quarta-feira, 2 de janeiro de 2019
Texto de Maria Wilton
Mulheres em protesto contra o impedimento de entrarem no templo Sabarimala
(foto reproduzida daqui)
Na madrugada de quarta-feira, 26 de dezembro, Bindu e Kanaka Durga, 42 e 44 anos, tornaram-se as primeiras mulheres a entrar num templo hindu no estado de Kerala, Índia, após o Supremo Tribunal desse estado ter levantado, em setembro passado, a proibição que existia, noticiou o The Guardian.
Ao entrarem no Templo Sabarimala, um dos locais de peregrinação mais sagrados do hinduísmo na região, as duas desafiaram uma tradição local que proíbe mulheres com idade para ser menstruadas (entre os 10 e 50 anos) de entrar neste espaço sagrado. Os defensores da proibição consideram que as mulheres nesta idade tornariam o espaço impuro: Ayyappa, divindade do templo e deus hindu do crescimento, é celibatário e as mulheres constituiriam uma tentação à própria figura da divindade.
Ajit Hansraj vice-presidente da Comunidade Hindu Portuguesa, diz que uma situação como esta não é habitual, mesmo na Índia: “Isto não tem a ver com o hinduísmo em si, mas com os responsáveis de cada templo. É a primeira vez que tenho conhecimento de uma situação onde as mulheres não podem entrar num templo.” Mais comum é a interdição de entrar num templo apenas quando estão no período da menstruação – algo que já não acontece em Portugal, por exemplo. “Na maioria dos casos, mesmo que sejam pessoas de outro credo, desde que seja em paz, são todos bem-vindos nos templos”, conclui Ajit.
Até quarta-feira, 26 de dezembro, o templo teria recusado cumprir a decisão do tribunal e todas as tentativas, feitas por mulheres, de visitarem o local tinham sido impedidas por fiéis que apoiavam a proibição. Após a sua entrada no templo, o sacerdote terá mesmo fechado o espaço para proceder a rituais de purificação.
O levantamento desta proibição tem gerado muita controvérsia junto de sectores conservadores da região, obrigando as mulheres que queiram ir ao templo a ser acompanhadas por polícias. Após a decisão do tribunal em setembro, as autoridades terão designado uma força policial de 1300 homens para o efeito, argumentando que esta é uma questão de direitos humanos.
O governo do estado de Kerala é atualmente – pelo menos, até às novas eleições, em maio – composto por partidos de esquerda, que têm tentado permitir a entrada de mulheres no templo. Esta posição tem gerado muitas críticas dos principais partidos políticos do país. Citados na Reuters, os nacionalistas do Partido do Povo Indiano (Bharatiya Janata Party, BJP) descreveram esta visita das mulheres ao templo como “uma conspiração de líderes ateus para destruir os templos hindus.” Também responsáveis do Congresso Nacional Indiano nesse estado alinharam com os rivais do BJP e apelaram a protestos, afirmando: “Isto é traição…O governo terá que pagar o preço por esta violação da tradição.”
Uma corrente de 620 quilómetros de mulheres
Numa entrevista à agência de notícias asiática ANI, o primeiro-ministro Narendra Mondi, do BJP, considerou que a situação estava mais relacionada com tradição religiosa do que com igualdade de género. Mondi acrescentou ainda que existem templos onde os homens estão barrados de entrar, apesar de não dizer onde.
Perante os protestos que se geraram após a entrada das mulheres no templo, o ministro-chefe de Kerala, Pinarayi Vijayan, reiterou a posição já anteriormente tomada: “Como clarifiquei anteriormente, o governo.
irá proteger qualquer mulher que deseje entrar no templo.”
Na terça-feira, 1 de janeiro, milhões de mulheres saíram à rua para defender o seu direito de entrar nos templos. No que foi designado como um “muro de mulheres”, as manifestantes formaram uma cadeia que se estendeu aproximadamente por 620 quilómetros ao longo do estado de Kerala.
Segundo o governo local, mais de cinco milhões de pessoas juntaram-se ao protesto pacifico durante 15 minutos. À CNN, Subhashini Ali, uma responsável do Partido Comunista Indiano que participou no protesto, afirmou que as mulheres que saem à rua em Kerala para lutar pelos seus direitos, vão “mudar a conversa à volta do género: há muitas formas de discriminação feitas em nome da tradição. Este é um importante assunto para as mulheres e para a democracia.”
Em outubro passado, o site noticioso India Today fez uma lista de alguns locais de culto onde as mulheres ainda não são bem-vindas.
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