Às vezes surgem acontecimentos, que correspondem a uma intenção que se encontra gravada no nosso subconsciente. Passo a explicar. Tinha pensado agendar o meu retiro. Contudo, surgiu o confinamento. Tudo foi adiado. Claro que temos toda uma panóplia de formação online. Mas pode nem sempre corresponder às nossas expetativas. Restava aguardar, certamente melhores dias viriam. Entretanto, como grande parte dos avós, ajudava o meu filho e nora a tomar conta da minha neta. Era tudo novo. As aulas online. A impossibilidade de sair, unicamente, para uma deslocação rápida ao supermercado ou à farmácia. Mas os desígnios de Deus são insondáveis! Há alguns dias deparo-me com o anúncio de um retiro da Quaresma. Seria online, como só é possível neste tempo de emergência devido à crise sanitária. Abri o site da sua divulgação. Pareceu-me muito interessante. Abordei o assunto com uma amiga que me aconselhou vivamente a participar. Dificilmente poderia participar num retiro presencial. Estavam a ser cancelados pelos motivos óbvios. Ela própria já tinha participado num retiro online: tinha sido diferente mas bom.
Na verdade, constituiria sempre uma ação de formação de grande utilidade uma vez que era dedicado não só à Quaresma mas dedicado a São José neste ano especial que o Papa consagrou para assinalar os 150 anos do aniversário da sua declaração como padroeiro da Igreja universal. O retiro teve início sendo muito participado. Um largo número de paroquianos tinha aderido a esta pausa no quotidiano em tempo de confinamento para aprofundar e meditar a espiritualidade de São José. Irei mencionar alguns dos excertos dos temas abordados que mais me tocaram.
Foi referido que na nossa vida existia sempre outra alternativa, a possibilida configurarmos de outra forma, uma vez que o nosso caminho precisa de ser, algumas vezes, reorganizado contando com a ajuda do GPS. Recalcular e corrigir a rota do nosso pensar ao corrermos para a meta, ou seja, para Jesus Cristo. Temos de tomar o caminho certo com criatividade para que nos possa abrir novos horizontes e novos caminhos quando estes parecem intransponíveis na nossa conversão, sendo que o Espírito Santo nos ilumina sempre e nos conforta, quando necessário. José e Maria foram inseparáveis acolhendo a Palavra de Deus, não pondo em causa o projeto de Deus, que viria a ter um alcance decisivo para o povo de Israel e para toda a humanidade, através da confiança depositada no Deus fiel, no Deus verdadeiro, no Deus Justo. “José, filho de David, não temas!”. Torna-se necessário procurar vislumbrar as luzes de saída. Deus nunca desiste de nós. Está sempre connosco até ao fim dos tempos. Com confiança e discernimento teremos de adotar os mecanismos e as decisões necessárias. Na verdade, o encontro com Jesus impele-nos a amá-lo cada vez mais, com novo ardor. São José não desistiu no meio das dificuldades. Com o batismo fomos oficialmente presentes a Deus e por isso devemos sentir--nos seguros, redimidos, salvos, apesar de todas as espadas que possam alguma vez trespassar a nossa alma. Jesus estará sempre presente para
nos ajudar nas quedas e no ressurgimento (ressuscitar em Cristo). Como São José deixemos que seja Deus a conduzir a nossa vida. Por outro lado a nossa vida gera sempre consequências nos outros. Não devemos desistir de ninguém, nem devemos abandonar ninguém, mas sempre ajudar os outros a recuperar a esperança alguma vez perdida. O seio familiar foi e será sempre o lugar de segurança, de confiança, de conforto para prosseguir o nosso caminho. A relação de Jesus com José e Maria, constituem os primeiros rostos de misericórdia infinita. São José constitui uma grande fonte de inspiração enquanto cuidador de José e de Maria.
Entretanto recebo um telefonema. Uma amiga de há largos anos comunicava-me que o seu irmão tinha falecido. Conhecia o irmão. Que desgosto, uma pessoa ainda tão jovem. Consolei-a o melhor que pude. Fiquei um pouco fragilizada e desorientada com a notícia. A meditação continuava. O sacerdote referia que “as perdas podem ser aproveitadas para ser um lugar de esperança na certeza do amor de Deus, enquanto Pai que dá sentido à nossa existência”.
Encontramo-nos sempre diante de um drama pessoal e familiar. Abrem-se os horizontes de esperança na perspetiva do reencontro. A tristeza da perda e a alegria do reencontro. A perda das pessoas é muito dolorosa, nomeadamente a perda de familiares e das pessoas que se encontram mais perto. Nos dias que correm devido à pandemia, sofremos muitas e diferentes perdas. Corremos o risco de ficarmos indiferentes, de fechar o nosso coração para não nos envolvermos mais. A certa altura pode parecer tornar-se uma realidade instalada e fugirmos para não a enfrentarmos.
Na perda da esperança, quando esta falta, ficam abalados os fundamentos da vida sobrenatural. E a falta de amor conduz algumas vezes à morte espiritual, à falta de sentido para a vida. Hoje em dia sofre-se mais da falta de amor do que de outros problemas. A falta de esperança afeta a alma. É uma realidade muito mais profunda. O cuidado com a vida espiritual, o crescimento interior na fé, no amor, hão-de ser momentos marcantes para fortalecer a nossa esperança. O tempo da Quaresma constitui o tempo certo para um novo encontro com Deus e com os outros, concedendo-nos a paz. A perda da fé, acentuada no tempo em que vivemos constitui um prejuízo para toda a humanidade. Muitas pessoas e famílias inteiras conhecem o vazio que se instala. Vidas com pouco ou sem sentido. É o tempo de voltar a Deus de todo o coração pela força da nossa vontade, com ânimo, com entusiasmo, por amor a Deus e para o bem dos que nos são próximos.
Às vezes os acontecimentos parecem interligar-se. Fiquei reconhecida pela oportunidade que me tinha sido concedida de participar neste retiro inesperado. Constituiu uma enorme ajuda neste tempo em que vivenciamos um isolamento maior, em que nos preocupamos com o futuro regresso à dita “vida normal” quando for possível, porque não queremos que a nossa fé seja, de algum modo, abalada pelas consequências desta enorme crise sanitária. S. João Paulo II referiu: “Lembrar com gratidão o passado, viver com gratidão o presente, abrir-se com confiança ao futuro”.
Maria Helena Paes |
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