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sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Paternidades

Sim, existem vários tipos de paternidade: a própria dos pais, a própria de professores e formadores, a própria das pessoas responsáveis que vão deixando o “perfume” da verdade e do bem fazer por onde passam, e a própria dos sacerdotes.

Que será que caracteriza a paternidade? Em primeiro lugar, sem dúvida, é o amor; amor esse que leva os pais a cuidar dos filhos, a protegê-los do mal, a ensinar-lhes a verdade, mas também a exigir-lhes no cumprimento dos deveres à medida que os vão incumbindo de maiores responsabilidades.

Porém, o exercício destas paternidades tem campos diferentes. Aos pais compete a dádiva da vida, papel único e intransmissível, assim como a continuidade da história, tradições e valores familiares, dentro da verdade e do bem. Dos professores e formadores espera-se que ensinem com clareza e verdade as matérias de sua especialidade, mas também que, além da ciência, a acompanhem de sabedoria. Os médicos, por exemplo, devem demonstrar humanidade no cuidado dos doentes, não basta a sua ciência; os empresários, além de procurarem ser bons empreendedores, devem aprender a ser justos: pontuais no pagamento dos ordenados e humanos ao atender a necessidade de descanso dos seus empregados. As pessoas responsáveis, e todos o somos quando nos dispomos a isso, vivem a sua paternidade ajudando os outros; para tal basta seguir o “manual” das bem-aventuranças. Quanto aos sacerdotes... comecemos por alguns factos concretos.

A sua paternidade é, sobretudo espiritual e de bom exemplo. Fica-se chocado com notícias de sacerdotes que não são fiéis à sua vocação. Espera-se deles que, à imagem de Cristo, sejam santos. Nada menos. Foi essa a notícia que nos chegou do México: morreram oitenta sacerdotes, dos quais mais de metade eram jovens, vítimas de covid-19. Quer isto dizer que todos eles estavam tão bem formados e cheios de caridade que foram capazes de sacrificar a sua comodidade para consolar os seus paroquianos, levando-lhes os sacramentos.

A outra notícia, mais pormenorizada, vem do “ABC”, um jornal espanhol. Fala-nos de Joaquin Cabanyes, sacerdote espanhol do Opus Dei  ordenado pelo Papa João Paulo II. Joaquin licenciou-se em Ciências Químicas na Universidade Autónoma de Madrid, e doutorou-se em Filosofia Eclesiástica pela Universidade de Santa Cruz, em Roma. Começou por exercer o sacerdócio em Espanha, mas considerou o seu país como privilegiado em comparação com outras zonas do mundo onde a sua presença poderia ser mais benéfica. Assim, em 1987, foi para a Nigéria. O seu esforço deu inúmeros frutos: abriu igrejas, residências de estudantes e centros de formação em Uhere, Hillpoint, Uzomiri, Ezindi, Ugwuoma, Eunugu e Lantana, embora no meio de inúmeras dificuldades e, por vezes, doente de malária. Em Madrid, a sua simpatia tinha conseguido alguns apoios e dádivas. Uma sua amiga, Lúcia, organizava torneios de bridge e enviava o dinheiro que conseguia para as iniciativas do Padre Quino. Este repetia o milagre da “multiplicação dos pães”: com importâncias que mal chegariam para levantar um quiosque em Espanha ele construía igrejas e colégios. A amizade com seu o primo, o Pe. Alfonso Cárdernas, levou-o a destinar muitas das ajudas que recebia para a Fundação Cárdenas Rosales.

O Padre Quino poderia ter usufruído de muitos bens materiais se tivesse sido diretor, ou quadro, de uma multinacional química. Também poderia ter usado o título de marquês de Loreto, mas cedeu-o ao seu irmão Luís.

Este sacerdote morreu no dia 13 de julho de 2020, uns dias depois de saber que tinha coronavírus. Foi o seu cunhado, duque de Maura, o autor desta notícia necrológica do jornal “ABC”, de 19 de julho de 2020, da qual retirei estes apontamentos. Este senhor comentou ainda: “Quino foi uma amostra exemplar de tantos sacerdotes e religiosos que dedicam a sua vida a fazer o bem e a ajudar aqueles que mais necessitam, sem a mínima ambição. São os que nunca aparecem nas notícias; por isso creio que merece este obituário no ABC”. No final acrescentou: “Para mim, foi muito bom cunhado, o mais parecido que vi àquilo que supomos ser um santo”.

Não será esta a mais bela forma de paternidade?

Isabel Vasco Costa


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