Sem escolta nem cortejo papal
Roma, 14 de Novembro de 2013
Há grande expectativa na Itália a respeito dos temas que
serão abordados pelo papa e pelo presidente do país, incluindo a
imigração e a crise económica.
Que o papa não fosse chegar com pompa ao Quirinale, sede da
presidência da República, era previsível. A visita de Bergoglio àquela
que já foi a residência papal em outros tempos se resume a uma
palavra-chave: sobriedade. O Santo Padre chegou a bordo do Ford Focus
usado comummente, poucos minutos antes das 11 da manhã. A imprensa,
tanto a italiana quanto a internacional, esbanjou atenções à ausência da
escolta e do cortejo papal pelas ruas de Roma e recordou Bento XVI,
que, em visita ao Quirinale em 2008, foi escoltado por uma tropa
uniformizada, que o acompanhou durante a subida da Via IV Novembre.
É superficial esse tipo de comparação, já que não se trata nem de
falta nem de excesso de humildade de um ou de outro. O papa Bento XVI
sempre foi respeitoso do protocolo, inclusive do esperado em visitas de
Estado. Já Bergoglio não gosta de determinados formalismos,
especialmente se envolvem representações de "poder religioso". Como
poderia ser diferente depois de tantos anos de pobreza singela em Buenos
Aires?
Logo ao descer do carro, o papa foi recebido pelo presidente da
República Italiana, Giorgio Napolitano. Após o aperto de mão e uma breve
saudação, os “dois Jorges mais amados pelos italianos”, Bergoglio e
Napolitano, caminharam juntos para uma das varandas do Quirinale, onde
pararam para conversar. A seguir, entraram na sala do presidente para a
conversa em particular.
Nesse meio tempo, ocorria o encontro entre a delegação italiana,
liderada pelo primeiro-ministro Enrico Letta, e a do Vaticano, chefiada
por dom Angelo Becciù, substituto na secretaria de Estado. Além do
prelado, estiveram presentes o arcebispo Dominique Mamberti, secretário
para as Relações com os Estados, o cardeal Giuseppe Bertello, presidente
do governatorato vaticano, o cardeal Angelo Bagnasco, presidente da
Conferência Episcopal Italiana, o cardeal Agostino Vallini, vigário de
Sua santidade para a Diocese de Roma, monsenhor Georg Gaenswein,
prefeito da Casa Pontifícia, dom Adriano Bernardini, núncio apostólico
na Itália, e dom Carlo Alberto Capella, secretário da nunciatura.
A agenda do encontro foi ampla. Depois da reunião privada com
Napolitano, a programação previa os discursos oficiais do papa Francisco
e o encontro com os funcionários do Quirinale e suas famílias, num
momento tipicamente "bergogliano", em que o papa quer cumprimentar as
famílias, os jovens e as crianças. Toda a jornada foi planeada para
transcorrer com simplicidade protocolar, de acordo com as directrizes do
próprio papa durante a organização da visita.
Mas este não é o ponto fundamental. A espera mais ansiosa é pelos
temas "quentes" que o Chefe de Estado e o Chefe da Igreja devem abordar
quanto ao futuro da Itália. Em primeiro lugar, a questão dos
desembarques de imigrantes clandestinos no país, com o decorrente drama
da imigração, o que inclui a situação na ilha de Lampedusa, o fluxo de
refugiados e as ajudas de que eles necessitam. Também entram na lista de
assuntos candentes as violações dos direitos humanos, as desigualdades
sociais, a crise económica e o seu impacto sobre a população, em
especial sobre as famílias. E não pode deixar de ser levado em conta
algum assunto "fora de pauta", que o papa Francisco poderá levantar
espontaneamente, como é de seu costume.
Há muita curiosidade na Itália sobre a "química" entre o presidente
pensativo e introspectivo e o pontífice imprevisível e vivaz. Este
aspecto não é secundário, já que o relacionamento entre ambos os líderes
terá um importante peso político. João Paulo II, por exemplo, mantinha
grande amizade com o ex-presidente Sandro Pertini. Francisco e
Napolitano têm temperamentos totalmente opostos, mas as relações
mantidas até agora, incluindo telefonemas e visitas ao Vaticano, têm
demonstrado um entendimento excelente.
O Santo Padre entregará ao presidente Napolitano, após a reunião
privada, dois bronzes do mestre Guido Veroi. Um representa São Martinho a
cavalo, com armadura romana, em atitude de cortar a própria capa e
doá-la aos pobres. O outro, intitulado "Solidariedade e Paz", representa
um anjo abraçando e aproximando misticamente os dois hemisférios do
globo, superando a oposição de um dragão. A legenda diz: "Um mundo de
solidariedade e de paz fundamentado na justiça".
A Secretaria Geral da Presidência da República Italiana apresentará
ao papa, por sua vez, o códice púrpura mantido no Museu Diocesano de
Arte Sacra de Rossano, actualmente em restauração no Instituto de
Conservação do Património. O códice é um símbolo importante da história
milenar das relações entre o mundo helénico e a região italiana da
Calábria, que, desde os alvores da Europa, acolheu em seu litoral as
populações micénicas vindas da Grécia continental.
in
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