Encontrei-me inadvertidamente a
pronunciar a frase “é preciso semear para colher”, ou seja, nada se faz sem o
nosso empenho, esforço e dedicação. Há alguns dias convidaram-me para ir a uma
praia situada na zona da Costa da Caparica. A minha primeira ideia foi declinar
o convite face a toda uma série de preconceitos existentes. Lembrava-me bem das
enormes filas na Ponte 25 de Abril. Depois a dificuldade em estacionar. E ainda
a falta de estruturas. Mas queria muito usufruir da companhia da minha neta que
ansiosamente dizia: “Vem vovó, vamos brincar, nadar, jogar, vai ser muito bom”.
Acho que a minha neta julga que tenho a sua idade e quer a minha companhia.
Pensei interiormente que o melhor mesmo era fazer um esforço em prol do
bem-estar da minha neta e para fomentar relações, laços, memórias… Acabaria
mesmo por anuir. Tenho de reconhecer que não foi tão mau conforme tinha
ajuizado. Constitui mesmo uma agradável surpresa. Uma vista maravilhosa da
ponte. O trânsito não estava assim tão complicado. Optámos pela Praia Morena em
que não havia qualquer problema em estacionar o carro. Há muitos anos que não
vinha para esta zona, sendo que as memórias e as referências não eram as
melhores. Mas depois viria a constituir uma agradável surpresa. O acesso à
praia era feito em boas condições. Havia igualmente uma bar/restaurante com bom
aspeto com uma vista sobre o mar fabulosa. Um areal extenso, convidativo para
uma boa caminhada e, muito importante, era uma zona vigiada. A areia branca e fina.
Ao vazar a maré, ficaram a descoberto várias zonas que formavam pequenos lagos
que a minha neta muito apreciou, pois formavam piscinas naturais onde mergulhou
sem receio. A água era de um azul transparente, com pequenas ondas nesse dia,
ainda que um pouco fria. Perante esta maravilha que observava, recordei S.
Francisco de Assis que referiu: “Louvado sejas, ó meu Senhor, pela irmã Água,
que é tão útil e humilde, preciosa e casta”.
Segundo o nadador-salvador a quem
perguntei qual a temperatura da água, ficámos a saber que devia rondar os 17
graus. A bandeira era de cor amarela. Questionei o porquê deste facto, tendo
referido que era precisamente pela existência de fundões, correntes e remoinhos,
pelo que todo o cuidado era pouco. Na verdade, é uma praia muito agradável, mas
em que se torna necessário estar bem atentos aos sinais que o mar nos
transmite. O meu filho comentou que há todo um histórico de acidentes, alguns
deles fatais, devido à falta de cuidado, ou ao desconhecimento da sua perigosidade.
Bem ciente da responsabilidade face à informação que nos foi transmitida,
acompanhei sempre de perto a minha neta, ou, em alternativa, os seus pais. Com
o mar, todo o cuidado é pouco! Na realidade foi uma manhã excelente. Fiz as pazes
com esta zona. Depois chegou o momento de uma caminhada.
Recordei a Carta Encíclica do
Papa Francisco Laudato Si’ que dá
enfase ao facto de as pessoas, enquanto seres humanos, se devem sentir movidas
a cuidar do ambiente do qual fazem parte: “Se tivermos presente a complexidade
da crise ecológica e as suas múltiplas causas, devemos reconhecer que as
soluções não podem vir de uma única maneira de interpretar e transformar a
realidade… Se quisermos construir uma ecologia que nos permita reparar tudo o
que temos destruído, então nenhum ramo das ciências e nenhuma forma de
sabedoria pode ser descurada”. O ponto 108 salienta: “O homem precisa de ser
novamente educado para se maravilhar, reconhecendo a verdadeira beleza das
coisas criadas”.
Pois é, na realidade, quando era pequena,
apanhava imenso berbigão e ameijoas, na companhia dos meus irmãos e da avó
Isabel que muito atenta nos vigiava. Foram bons tempos, esses, que passamos na
sua companhia. Ficam as memórias. Também a esperança de que o molusco bivalve
possa voltar a aparecer em quantidade graças à colaboração de todos. Parece que
tudo é cíclico, que tem uma continuidade através das gerações. Agora sou eu que
acompanho a minha neta.
Feitas as pazes com a zona, regressámos
a Lisboa na companhia de uma neta feliz, afirmando encantada com um brilho nos
olhos, antes de adormecer no carro face ao seu estado de cansaço, querer
futuramente vir a ser profissional de
surf... No dia seguinte, graças à insistência da minha neta, repetimos o mesmo
passeio à praia, em detrimento de uma visita a um museu, já que esta se poderá
fazer em qualquer altura do ano. Na verdade, importa mesmo ‘alimentar’ as
relações humanas, para que mais tarde se possam colher os frutos.
Maria Helena Paes |
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