Na celebração da Vigília Pascal na Basílica de São Pedro, o Santo Padre baptiza doze catecúmenos procedentes de vários países do mundo. Texto
completo da homilia
Publicamos abaixo a homilia do Papa Francisco da Vigília Pascal da
noite santa, pronunciado na Basílica Vaticana no sábado, 26 de Março de
2016:
***
«Pedro (…) correu ao sepulcro» (Lc 24, 12). Quais poderiam ser
os pensamentos que agitavam a mente e o coração de Pedro durante esta
corrida? O Evangelho diz-nos que os Onze, incluindo Pedro, não
acreditaram no testemunho das mulheres, no seu anúncio pascal. Antes,
aquelas «palavras pareceram-lhes um desvario» (v. 11). Por isso, no
coração de Pedro, reinava a dúvida, acompanhada por muitos pensamentos
negativos: a tristeza pela morte do Mestre amado e a decepção por tê-Lo
renegado três vezes durante a Paixão.
Mas há um detalhe que assinala a sua transformação: depois que ouvira
as mulheres sem ter acreditado nelas, Pedro «pôs-se a caminho» (v. 12).
Não ficou sentado a pensar, não ficou fechado em casa como os outros.
Não se deixou enredar pela atmosfera pesada daqueles dias, nem aliciar
pelas suas dúvidas; não se deixou absorver pelos remorsos, o medo e as
maledicências sem fim que não levam a nada. Procurou Jesus; não a si
mesmo. Preferiu a via do encontro e da confiança e, assim como era,
pôs-se a caminho e correu ao sepulcro, donde voltou depois «admirado»
(v. 12). Isto foi o início da «ressurreição» de Pedro, a ressurreição do
seu coração. Sem ceder à tristeza nem à escuridão, deu espaço à voz da
esperança: deixou que a luz de Deus entrasse no seu coração, sem a
sufocar.
As próprias mulheres, que saíram de manhã cedo para fazer uma obra de
misericórdia, ou seja, levar os perfumes ao sepulcro, viveram a mesma
experiência. Estavam «amedrontadas e voltaram o rosto para o chão», mas
sobressaltaram-se ao ouvir estas palavras do anjo: «Porque buscais entre
os mortos Aquele que está vivo?» (cf. v. 5).
Também nós, como Pedro e as mulheres, não podemos encontrar a vida,
permanecendo tristes e sem esperança e permanecendo aprisionados em nós
mesmos. Mas abramos ao Senhor os nossos sepulcros selados – cada um de
nós os conhece -, para que Jesus entre e dê vida; levemos-Lhe as pedras
dos ressentimentos e os penedos do passado, as rochas pesadas das
fraquezas e das quedas. Ele deseja vir e tomar-nos pela mão, para nos
tirar para fora da angústia. Mas a primeira pedra a fazer rolar para o
lado nesta noite é esta: a falta de esperança, que nos fecha em nós
mesmos. O Senhor nos livre desta terrível armadilha: sermos cristãos sem
esperança, que vivem como se o Senhor não tivesse ressuscitado e o
centro da vida fossem os nossos problemas.
Vemos e continuaremos a ver problemas perto e dentro de nós. Sempre
existirão, mas esta noite é preciso iluminar tais problemas com a luz do
Ressuscitado, de certo modo «evangelizá-los». Evangelizar os problemas.
Não permitamos que a escuridão e os medos atraiam o olhar da alma e se
apoderem do coração, mas escutemos a palavra do Anjo: o Senhor «não está
aqui; ressuscitou!» (v. 6); Ele é a nossa maior alegria, está sempre ao
nosso lado e nunca nos decepcionará.
Este é o fundamento da esperança, que não é mero optimismo, nem uma
atitude psicológica ou um bom convite a ter coragem. A esperança cristã é
um dom que Deus nos concede, se sairmos de nós mesmos e nos abrirmos a
Ele Esta esperança não decepciona porque o Espírito Santo foi infundido
nos nossos corações (cf. Rm 5, 5). O Consolador não faz com que
tudo apareça bonito, não elimina o mal com a varinha mágica, mas infunde
a verdadeira força da vida, que não é a ausência de problemas, mas a
certeza de sermos sempre amados e perdoados por Cristo, que por nós
venceu o pecado, venceu a morte, venceu o medo. Hoje é a festa da nossa
esperança, a celebração desta certeza: nada e ninguém poderá jamais
separar-nos do seu amor (cf. Rm 8, 39).
O Senhor está vivo e quer ser procurado entre os vivos. Depois de O
ter encontrado, cada um é enviado por Ele para levar o anúncio da
Páscoa, para suscitar e ressuscitar a esperança nos corações
pesados de tristeza, em quem sente dificuldade para encontrar a luz da
vida. Há tanta necessidade disto hoje. Esquecendo de nós mesmos, como servos jubilosos da esperança,
somos chamados a anunciar o Ressuscitado com a vida e através do amor;
caso contrário, seremos uma estrutura internacional com um grande número
de adeptos e boas regras, mas incapaz de dar a esperança de que o mundo
está sedento.
Como podemos alimentar a nossa esperança? A Liturgia desta noite dá-nos um bom conselho. Ensina-nos a recordar
as obras de Deus. Com efeito, as leituras narraram-nos a sua
fidelidade, a história de seu amor por nós. A Palavra viva de Deus é
capaz de nos envolver nesta história de amor, alimentando a esperança e
reavivando a alegria. Isto mesmo nos lembra também o Evangelho que
escutamos. Os anjos, para dar esperança às mulheres, dizem: «Lembrai-vos
de como [Jesus] vos falou» (v. 6). Fazer memória das palavras de Jesus,
fazer memória de tudo aquilo que Ele fez na nossa vida. Não esqueçamos a
sua Palavra e as suas obras, senão perderemos a esperança e nos
tornaremos cristãos sem esperança; por isso façamos memória do Senhor,
da sua bondade e das suas palavras de vida que nos tocaram;
recordemo-las e façamo-las nossas, para sermos sentinelas da manhã que
sabem vislumbrar os sinais do Ressuscitado.
Amados irmãos e irmãs, Cristo ressuscitou! E nós temos a
possibilidade de abrir-nos e receber o seu dom de esperança. Abramo-nos à
esperança e ponhamo-nos a caminho; a memória das suas obras e das suas
palavras seja a luz resplandecente, que orienta os nossos passos na
confiança, rumo àquela Páscoa que não terá fim.
in
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