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terça-feira, 20 de novembro de 2018

A Folha Seca

Caminhava pelo jardim num dia frio e chuvoso de outono imbuída de pensamentos sobre as injustiças que se cometem hoje em dia, sobre as diferentes guerras existentes, sobre os refugiados, sobre os grupos mais vulneráveis que não têm voz nem podem exercer os seus direitos. O mundo às vezes parece que não observa convenientemente o que se passa ao seu redor. Uns exercem greve para reivindicar os seus direitos, os aumentos salariais, progressão na carreira, melhores condições de trabalho e de vida. Não questiono de modo algum as suas razões. É justo querer evoluir, poder melhorar o poder de compra, fazer face aos compromissos adquiridos.

Mas, sim, questiono a condição dos que não têm voz, dos que, por se encontrarem desempregados, com condições de vida precária, excluídos, marginalizados, com problemas de saúde, talvez em piores condições, não terem um sindicato que vele pela defesa da melhoria das suas condições de vida, por um melhor acesso ao sistema nacional de saúde, pela educação, por uma habitação condigna, pelo direito ao trabalho, enfim pela defesa dos direitos humanos. Sinto-me, de algum modo, tão impotente como a folha seca abandonada ao seu destino talvez aguardando uma rajada de vento que a possa levar ou um jardineiro que a coloque no lixo. Disse lixo? Onde se encontra a dignidade do ser humano? Hum… O que será que diz a Declaração Universal dos Direitos do Homem pela qual nos regemos todos, ou não, quem sabe? Afinal, quem é responsável pela sua implementação? Em abono da verdade diga-se de passagem que não sei. Julgava que era o governo e que por uma questão de solidariedade, eramos todos nós, que nos encontramos tão submersos com tanta agitação ao nosso redor que nos distraímos um pouco dos problemas reais. Lá diz o ditado: “Muita parra, pouca uva”. Ou será uma fuga às reais necessidades de quem carece de apoio? Ou ainda será o deus dinheiro que comanda a vida? Chove agora recordando um pouco as lágrimas de quem sofre. Ao meu pensamento veio o artigo 25º da referida Declaração: “Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda aos serviços sociais necessários…à segurança, no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade”. Afinal, não tenho com que me preocupar, os direitos encontram-se todos consagrados! Andei mais um pouco. Um senhor veio ter comigo. Não tinha ar de pedinte, mas no entanto veio-me confidenciar que tinha a mulher muito doente, que se encontrava desempregado, que já não tinha direito ao subsídio de desemprego. O que agora auferia dos serviços sociais era manifestamente insuficiente para fazer face aos problemas com os quais se confrontava. Também face à sua idade não conseguia um trabalho decente, acrescentando que também tinha de apoiar a sua mulher doente em fase terminal. Meu Deus, há pessoas com vidas muito complicadas. Bem, seja como for, teve o condão de me fazer aperceber da necessidade de continuarmos a lutar em prol da defesa das pessoas com diferentes necessidades, com origem nas múltiplas situações já mencionadas. S. Josemaria no ponto 826 Caminho referiu: “Tudo aquilo em que intervimos é um tecido de pequenas coisas, que conforme a intenção com que se fazem podem formar uma tapeçaria esplêndida de heroísmo ou de baixeza”.

O sol, entretanto, surgiu um pouco envergonhado. Resolvi regressar ao banco do jardim para ver se a folha seca que parecia uma estrela ainda se encontrava aí. Ainda estava, agora linda, brilhante, dourada, graças aos raios de sol que surgiam entre as nuvens. Tinha ganho vida. Parecia recordar a estrela de Natal, indicando o local onde se encontrava o Menino Jesus no regaço de sua Mãe. Recordo as palavras de S. Paulo: “Que o Deus da esperança vos encha plenamente de alegria e de paz para que transbordeis de esperança”.

Termino este artigo com a esperança de que sejamos semeadores de paz e de alegria em prol da defesa dos direitos humanos de quem mais carece, nas inúmeras situações com as quais nos confrontamos hoje em dia. Se todos dermos o nosso contributo solidário, um dia existirão menos excluídos na sociedade.

Maria Helena Paes



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