Os 300 pontos da exortação apostólica recopilam os trabalhos do sínodo sobre a nova evangelização para a transmissão da fé, celebrado de 7 a 28 de outubro de 2012
Roma, 26 de Novembro de 2013
“A alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira
daqueles que se encontram com Jesus”. Estas são as palavras com que o
papa Francisco começa a sua primeira exortação apostólica, a “Evangelii
Gaudium” (A alegria do Evangelho).
Nela, o santo padre recolhe os trabalhos do sínodo dedicado à nova
evangelização para a transmissão da fé, celebrado de 7 a 28 de outubro
de 2012, no Vaticano. É um programa de pontificado, já que, ao longo dos
300 pontos da exortação, o pontífice fala da sua visão da Igreja e do
mundo, aprofundando em ideias que ele já anunciou durantes estes oito
meses. Francisco exprime o seu "sonho com uma opção missionária capaz de
transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a
linguagem e toda a estrutura eclesial se transforme num canal adequado
para a evangelização do mundo actual, mais do que para a auto-preservação".
No começo da exortação, o santo padre faz um chamamento a todos os baptizados para levarem aos outros o amor de Jesus "em estado permanente
de missão", com fervor e dinamismo novos. Para realizar essa tarefa,
Francisco convida todos a "recuperar o frescor original do Evangelho",
encontrando "novos caminhos" e "métodos criativos". Ele fala até mesmo
de "uma conversão do papado", para que seja "mais fiel ao sentido que
Jesus Cristo quis lhe dar" e "às necessidades actuais da evangelização".
Sobre as conferências episcopais, ele destaca o seu desejo de que elas
contribuam para que "o efeito colegial" tenha aplicação "concreta",
coisa que ainda "não se realizou plenamente".
Sinal do acolhimento de Deus é “manter os templos de portas abertas
em toda a parte”, para que todo aquele que procura não encontre apenas
“a frieza das portas fechadas”. Nem “as portas dos sacramentos deveriam
se fechar, fosse pela razão que fosse", adverte o santo padre.
Olhando com atenção para os desafios do mundo contemporâneo, o papa
critica o sistema económico actual, definido por ele como “injusto em sua
raiz”. “Essa economia mata” porque predomina “a lei do mais forte”, diz
ele. A cultura actual do “descartável” faz com que “os excluídos não
sejam explorados, mas descartados, como sobras”. Do mesmo modo, ele
denuncia os “ataques à liberdade religiosa” e as novas situações de
perseguição contra os cristãos.
Francisco também fala da importância da família, que "atravessa uma
crise cultural profunda", e insiste na "contribuição indispensável do matrimónio à sociedade".
O papa enumera as “tentações dos agentes pastorais”: individualismo,
crise de identidade, queda do fervor. Exorta os católicos a "serem
sinais de esperança", gerando a "revolução da ternura" para vencer a
"mundanidade espiritual". O papa dedica algumas linhas também aos que
“se sentem superiores aos outros”, por serem “inquebrantavelmente fiéis a
certo estilo católico próprio do passado”, observando ainda que, “em
vez de evangelizar", o que eles fazem é "classificar os outros”. E
também recorda aqueles que se preocupam com um “cuidado ostentoso da
liturgia, da doutrina e do prestígio da Igreja, mas sem se preocuparem
com uma real inserção do Evangelho” no âmbito das necessidades das
pessoas.
Às comunidades eclesiais, ele alerta do perigo de cair em invejas ou
ciúmes “dentro do Povo de Deus e nas diversas comunidades". Sublinha a
necessidade de fazer crescer a responsabilidade dos leigos, mantidos “à
margem das decisões” devido a “um excessivo clericalismo”. Fala ainda do
papel da mulher, afirmando que "é necessário ampliar os espaços para
uma presença feminina mais incisiva na Igreja”. Fala dos jovens, que
devem ter “um protagonismo maior”. Quanto à escassez de vocações em
alguns lugares, o santo padre avisa que “não podemos encher os
seminários com qualquer tipo de motivação”.
Por outro lado, o santo padre quis recordar também que “o
cristianismo não tem um único modo cultural” e que o rosto da Igreja é
“multiforme”. Ele reafirma a "força activamente evangelizadora” da
piedade popular e convida os teólogos a conservarem no coração “a
finalidade evangelizadora da Igreja” e a não se contentarem com “uma
teologia de escrivaninha”.
Sobre a forma de pregar, Francisco ressalta que a homilia “deve ser
breve e não se parecer com uma palestra nem com uma aula”; deve dizer
“palavras que façam arder os corações”, fugindo de “uma pregação
puramente moralista ou doutrinadora”.
O santo padre afirma que "ninguém pode nos exigir relegar a religião à
intimidade secreta das pessoas, sem influência alguma na vida social".
E, na luta pela justiça, recorda que "a opção pelos pobres é uma
categoria teológica", mais do que sociológica. Por isso, indica: "Quero
uma Igreja pobre e para os pobres. Eles têm muito a nos ensinar".
Há espaço também para os mais fracos, de quem devemos cuidar: "Os sem
teto, os dependentes químicos, os refugiados, os povos indígenas, os
idosos cada vez mais sozinhos e abandonados”, os migrantes, as vítimas
do tráfico de pessoas, as mulheres que sofrem situações de exclusão. E,
prestando especial atenção às crianças ainda não nascidas, Francisco
lembra que "não devemos esperar que a Igreja mude a sua postura sobre
este assunto", enfatizando que "não é progressista pretender resolver os
problemas eliminando uma vida humana".
O papa também fala da paz e explica a necessidade de "uma voz
profética" quando se quer construir uma reconciliação falsa, que
“silencia” os mais pobres enquanto “alguns não querem renunciar aos seus
privilégios”. Ele menciona quatro princípios para a construção de uma
sociedade "em paz, justa e fraterna": trabalhar no longo prazo, sem
obcecar-se com resultados imediatos; agir para que os opostos atinjam
uma unidade multiforme que gere nova vida; evitar que a política e a fé
se reduzam à retórica; e unir a globalização e o contexto local.
A evangelização também envolve um caminho de diálogo, que abre a
Igreja para colaborar com todas as realidades políticas, sociais,
religiosas e culturais, recorda o pontífice. Ele ressalta o ecumenismo
como "um caminho inescapável para a evangelização", além da importância
do enriquecimento recíproco. O diálogo inter-religioso "é uma condição
necessária para a paz no mundo". Diante dos episódios de violência, o
papa convida a “evitar odiosas generalizações, porque o verdadeiro islão e
uma adequada interpretação do Alcorão se opõem a toda violência”. Por
outro lado, ele destaca que "o devido respeito às minorias de agnósticos
e de não crentes não deve ser imposto de modo arbitrário, silenciando
as convicções das maiorias crentes ou ignorando a riqueza das tradições
religiosas".
Para encerrar, o santo padre fala dos "evangelizadores com Espírito".
São eles que se "abrem sem temor à acção do Espírito Santo”, que
“infunde a força para anunciar a novidade do Evangelho com audácia (parresia),
em voz alta e em todo tempo e lugar, inclusive contra a corrente”. São
evangelizadores que oram e trabalham, conscientes de que a missão é uma
paixão por Jesus e pelo seu povo. E recorda aos fiéis: "Se eu consigo
ajudar uma única pessoa a viver melhor, isso já justifica a entrega da
minha vida”. O papa finaliza com uma oração especial a Maria, "Mãe do
Evangelho", "para que, toda vez que contemplamos Maria, voltemos a crer
no poder revolucionário da ternura e do carinho".
in
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