Tive ocasião de ouvir sobre esta questão Paul Coleman,
diretor executivo da organização Alliance
Defending Freedom, dedicada à defesa da liberdade religiosa, da vida e da
família. A sua tese (exposta também no seu livro Censored, Kairos Publication, Viena, 2016) é a de que essas leis
são um perigo para a liberdade de expressão em geral e, de modo especial,
também para a liberdade de expressão dos cristãos. Elas têm servido para censurar
a voz de muitos cristãos em temas controversos, como os relativos à
homossexualidade. Há vários exemplos de queixas ou participações apresentadas
contra bispos que exprimiram a doutrina da Igreja sobre a prática homossexual,
ou contra pregadores evangélicos que citam passagens bíblicas a tal relativas.
Nalguns casos, pessoas que se pronunciaram sobre essa questão chegaram a ser
condenadas judicialmente (condenações nem sempre confirmadas, porém, pelos
tribunais de recurso). E tal verifica-se mesmo quando se distingue entre a
condenação do “erro” e o respeito pela “pessoa que erra”. O carácter muito
impreciso dos conceitos tem facilitado essas queixas e participações, as quais,
mesmo quando não resultam em condenações, contribuem para um clima geral de
auto-censura.
Reconheço esse perigo, mas não advogo a pura e simples
descriminalização do chamado “discurso de ódio”. Não devemos esquecer-nos de
que os cristãos também podem ser, e são-no muitas vezes, vítimas de discursos
de ódio. Está em causa, antes, uma correta interpretação e aplicação dessas
leis.
Há que distinguir a livre discussão de ideias (sobre a
religião, sobre os cristianismo, sobre o Islão, sobre a prática homossexual) do
que é ofensivo para com as pessoas (e também para com os seus sentimentos
religiosos).
Às ideias (mesmo que sejam erróneas, injustas,
chocantes ou absurdas) pode responder-se no plano do debate racional e da
argumentação. Esse debate é sempre salutar numa sociedade aberta, livre e
democrática. Ninguém deve recear esse debate, sobretudo quem está seguro de que,
como afirma a declaração do Vaticano II sobre liberdade religiosa, «a verdade se
impõe pela sua própria força, que penetra nos espíritos de modo ao mesmo tempo
suave e forte»; ou, de acordo com o dito popular, «a verdade é como o azeite:
acaba sempre por vir ao de cima».
Outra coisa são os insultos. Aos insultos não pode
responder-se no plano do debate de ideias. Aos insultos não pode responder-se senão
com o silêncio ou com outro insulto. Um insulto pode ferir tanto ou mais do que
uma agressão física. E uma ofensa aos sentimentos religiosos (que se distingue
da crítica a uma qualquer religião) também pode ferir tanto ou mais do que uma
ofensa pessoal. E dessa forma se gera o ódio e se facilita, mais ou menos
diretamente, a violência. Não é assim que se fortalece a sociedade livre,
aberta e democrática.
É verdade que esta distinção, entre a crítica e
discussão de ideias e o insulto, nem sempre é fácil, e que formas de expressão
menos felizes ou delicadas podem não refletir a verdadeira intenção da pessoa.
Mas não podemos recusar essa distinção, para salvaguardar a harmonia social, a
dignidade humana, a paz e a liberdade.
Pedro Vaz Patto
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