Páginas

sábado, 18 de abril de 2015

Especialmente chamativo é o silêncio dos países ocidentais perante todas estas torturas

Carta do bispo espanhol dom Demetrio Fernández sobre os cristãos perseguidos


Madrid, 16 de Abril de 2015 (Zenit.org)


No mundo inteiro, celebramos neste ano o centenário daquele genocídio arménio que eliminou um milhão e meio de cristãos só por serem cristãos. Ao longo do século XX houve outros extermínios. Em nossa pátria [a Espanha], nos anos 1930, nossos pais e avós sofreram perseguição e muitos deles o martírio (já reconhecido oficialmente pela Igreja). Antes, o mesmo aconteceu no México durante a revolução “cristera”. Depois, em muitos países do Leste da Europa. Ou na China, no Vietname etc. Ao longo de toda a história, os cristãos foram perseguidos por serem cristãos. E o sangue dos mártires sempre foi semente de novos cristãos. Os perseguidores não sabem que, quanto mais perseguem, mais consolidam a fé cristã em tantos lugares da terra. E a Igreja abriu seu caminho ao longo da história em meio a perseguições e carências.

Outro tipo de perseguição, mais dissimulada, é a de amordaçar os cristãos nos países do ocidente, os países mais desenvolvidos, relegando a presença de Deus ao mais íntimo da consciência e estabelecendo uma “neutralidade” laica na sociedade civil. Trata-se de encarar a vida e a sociedade como se Deus não existisse, ou fazendo abstracção de Deus. A confissão pública da fé é permitida, mas não a influência da fé na esfera pública, nem sequer quando os cristãos são a imensa maioria. Não estou falando de confessionalidade, mas de presença do cristão na esfera pública, dentro de uma sadia laicidade positiva. Neste contexto, a força do Evangelho é diminuída com o consumismo, a busca do prazer e da comodidade, o afã de ter mais, a corrupção em todas as suas formas. A fé corre mais perigo nestes ambientes relaxados do que naqueles em que os cristãos são perseguidos cruentamente.

Em nossos dias, essa perseguição sangrenta continua em lugares como a Terra Santa, o Iraque, a Síria, a Líbia, a Nigéria, o Quénia, produzindo listas inumeráveis de mártires só por serem cristãos. Não passa uma semana sem que tenhamos novas notícias desse tipo.

O que podemos fazer?

Em primeiro lugar, rezar por todos os que são perseguidos por causa da sua fé, para que o Senhor os fortaleça, console e assista. “Bem-aventurados sereis quanto vos insultarem, vos perseguirem e vos caluniarem de qualquer modo por minha causa. Alegrai-vos” (Mt 5,11), diz-nos Jesus. Ele previu que no mundo teríamos lutas e perseguições. Portanto, não é nada novo que os discípulos de Cristo sofram perseguição por causa do Evangelho: “A vossa recompensa será grande no céu”. Os mártires nos falam de outra vida, superior, da vida eterna a que chegamos pelo caminho dos mandamentos e à qual chegam directamente os que são sacrificados por serem cristãos.

Mas temos ainda de ser sensíveis e ficar atentos para mostrar a nossa solidariedade para com os irmãos cristãos que sofrem por causa da sua fé. Especialmente chamativo é o silêncio dos países ocidentais perante todas estas torturas, e, pior ainda, a indiferença globalizada, como se este assunto não fosse connosco. Somos mais sensíveis diante dos que morrem de fome do que diante dos que morrem pela fé, e não deveria acontecer nem uma coisa nem a outra. Há caminhos para fazer a nossa ajuda material chegar a esses campos de refugiados que carecem de tudo, somente por serem cristãos.

E não nos esqueçamos nunca de que o perdão é uma característica cristã. De um coração ferido, sairia espontaneamente, cedo ou tarde, a vingança, o ódio, a revanche. Os nossos irmãos cristãos, porém, que morrem por ser cristãos, nos dão um precioso testemunho de amor, de amor supremo, perdoando inclusive a quem os tortura. Esse amor só pode brotar de um coração como o de Cristo, que, ao ser crucificado, perdoou seus inimigos: “Pai, perdoa-os, porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Não é bom tapar e esquecer o passado. Recordamos para perdoar, recordamos para que as feridas sejam curadas, recordamos para aprender a amar sem medida.

Recebam o meu afecto e a minha bênção;

+ Demetrio Fernández, bispo de Córdoba

Sem comentários:

Enviar um comentário