessidades, mas por outro lado adquirem-se outros. Mais um irmão ou irmã implica mais amor para dar e receber, pôr a render outros talentos, partilhar tudo e ver crescer os bens imateriais. Pode parecer surpreendente, mas as crianças gostam de brincar umas com outras, especialmente com irmãos e primos. Há muitos desafios, mas há também benefícios.
Eu percebi que as pessoas só dão os parabéns pela gravidez do primeiro bebé, se temos mais de trinta anos, já viajámos, frequentámos muitos restaurantes e “vivemos a vida”. Elas também darão parabéns na gravidez do segundo, se as gestações forem espaçadas e se pretendemos ter um bebé do outro sexo. Todos os outros casos serão criticados.
Estou grávida do meu quinto filho. Anteriormente, eu tremia quando alguém me perguntava se a gravidez foi planeada, ao que eu ia respondendo que sim, que a diferença de idade entre as crianças era de quase dois anos, etc.
Porém, agora comecei a ficar irritada com as várias atitudes que a maioria das pessoas tem para comigo, pois a maior parte só me diz coisas negativas. Poucos são os que nos dão os parabéns e se alegram com a notícia. Quando contámos a uma vizinha que estávamos à espera de outro bebé, ela respondeu: “Bem, vocês é que sabem”.
Temos um casamento feliz, gostamos de crianças e de os educar e, embora não tenhamos muito dinheiro, temos um ordenado fixo suficiente, somos jovens e saudáveis e eu não tenho doenças que ponham a gravidez em risco.
Numa sociedade em que se valoriza tolerância e inclusão, falta apreciar a beleza duma família numerosa e duma vida nova, seja em que condições vier. Estas trazem não só vantagens para os membros da família e para a família como um todo, como para toda a sociedade.
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| Julie Machado Professora |
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