Entrevista com o padre palotino Frank Donio, director do Centro do Apostolado Católico em Washington
Roma, 08 de Novembro de 2013
Está prestes a terminar o Ano da Fé, que foi convocado pelo
papa emérito Bento XVI e que será encerrado pelo papa Francisco, no
Vaticano. Ao longo deste ano, o assunto “fé” foi iluminado diante de um
mundo que se aventurou a viver sem absolutos e ao sabor dos mercados económicos, sempre excludentes.
A Igreja sai fortalecida desta celebração: uma encíclica sobre a
fé, encontros e cerimónias de reafirmação para os crentes, novos santos e
beatos evangelizadores e a expectativa de um novo Sínodo dos Bispos em
2014, focado no tema urgente da família.
De um lado ao outro do planeta, católicos incrementaram os seus esforços missionários ad intra e ad extra.
A resposta dos fiéis foi generosa e entusiasta, como a de “leões
adormecidos” que despertam, e servirá para elaborar uma estratégia
melhor para os tempos actuais.
Uma dessas instituições é o Centro do Apostolado Católico (Catholic Apostolate Center), de Washington, capital dos Estados Unidos, uma obra da província da Imaculada Conceição, dos religiosos palotinos.
ZENIT conversou com o padre Frank S. Donio, SAC, director do centro,
que conhece bem o que significa achar novos caminhos para a
evangelização, mesmo numa sociedade tão competitiva e técnica como é a
norte-americana.
Estamos perto do final do Ano da Fé. O que permanecerá nos crentes depois desta experiência mundial?
--Padre Donio: O Ano da Fé foi uma oportunidade espiritual para reflectirmos sobre a nossa relação pessoal com Jesus Cristo e para darmos
testemunho da fé e da caridade. A minha esperança é que esta mensagem
tenha se enraizado na vida dos crentes e dê os seus frutos numa
renovação maior, não só da Igreja, mas do mundo.
Este ano foi rico em actividades e encontros dos diversos sectores. Onde é que a Igreja tem que insistir mais para o aprofundamento
da fé?
--Padre Donio: No testemunho pessoal da fé, tanto nas palavras quanto
nos actos da vida quotidiana. As actividades e encontros nos ajudam a
crescer na fé, mas o testemunho pessoal é capaz de transformar a vida
dos crentes, da Igreja e do mundo. Conhecer a fé através da catequese
não é suficiente; viver a fé na vida quotidiana, fora dos edifícios das
igrejas, é que é fundamental.
Estatísticas recentes da Propaganda Fide mostram
que a Igreja tem uma grande obra missionária e de acção social e de
caridade no mundo. Em que áreas geográficas a força e a presença da
Igreja precisariam ser mais reforçadas?
--Padre Donio: Como todos sabem, a Igreja está crescendo no
hemisfério sul a um ritmo excepcional numa série de lugares, mas, ao
mesmo tempo, está diminuindo no norte. A nossa solidariedade com os
outros, como Igreja global, pode beneficiar a todos se nós estivermos
dispostos a ir além do nacionalismo e dos preconceitos. Uma colaboração
mais estreita com os outros no serviço à fé e às necessidades sociais e
de caridade pode ser um remédio para a escassez em qualquer área.
É um envio permanente, não é isso?
--Padre Donio: Eu, pessoalmente, tenho visto o benefício desse tipo
de colaboração na minha própria comunidade religiosa, os palotinos, e na
associação da qual nós fazemos parte, a União do Apostolado Católico.
Estamos em mais de cinquenta países e, quando trabalhamos bem em
parceria, as necessidades da fé e da caridade são atendidas mais
plenamente. E outras são reforçadas, e novas oportunidades vão se
desenvolvendo. Esse tipo de colaboração gera esperança.
Hoje nós vivemos numa sociedade laica. O mundo se move ao
ritmo das teorias económicas. Como apresentar o evangelho aos homens e
mulheres desse tempo?
--Padre Donio: O testemunho dos crentes que é autêntico, caridoso,
aberto, hospitaleiro, acolhedor e comunitário é uma resposta para quem
acha que a sociedade laica é individualista. As pessoas são usadas e
descartadas. Só tem lugar quem é útil. Muitos adultos jovens, com quem
eu trabalho na pastoral, enxergam a mentira desse pensamento. Eles lutam
para encontrar trabalho, têm dívidas e estão herdando os problemas económicos provocados pelas gerações anteriores. A Igreja oferece uma
comunidade de crentes que, no melhor dos casos, se preocupa com os
outros e ajuda a todos a levar uma vida virtuosa, com valores e com uma
meta que é eterna, não passageira.
Neste ano foi lançada a encíclica Lumen fidei. Qual é a novidade doutrinal deste documento?
--Padre Donio: Não é algo novo, mas renovado. A Lumen fidei é
nova porque foi escrita pelo santo padre Francisco e pelo papa emérito
Bento XVI. Ela oferece uma exposição clara da fé e de como vivê-la num
mundo que precisa da luz de Jesus Cristo.
Durante o Ano da Fé, a Igreja viveu a mudança de papa. Como você vê os primeiros sete meses do papa Francisco?
-Padre Donio: O papa Francisco já conseguiu, com o testemunho dele,
mudar a narração comum e laica sobre a Igreja nos últimos anos:
escândalo, discórdia, etc. No lugar disso, com uma fé que é vivida na
caridade, ele nos mostra como dar testemunho da esperança no mundo.
Todos nós estamos ainda aprendendo sobre ele, mas o testemunho dele é
claro e desafia a todos a reflectir mais sobre como nós vivemos aquilo em
que dizemos acreditar. Com o tempo, vamos poder saber mais, mas eu vi
nele um profundo exemplo de fé que me fez examinar profundamente a minha
forma de viver como religioso e como presbítero.
Na mesma reflexão, qual foi o principal legado deixado pelo papa Bento XVI?
-Padre Donio: Tudo o que o papa Bento fez pela Igreja vai ser
compreendido e apreciado mais plenamente com o tempo, como é o caso de
qualquer legado. O papa Francisco nos oferece um exemplo quando convida o
papa Bento XVI a continuar sendo um presente, não um passado, como uma
testemunha. Podemos aprender a ler o que Bento XVI escreveu e valorizar a
bênção que é tê-lo ainda connosco.
O papa Francisco está dirigindo a Igreja com gestos humildes e
pautas simples, mas há quem o critique por deixar o papado “simples
demais”. Isso é real?
-Padre Donio: Os críticos vão existir sempre, não importa quem seja o
papa. Alguns criticaram o papa Bento XVI por causa da renúncia, dizendo
que ele diminuiu o papado. Eu prefiro me concentrar no fruto do
testemunho dos dois, e esse testemunho se chama humildade. Renunciar ao
papado, como o papa Bento XVI renunciou, não foi um ato de uma pessoa
egoísta. E viver do jeito que o papa Francisco vive também não é um ato
de uma pessoa egoísta. São actos de homens de grande oração, que focam em
Cristo, não neles mesmos. Num mundo que está apaixonado pela
celebridade, a verdadeira humildade é aquela que foca no bem do outro,
na verdadeira caridade. Diante disso, nós temos que fazer uma pausa e
avaliar a nossa própria vida.
Também há quem critique porque o papa insiste em dizer que o
trabalho da Igreja tem que ficar centrado na mensagem de Cristo, e não
se obcecar com questões de moral sexual, por exemplo.
-Padre Donio: Jesus Cristo não é um quê, mas um quem. Nós podemos ter
uma relação pessoal com ele. Ele não está longe de nós, ele é nosso
irmão que nos leva à salvação. Todos os nossos ensinamentos morais se
baseiam nesta relação, mas não são o ponto de partida da fé. O ponto de
partida é a relação com Jesus Cristo. O baptizado continua a missão de
Cristo, ele trabalha através de nós, e ajuda os outros a experimentar a
vida nele. Somos enviados, como discípulos missionários, como apóstolos,
para ser testemunhas no mundo. O nosso testemunho é de palavra e de
obra, que inclui a vida moral, vivendo o amor de Deus e do próximo. Os
missionários não vivem vidas compartimentadas. A fé e a caridade vivem
juntas, não é uma ou outra.
Parece novidade, mas não é, certo?
- Padre Donio: Nada disso é uma mensagem nova. O que parece novo é
que alguns estão escutando isto pela primeira vez, possivelmente porque a
linguagem utilizada é singela e directa.
Como vocês viveram o Ano da Fé no Centro do Apostolado
Católico e na província da Imaculada Conceição dos palotinos nos Estados
Unidos? Quais foram as linhas principais que surgiram desta experiência
para o trabalho futuro?
-Padre Donio: O Centro do Apostolado Católico se desenvolveu
enormemente durante o Ano da Fé. Oferecemos oportunidades às pessoas
para crescer na fé e na caridade. Isso através dos nossos muitos
recursos online, além dos programas e actividades que nós fazemos em
parceria com a conferência episcopal, com as arquidioceses e dioceses,
com as instituições educativas e diversas organizações internacionais e
nacionais. Nós oferecemos também um espaço em Washington para as nossas
organizações, afiliadas ou não, fazerem uma renovação espiritual e de
parceria. Esperamos continuar ampliando a colaboração do centro fora da
América do Norte e estamos examinando formas concretas para isso.
E os planos de expansão?
-Padre Donio: Como província, nós começamos um trabalho missionário
numa região remota do Peru, que amplia a presença dos palotinos na
América do Sul. Esses esforços durante o Ano da Fé e o nosso ano jubilar
pelo quinquagésimo aniversário da canonização de São Vicente Pallotti
(22 de Janeiro de 2013), nos trouxe grandes oportunidades para actualizar
a obra da nova evangelização.
in
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