Há alguns dias atrás, ao abrir
uma vitrina, deparei-me com uns
lindíssimos pratos decorativos Limoges
em miniatura, em tom amarelo claro, todo pintado com flores em tons suaves. Tinham
sido oferecidos por uma prima, na sequência de uma das suas inúmeras viagens a
França. Senti imensas saudades do casal, sempre muito querido. Esta prima há
muitos anos atrás tinha por hábito referir, reconheço agora, o amor pelos
filhos: “Os filhos serão nossos para sempre. O marido é, enquanto o for”. Não
que fosse infeliz no casamento. De todo. Não conheci casal mais unido, que
permaneceu fiel até ao final. Referia-se aos filhos, que lhe causaram alguns
constrangimentos, por optarem, viver no estrangeiro, impedindo-a de gozar em
plenitude a companhia dos netos. Vi-a a partir várias vezes ao ano, de carro,
numa longa viagem. Eram outros tempos. Possuía um coração enorme, saudoso dos
seus entes queridos. Criticavam-na amistosamente por empreenderem tão grandes
viagens com uma idade já um pouco avançada, de carro. A sua resposta foi a que
mencionei. Acrescentava ainda: “Para semear é preciso colher. Quero muito estar
com os meus netos nos quais nos projetamos. São a nossa continuidade. Reveste-se
da maior importância estas vivências não só para o seu futuro mas também para o
nosso bem-estar. Sentirmo-nos amados, desejados, recebendo muito afeto. Vale a
pena todos os sacrifícios para usufruir da sua companhia”. Graças a estas
viagens, continuaram as ligações familiares a Portugal, que, se Deus quiser, se
projetarão no futuro.
Espero que a minha neta compreenda
a importância que tem para a avó usufruir da sua doce e meiga companhia, do seu
afeto e carinho. Importa transmitir as histórias da família, as nossas
vivências e valores. Como te ris docemente ao ver as fotos antigas, ao querer
vestir os meus fatos, calçar os meus sapatos de salto alto. Recordo com doçura que
uma vez que fomos a Fátima, na companhia dos tios e dos pais como aprendeu,
ainda não tinhas dois anos, a ajoelhar-se diante de Nossa Senhora e a querer
rezar uma Ave-maria. Todos ficámos encantados com a sua atitude. Com ela
torno-me criança outra vez. Brincamos, vamos ao cinema, passeamos, degustamos
os pratos de que mais gosta mesmo que não sejam os meus favoritos. Mas fico
feliz por ver um enorme sorriso de satisfação no seu rosto. Procuro ir de
encontro à sua vontade, ainda que às vezes tenha de dizer não, quando sinto que
se encontra a testar os meus limites, tornando-se necessário impor-me, no
sentido de lhe dar a conhecer as regras, ainda que chore com pena por dentro. Depois
reconsidera, pede desculpa e segue-se aquele beijo e abraço de perdão, de muito
carinho e de cumplicidade, entre avó e neta. Tinha pouco mais de um ano quando
uma tia lhe ofereceu uma prenda. Ao abrir viu que era um vestido, bem bonito
por sinal. Colocou de lado. Disse com frontalidade, como só uma criança pode
dizer: “penda, é pa brincar”. Essa sua frase ficou registada até aos dias de
hoje.
Hoje decidi ir ao cinema com a
minha neta que esteve doente. Escolheu um filme que tinha uma música, de que
gostava muito, e que cantarolou para me tentar convencer. Pensei interiormente
que era bom ser um filme musical. Comprámos os bilhetes e, como não podia
deixar de ser, um menu infantil com pipocas, sumo e chocolate. O filme era
sobre o circo. Pensei que era para crianças, ainda assim, resolvi confirmar se
era adequado, antes de entrarmos. Enfim, todo o cuidado é pouco. Serviu de
lição. O filme era para maiores de 16 anos. Arrepiámos caminho. A minha neta
não quis ver outro filme. Não queria desenhos animados. Isso era para crianças!
Ela já tinha 7 anos. Enfim, subimos para a cafetaria, no sentido de tomarmos
uma bebida e decidir o que fazer. O funcionário, já antigo, olhou para a minha
neta e disse-lhe docemente: “Como estás crescida, uma senhora. Eras um bebé
quando começaste a vir aqui. O tempo passa!” Ficou vaidosa. Passou a tristeza.
Combinámos, que o melhor seria mesmo vermos um filme em casa. Com o dinheiro do
cinema, comprámos uma prenda útil, umas luvas castanhas, de que tinha gostado e
que fez as suas delícias, a protegeu do frio do inverno que se fazia sentir.
São sempre animados estes passeios com a minha neta.
Como São João Paulo II dizia: “A
família é a base da sociedade e o lugar onde as pessoas aprendem pela primeira
vez, os valores que as guiarão durante toda a sua vida”. Que Santa Maria,
Rainha da Família, proteja e interceda pelas famílias, principalmente pelas que
mais necessitam, projetando a continuidade, o amor e a solidariedade entre
gerações.
Maria Helena Paes |
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