1. Conflitos e reconciliação
Nas últimas semanas escrevi algumas notas sobre os princípios fundamentais da doutrina social da Igreja, um precioso património para aplicar a justiça na convivência pacífica dos povos e na coesão social das democracias. Tratando-se de vários princípios, estão todos orientados para a realização da dignidade da pessoa humana, na sua singularidade e nas múltiplas relações em que está inserida. Apesar de tudo, mesmo aceitando esses princípios, nem sempre se está de acordo na sua aplicação. Daí surgem divergências, por vezes violentas, e o recurso a árbitros e tribunais, cujas sentenças podem divergir e deixar insatisfeitas as partes em oposição.
Nas últimas semanas escrevi algumas notas sobre os princípios fundamentais da doutrina social da Igreja, um precioso património para aplicar a justiça na convivência pacífica dos povos e na coesão social das democracias. Tratando-se de vários princípios, estão todos orientados para a realização da dignidade da pessoa humana, na sua singularidade e nas múltiplas relações em que está inserida. Apesar de tudo, mesmo aceitando esses princípios, nem sempre se está de acordo na sua aplicação. Daí surgem divergências, por vezes violentas, e o recurso a árbitros e tribunais, cujas sentenças podem divergir e deixar insatisfeitas as partes em oposição.
Nas últimas semanas os meios de comunicação falam muito de violência nas famílias, nas escolas, nas empresas, em alguns países, da fuga de milhares de pessoas à guerra, à fome, enfrentando inúmeras adversidades e até a morte, etc. Agora que se aproximam as eleições legislativas começa a sentir-se muita violência verbal entre os partidos. Espero que não chegue a vias de facto, de modo que se torne possível criar consensos, para viabilizar um governo.
Estaremos condenados a não nos entendermos e serão os conflitos e guerras violentas um destino inevitável? Embora nem todos acreditem e se orientem pela pedagogia de Jesus Cristo, que a Igreja deve seguir e praticar, vou lembrar aqui a razoabilidade de seu conselho, ou mesmo preceito: sede misericordiosos como vosso Pai celeste é misericordioso (Lc 6, 36). Este preceito é exemplificado de muitas maneiras, como na resposta de Jesus à pergunta do apóstolo Pedro sobre quantas vezes se deve perdoar: até setenta vezes sete, ou seja, sempre (cf. Lc 17, 4).
S. Paulo diz isto mesmo no belo hino à caridade ( 1 Co 13, 1 ss): se não tiver amor, nada sou. A caridade, no sentido que Jesus a viveu, dando a vida pelos seus inimigos, é realmente o vínculo da perfeição.
O Papa Francisco acaba de convocar a Igreja para um Ano Santo da Misericórdia e lembra-nos tudo isto de muitos modos. No dia 8 de Dezembro, solenidade da Imaculada Conceição, padroeira e rainha de Portugal, lembrando o 50º aniversário do encerramento do Concílio Vaticano II, o Papa abrirá a Porta Santa na basílica de S. Pedro. Nas dioceses também haverá Porta Santa, nas catedrais e santuários de maior afluência de peregrinos, para possibilitar a todos os católicos usufruir dos benefícios do Ano Santo, sem ter de ir a Roma. Será aberta no domingo seguinte, no 3º domingo do Advento, a 13 de Dezembro.
Como vamos aproveitar na diocese este Ano Santo? Estamos a celebrar um Sínodo e será o último ano e também o meu último à frente desta diocese de Beja. Vem muito a propósito este Ano Santo sobre a misericórdia, pois ela define o modo como Jesus entendeu a sua missão e como a Igreja a deve continuar. Por isso espero que nos preparemos bem para o viver.
2. Mensageiros da misericórdia
Jesus começou a sua pregação apropriando-se das palavras do profeta Isaías sobre a missão do Messias (Lc 4, 18 ss): O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres; enviou-me a proclamar a libertação aos cativos e, aos cegos, a recuperação da vista; a mandar em liberdade os oprimidos, a proclamar um ano favorável da parte do Senhor. Assim proclamou Jesus na Sinagoga de Nazaré, mas os seus conterrâneos ficaram escandalizados e por isso Ele foi para as periferias existenciais da sociedade do seu tempo anunciar e cumprir a proximidade do Reino de Deus. Se lermos os evangelhos, ficamos a compreender o que tudo isso significa e também o que deseja o Papa Francisco com as suas palavras e gestos e agora com a convocatória deste Ano Santo da Misericórdia.
Na Bula Rosto da Misericórdia ele sugere várias atitudes e ações e pede a toda a Igreja, às dioceses, para não se limitarem a celebrações litúrgicas, embora estas devam acompanhar e coroar toda a missão da Igreja. É altura de proclamarmos e praticarmos a misericórdia, sobretudo para com os pobres, os marginalizados, os pecadores, exercitando todas as obras de misericórdia, não apenas as sete corporais (dar de comer a quem tem fome; dar de beber a quem tem sede; vestir os nus; dar pousada aos peregrinos; assistir aos enfermos; visitar os presos; enterrar os mortos), mas também as sete espirituais (dar bom conselho; ensinar os ignorantes; corrigir os que erram; consolar os aflitos; perdoar as injúrias; sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo; rogar a Deus por vivos e defuntos).
Neste elenco estão compendiadas as boas obras, os frutos do nosso amor a Deus e ao próximo, segundo as quais seremos julgados, de acordo com o capítulo 25 do evangelho de S. Mateus. Tudo passa, só o amor de Deus fica. Ou, como se exprime S. João da Cruz: na tarde da nossa vida seremos julgados pelo amor.
De acordo com esta doutrina muita coisa tem de mudar na vida dos cristãos, na família e na pastoral da Igreja. O amor é sempre próximo e concreto. Não pode ficar em palavras ou retórica. Tem de se assemelhar ao do bom samaritano, ao de Jesus. Precisamos todos de nos converter e recorrer ao sacramento da misericórdia de Deus, a confissão, e procurar por em prática a penitência salutar, usando de misericórdia, perdão e reconciliação, como Deus usa connosco.
† António Vitalino, bispo de Beja
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