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quarta-feira, 4 de novembro de 2020

I - O Homem, um ser chamado a algo mais!

O Homem, um ser destinado a viver com os outros, portador duma capacidade superior que lhe foi atribuída, insere-se no seio de cada sociedade, recorrendo a um conjunto de valores inerentes a si mesmo, os quais especificam e diferenciam a sua espécie, levando-o a distinguir o que é bom do que é mau, aquilo que é melhor do que é pior, o que pode ou não pode ser feito.

Na imensa riqueza da sua natureza humana e divina, própria de um ser espiritual, está também integrada a Liberdade para conhecer, poder decidir e escolher.

A lei natural de conduta é intrínseca ao Homem, enquanto ser racional e livre, é património de todas as culturas. Já a encontramos nas civilizações ancestrais, como normas a aplicar, em Sófocles na obra Antígona – a heroína da lei natural – e no direito Romano, nomeadamente com o filósofo e jurista Cícero. (séc. I a C.)

Isto significa dizer que os valores morais são uma espécie de “código de conduta”, indicando a cada indivíduo como deve agir no interior da sociedade para se integrar, adequar e progredir no sentido de um maior equilíbrio, protecção de todos os seus membros e enriquecimento comum.

No séc. IV a. C., acreditava-se que o homem só conhecia a partir dos sentidos. Aqui encontramos Tales, Anaximandro, Heraclito, Parménides, entre outros. Foi o princípio da Ciência, procuraram a Origem do Universo, mas conclusões diferentes e opostas, conduziram ao cepticismo da existência duma verdade absoluta. “O homem é a medida de todas as coisas”. Porém, em Atenas, Cidade-Estado da Grécia antiga, surge Sócrates, o primeiro pensador a reflectir acerca de assuntos estritamente humanos. “Conhece-te a ti mesmo”, uma frase inscrita no Oráculo de Delfos, e por ele tomada como ponto fulcral do seu pensamento. A verdade existe, mas está dentro do próprio Homem.

Platão, seu discípulo, continuou o tema, mas defendeu que os valores são conceitos racionais, eternos e imutáveis. Os nossos sentidos são capazes de nos enganar, por isso, devemos procurar uma outra origem da verdade. Para este filósofo é na Alma que reside tal capacidade, oriunda do “Mundo Inteligível”, contém todo o conhecimento verdadeiro, provém do raciocínio e possui uma identidade atemporal e indestrutível.

O homem deve buscar ascender do mundo sensível ao inteligível, para ter um real conhecimento dos seres. Deve abandonar as pré-concepções e os pré-juízos lançando-se rumo às Ideias, as quais, segundo Platão, são um princípio inteligível, que não sofre transformação nem corrupção. As Ideias são puramente espirituais, não contêm materialidade alguma, nem contacto com o mundo sensível, já nascemos com elas gravadas na nossa Alma, daí permitirem-nos um conhecimento puro e seguro.

Segue-se-lhe Aristóteles, para quem “O homem é, por natureza, um animal racional e político”. Quer dizer, um ser pensante, capaz duma comunicação aprimorada com os outros homens, através da fala, na Pólis grega. A Política e a Ética, são dois dos grandes temas que desenvolveu, organizando-os num sistema que permite diferenciar a importância da sua conduta, agindo em sequência. A coragem, os valores e as virtudes foram as suas ferramentas, para que o Homem pudesse ascender e melhorar as suas acções e comportamentos em prol do bem e da justiça na sociedade. A Alma é por excelência o elemento espiritual responsável pela unidade e forma, ela é o elemento que une e dá vida à matéria, sem Ela o Homem fica inanimado, deixa de ser ou de existir.

Os séculos rodaram, a civilização grega decaiu, a romana aproximou-se, carente de ética e de estética, mas conseguiu interiorizar os bons hábitos daquele povo conquistado.

Porém, na Palestina, dá-se um acontecimento, uma Estrela surgiu portadora duma nova mensagem salvífica, um Deus feito Homem, veio ao mundo para nos salvar e redimir. Perseguida nos primeiros tempos, cedo começou a atrair os povos de todo o Império, a decadência moral acentuava-se e Cristo foi portador duma nova mensagem de Esperança e de Vida Eterna. Volvidos uns escassos três séculos o Imperador Constantino, em 313, pelo Édito de Milão, torna possível a liberdade de culto para o cristianismo.

Vêm e vão bárbaros, sucedem-se invasões, caem Impérios, mas no Ocidente, a Europa vai formando os seus reinos, delineando as suas fronteiras, os seus limites, formando-se numa identidade que não é só geográfica ou económica, mas essencialmente cultural, espiritual e religiosa.

A matemática, o pensamento, as artes e a música foram um depósito de conhecimento e de beleza para a humanidade, identidade e cultura da Europa. As grandes ideias e ideais humanistas aliadas à Teologia, fizeram a nobreza do espírito do Homem, que se sente chamado a ser algo mais do que um animal, graças ao cultivo da Alma Espiritual, ao seu aperfeiçoamento como Pessoa, dignidade que lhe assiste como dádiva do Criador.

Herança tripla de Atenas, Roma e Jerusalém, não obstante sermos um “mamífero perigoso”, acresce-nos a superioridade que nos habita, assiste e permite conduzir-nos à superação, ao aperfeiçoamento e à Transcendência.

Maria Susana Mexia



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