No contexto histórico da Guerra Fria, a abertura de um diálogo entre a Igreja católica e os movimentos socialistas
Roma, 25 de Abril de 2014 (Zenit.org) Federico Cenci
Em 1963, os ecos da crise dos mísseis cubanos já haviam se
propagado por todo o planeta. Com as feridas da última guerra mundial
gradualmente se cicatrizando, um novo cenário catastrófico aparecia para
muitos como uma realidade próxima.
Destacava-se o compromisso primordial de grandes líderes mundiais
para evitar que entre os dois blocos, atlântico e comunista, houvesse um
confronto com efeitos destrutivos incalculáveis.
Na Itália, a atenção ao quadro geopolítico gerou convergências antes
imprevisíveis. A maioria dos historiadores concorda em indicar o ano de
1963 como um marco na abertura de um canal de diálogo e entendimento
sobre algumas questões entre o mundo da esquerda e a Igreja Católica.
Em plena campanha eleitoral, 20 de Março de 1963, Togliatti faz um discurso em Bergamo, intitulado O destino do homem.
Das palavras do secretário do Partido Comunista jorra a intenção de
construir uma ponte com o mundo católico que vive sob o pontificado do
Papa João XXIII, um ponto decisivo de reforma. Poucos dias depois, em 11
de Abril, o Santo Padre promulgou a encíclica Pacem in Terris,
dirigida a "todos os homens de boa vontade" e que, convida a um esforço
comum para instaurar o valor supremo da paz. Texto esse de Papa
Roncalli, também apreciado por Pietro Nenni, líder do Partido Socialista
Italiano.
Aquilo que se respira na Itália é, finalmente, um ar leve, não mais
cheio de desconfiança e emulação acumulado em décadas anteriores. "Para
entender esse diálogo sem fazer confusão (adverte o sociólogo Paulo
Sorbi) é bom entender o contexto histórico em que estão localizados
estes grandes líderes".
"Nos anos 60 se entrelaçam uma grande esperança no futuro,
materializado pelo grande crescimento económico, e as manifestações dos
trabalhadores, sindicatos e alunos", diz o professor, ex-hippie e agora
estandarte dos valores cristãos. "Para não cair na dinâmica da
conspiração (afirma Sorbi) é preciso entender o grande optimismo
predominante naqueles anos”.
Além da confiança no futuro, é necessário considerar outro aspecto
que determina a proximidade entre a Santa Sé e o mundo da esquerda.
"Todo o movimento socialista daquela época, estava ciente da existência
de uma síntese antropológica entre crentes e não-crentes". É neste
contexto que se desenvolve "a reflexão sobre a paz e o destino do
homem", que tem na figura de Don Giuseppe De Luca, “o sacerdote mais
erudito do século passado" - elemento fundamental na reflexão.
Alguns tentaram instrumentalizar essas tentativas de diálogo "entre
os homens de boa vontade", a ponto de acusar João XXIII de ser um "papa
socialista". Sorbi rejeita este rótulo, porque - explica - “o humanismo
comum entre os dois ‘adversários’ (Roncalli e Togliatti) elimina a
priori o conceito de instrumentalização”. O sociólogo traça o perfil dos
dois líderes "à procura de uma amizade para abrir um mundo de
convergência entre a Igreja e o movimento operário internacional, depois
da impressionante ruptura de 1917".
Convergência que acaba pendendo. A responsabilidade deve ser
encontrada, de acordo com Paolo Sorbi, em ambos os lados. “Dentro da
Igreja do pós- Concílio, referências como Giovanni Montini e Jacques
Maritain são abandonadas, por um extremismo sem propósito”. Tomando o
filósofo alemão Wilhelm Wundt, o professor Sorbi fala de uma
"heterogenese dos fins" dentro da Igreja que saia do Concílio Vaticano
II. Sobre o movimento comunista italiano, no entanto, o professor revela
a incapacidade de "abandonar a relação histórica com a União
Soviética", a casa do ateísmo de Estado.
É possível evocar hoje, com a Guerra Fria para trás, os fios
conectados na década de 60? Para o prof. Sorbi é muito difícil. "A
esquerda italiana e europeia - diz ele - é coberta pelo fenómeno que eu
chamaria niilista radical." Além disso, desvinculado da verdade e de
qualquer relação social, os direitos civis sedimentados pela esquerda
colocam a pessoa em um triste isolamento, no individualismo, e na
negligencia da dissolução. "Se quiser falar com a Igreja e com outras
instituições religiosas, é preciso aceitar a natureza comum que
Togliatti tinha entendido e assumir o compromisso de combater a
emergência antropológica que vivemos hoje", concluiu Paolo Sorbi, o
"marxista- ratzingeriano".
(Trad.MEM)
(25 de Abril de 2014) © Innovative Media Inc.
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