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sexta-feira, 27 de setembro de 2024

Francisco colocou os migrantes no centro da sua viagem ao coração da Europa

Mostrando "caminho a seguir"

 | 26 Set 2024

O Papa Francisco no encontro com a comunidade católica do Luxemburgo, 26 setembro 2024. Foto Vatican Media

Para o Papa, acolher o outro é “um dever de justiça antes ainda do dever de caridade”Foto © Vatican Media

“Obrigado ao povo e ao governo do Luxemburgo pelo que fazem pelos migrantes”, disse Francisco no final do primeiro dia da sua 46ª viagem apostólica. A frase não estava prevista no discurso que preparara para o encontro com a comunidade católica na Catedral de Notre-Dame do Luxemburgo, tal como não estava previsto o presente que mais o comoveu no voo que o levou de Roma em direção ao coração da Europa: um saco de tecido senegalês cheio de cartas escritas por migrantes que fugiram de África em busca de um futuro melhor, e que vivem atualmente nas Ilhas Canárias.

Foi a vaticanista espanhola Eva Fernández que o entregou ao Papa. Lá dentro, entre muitas outras, estava a carta de Michel, ainda menor de idade. Nela, o mais novo de três irmãos conta que viajou durante sete dias com a mesma roupa, porque os traficantes deixaram a sua mochila em terra. Quando chegou às Canárias, depois de uma semana com a mesma t-shirt e as mesmas calças sempre molhadas no corpo, mal conseguia andar. Foi acolhido juntamente com um amigo pela Fundação Il Buon Samaritano e já começou a trabalhar. Assim, escreve esperançoso, poderá ajudar a sua família no Senegal.

Ousseynou Fall, também do Senegal, é o autor de outra das cartas: é mais velho que Michel, mas igualmente traumatizado pela viagem, durante a qual viu várias pessoas morrerem de sede. Na sua missiva, diz ao Papa que se ele for visitar as Canárias será de grande conforto para aqueles que sofrem e sonham na ilha. E se essa visita se concretizar, Ousseynou oferece-se para acompanhar Francisco ao porto de Arguineguin, onde muitas pessoas chegam em barcos.

Há também uma carta de Abibo Danfá, da Guiné Bissau, um dos poucos cristãos que chegaram às Ilhas Canárias. No seu país, Abibo estudou e trabalhou para pagar os estudos dele e dos irmãos, mas a falta de dinheiro impediu-o de continuar. Chegou de barco a El Hierro, depois de uma viagem tortuosa. Fala ao Papa sobre a impossibilidade de viver em África devido à fome e às guerras: explica que é por isso que muitos decidem tentar reconstruir as suas vidas na Europa. Alguns têm como objetivo chegar ao Luxemburgo e à Bélgica, que Francisco visita por estes dias.

Consciente destas e de tantas outras histórias tragicamente semelhantes, o Papa colocou os migrantes no centro das duas intervenções que fez no Luxemburgo, esta quinta-feira, antes de rumar a Bruxelas.

O Papa Francisco no encontro com as autoridades do Luxemburgo, 26 setembro 2024. Foto Vatican Media (1)

O Papa pediu aos responsáveis políticos do Luxemburgo que ajudem as nações mais desfavorecidas a sair dessa condição. Foto © Vatican Media

De manhã, durante o encontro com as autoridades e representantes do grão-ducado, Francisco pediu aos responsáveis políticos maior vigilância para não negligenciarem as nações mais desfavorecidas, ajudando-as a sair da sua condição de empobrecimento. “Trata-se de uma excelente forma de garantir a diminuição do número dos que são obrigados a emigrar, muitas vezes em condições desumanas e perigosas”, assinalou.

Tendo em conta a sua localização estratégica e o facto de quase metade dos seus habitantes virem de outras partes da Europa e do mundo, o Papa descreveu o Luxemburgo como “uma ajuda e um exemplo para mostrar o caminho a seguir em matéria de acolhimento e integração de migrantes e refugiados”.

Francisco sublinhou ainda que este pequeno país “pode mostrar a todos as vantagens da paz face aos horrores da guerra, da integração e da promoção dos migrantes face à sua segregação; os benefícios da cooperação entre as nações face às consequências nefastas do endurecimento das posições e da procura egoísta e míope, ou mesmo violenta, dos próprios interesses”.

Mais tarde, no encontro com a comunidade católica, e depois de ter escutado com visível satisfação os testemunhos de um jovem e uma religiosa portugueses a viver no Luxemburgo, o Papa voltou a insistir num “aspeto hoje muito premente: o acolhimento”. “Neste campo, o vosso país tem e mantém viva uma tradição secular. Sim, o espírito do Evangelho é um espírito de acolhimento, de abertura a todos, e não admite nenhum tipo de exclusão”, disse Francisco. “Encorajo-vos, portanto, a permanecer fiéis a esta herança, continuando a fazer do vosso país uma casa amiga para quem quer que bata à vossa porta em busca de ajuda e hospitalidade”, acrescentou.

Para o Papa, acolher o outro é “um dever de justiça antes ainda do dever de caridade”. E recordando João Paulo II, que em 1985 encorajou os jovens luxemburgueses a traçar caminho para “uma Europa não só das mercadorias e dos bens, mas dos valores, dos homens e dos corações”, na qual o Evangelho fosse partilhado “na palavra do anúncio e nos sinais do amor”, Francisco sublinhou a importância de “uma Europa, e um mundo, em que o Evangelho seja transmitido através da palavra do anúncio unida aos sinais do amor”.

No final, a Igreja luxemburguesa ofereceu um presente ao Papa – um donativo das comunidades católicas – que será encaminhado para a Cáritas local, para colocar em prática o que ele pediu: ajudar os pobres e refugiados.



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