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sexta-feira, 15 de agosto de 2025

Amnistia Internacional pede “medidas imediatas” para “pôr fim a quatro anos de impunidade” dos Talibãs

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Uma mulher e o seu filho caminham por um campo de deslocados no Afeganistão. Foto © Ocha/Christophe Verhellen

Afeganistão

 | 15/08/2025

Julgamentos arbitrários, injustos e fechados; emissão de veredictos religiosos com base na interpretação pessoal de textos religiosos; punições como açoites públicos e outras formas de tortura e maus-tratos. Há quatro anos que é assim no Afeganistão, desde que os Talibãs assumiram o poder em agosto de 2021, e a Amnistia Internacional (AI) quer “medidas imediatas” da comunidade internacional para “exigir o restabelecimento de um sistema jurídico formal, a proteção dos direitos humanos e o Estado de direito” no país.

“O quadro jurídico do Afeganistão foi totalmente desmantelado e substituído por um sistema de base religiosa moldado pela interpretação estrita da lei islâmica Sharia”, denuncia a organização de defesa dos direitos humanos num comunicado enviado às redações nesta sexta-feira, 15 de agosto. “Após quatro anos de governo talibã, o que resta é uma ordem jurídica profundamente opaca e coerciva, que prioriza a obediência sobre os direitos e o silêncio sobre a verdade”, afirma Samira Hamidi, ativista regional da Amnistia Internacional para o Sul da Ásia, citada no comunicado. “O sistema judicial dos Talibãs está a causar flagrantes injustiças. O sistema judicial não só se afastou dos padrões internacionais de direitos humanos, como também reverteu quase duas décadas de progresso”, acrescenta.

Afastadas foram particularmente as mulheres, denuncia a AI. Antes da tomada do poder pelos Talibãs, estas exerciam ativamente funções de juízas, procuradoras e advogadas, representando entre 8% e 10% do poder judiciário, e quase 1.500 mulheres estavam registadas como advogadas e defensoras legais na Ordem dos Advogados Independentes do Afeganistão (AIBA), compreendendo cerca de um quarto do total de seus membros, refere o comunicado. Mas “a maioria foi forçada a esconder-se ou a exilar-se após serem demitidas dos seus cargos depois da tomada do poder pelos Talibãs”.

Além disso, instituições que antes serviam para proteger os direitos das mulheres, como tribunais de família, unidades de justiça juvenil e unidades de violência contra as mulheres, foram desmanteladas, “deixando as mulheres quase sem acesso à justiça e a recursos eficazes”.

 

“Todos vivemos com medo”

UniceMohammad Haya Burhan Uma menina de treze anos estuda em casa em Cabul

Uma menina de treze anos estuda em casa em Cabul. Foto © Unicef/Mohammad Haya Burhan

Uma ex-juíza, que atuou num tribunal de família em Cabul e agora está no exílio, disse à Amnistia Internacional: “Não há independência judicial, não há procedimentos judiciais justos e não há acesso a advogados de defesa. Tínhamos construído um sistema jurídico com regras e, da noite para o dia, [os Talibãs] transformaram-no em algo assustador e imprevisível”.

Sob o regime talibã, acrescenta ainda o comunicado da AI, “os processos judiciais são frequentemente realizados em segredo. Não existe um sistema de supervisão pública e as decisões judiciais não são documentadas nem explicadas. As pessoas são detidas sem mandado, presas sem julgamento e, em alguns casos, simplesmente desaparecem à força”.

Várias testemunhas ouvidas pela organização recordaram ter visto jovens chicoteados em público por ouvirem música ou mulheres detidas por não estarem totalmente cobertas. Estes espetáculos não são apenas punições; são instrumentos de medo e controlo. Um ex-procurador afirmou: “Todos vivemos com medo de nos tornarmos o próximo exemplo”.

A Amnistia Internacional defende assim que “os Talibãs devem reverter imediatamente os seus decretos draconianos, acabar com as punições corporais e respeitar os direitos humanos de todas as pessoas no país. E os Talibãs também devem respeitar, proteger e defender ativamente, e de forma eficaz, a independência judicial e o Estado de direito, incluindo através da reforma do sistema judicial e da garantia de que juízes, advogados, procuradores e outros especialistas jurídicos possam prestar serviços à população afegã, em conformidade com as obrigações internacionais do país em matéria de direitos humanos”.

E apela veementemente à comunidade internacional para que tome medidas, através de pressão diplomática e também de um envolvimento baseado em princípios com as autoridades de facto dos Talibãs.




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