O sentimento dominante, na Síria, é a alegria pela libertação de um dos mais sanguinários regimes, como foi, durante largas décadas o do clã Al Assad, ainda que as feridas e traumas nas famílias, nas comunidades locais e nas diferentes etnias se encontrem ainda por curar. Entretanto, as novas autoridades têm multiplicado os sinais de pretenderem contar com todos os setores e, em particular, com as diferentes confissões religiosas, para reconstruir o país.
O que se passa no terreno mostra, entretanto, que há ainda muito caminho a fazer. Nos últimos dias tropas idas de Damasco para neutralizar numa localidade da zona costeira um alegado homem forte do regime derrotado, alegado responsável por centenas de mortes, foram apanhadas numa emboscada, tendo perdido a vida 14 combatentes.
Outro ponto crítico continua a ser o povo curdo e as suas forças armadas, já que é acossado quer pela Turquia quer pelo Exército Nacional Sírio que lidera agora o poder em Damasco e que conta também com apoio turco.
Do ponto de vista religioso, os cristãos representam uma minoria relevante. Nesta quadra natalícia muitas comunidades puderam celebrar o nascimento de Jesus em liberdade e mesmo com visibilidade pública, nomeadamente em localidades onde os cristãos têm alguma expressão numérica.
Foi precisamente numa dessas comunidades, na localidade de Suqaylabiyah, perto de Hama, que um grupo de indivíduos de rosto tapado irrompeu no local onde estavam instaladas iluminações alusivas à quadra, tendo incendiado a árvore de Natal.
A comunidade não perdeu tempo a usar da liberdade apregoada pelo novo governo para organizar uma manifestação com milhares de pessoas na própria cidade de Damasco, com o objetivo de denunciar o sucedido. Responsáveis governamentais não apenas se demarcaram dos comportamentos de destruição, como pediram desculpa, restauraram a árvore e anunciaram investigações sobre o caso. O primeiro ministro sírio em exercício foi mais longe, anunciando que doravante os dias 25 e 26 de dezembro passarão a ser considerados “festivos” em todo o país, por causa do Natal cristão.
Perante estes desenvolvimentos, houve quem visse nesta destruição da árvore de natal “paradoxalmente uma bênção”, porquanto terá sido a primeira vez que os cristãos se “manifestaram na praça, sem terem sido reprimidos com violência, por reivindicarem respeito, direitos e liberdade religiosa”.
Quem o afirma é o administrador apostólico de Alepo, Hanna Jallouf, um franciscano da Custódia da Terra Santa, que é o pastor dos católicos de rito latino de toda a Síria, citado pela publicação Alfa Y Omega.
“Talvez comecemos a saborear a liberdade de pensamento.”, acrescentou aquele responsável que observou ainda: “Ser livre para proclamar as ideias próprias pode ser mais uma razão para a esperança no futuro por parte dos cidadãos sírios de fé cristã”.
O gesto dos responsáveis políticos tinha antecedentes: logo depois da queda de Bashar Al Assad, a coligação armada vitoriosa “contactou de imediato representantes das igrejas cristãs presentes na Síria para tranquilizá-los sobre o respeito pelos direitos das minorias e seu envolvimento na elaboração da nova Constituição”.
O sinal mais recente da vontade de diálogo foi dado nesta terça-feira, 24, véspera de Natal: um encontro entre a nova administração da Síria e o patriarca ortodoxo grego de Antioquia, João X, na residência deste, em Damasco. Entre os assuntos debatidos, alguns coincidentes com a reunião do início do mês com outras confissões cristãs, destacam-se, segundo a agência de informação SIR, “o estatuto dos cristãos como cidadãos plenos da Síria; o conceito de minoria e maioria; o gozo dos direitos, liberdades e deveres; o papel que podem desempenhar na construção do futuro da Síria em colaboração com todas as diferentes componentes da sociedade síria, incluindo a participação na elaboração de uma nova constituição democrática para o país que garanta a consolidação dos valores da liberdade, justiça e igualdade “.
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