Igreja Católica
António Marujo | 18 Out 2024
A necessidade – em contraste com a actual carência – de pessoas qualificadas para a área dos bens culturais é o principal problema apontado pelos responsáveis das dioceses católicas portuguesas desta área, sublinhada também por Fátima Eusébio, directora do Secretariado Nacional dos Bens Culturais da Igreja (SNBCI), que na noite desta sexta-feira e sábado de manhã reúne em Leiria o seu Conselho Nacional.
Essa é a preocupação principal que resulta da análise dos principais dados do inquérito feito pelo SNBCI aos delegados e secretariados das 21 dioceses (incluindo a das Forças Armadas e Segurança). Aliás, Fátima Eusébio destaca o facto de todas terem respondido ao questionário como um dado muito positivo.
Os responsáveis dos bens culturais das 21 dioceses católicas sublinham outros factores importantes, resumidos por Fátima Eusébio, que os apresentará nesta noite de sexta-feira, 18, em Leiria: faltam recursos materiais – factor que se tem agravado, tendo em conta que as candidaturas a fundos europeus como o Portugal 2020 e o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) têm sido cada vez mais para os monumentos nacionais; o número de padres é cada vez mais reduzido, com cada um a ter cada vez mais paróquias e sem poder fazer um acompanhamento próximo e contínuo desta área; há uma “grande falta de sensibilidade” seja de muitos padres ou comunidades) para o cuidado necessário com restauros, por exemplo – mas quando há diálogo “todo o processo é fácil”; há uma grande dificuldade de comunicação dentro das estruturas diocesanas; e há uma deficiente formação.
O inquérito do SNBCI pretendeu fazer um ponto de situação das áreas estratégicas dos bens culturais da Igreja, como arquivos, inventário, bibliotecas, museus, catedrais, conservação e restauro, além das estruturas de organização, pessoas disponíveis e recursos.
Com o questionário, pretendia-se, diz a directora nacional, que as dioceses apresentassem as suas dificuldades e fizessem propostas para o trabalho do SNBCI.
“Temos situações muito desiguais”, diz Fátima Eusébio. “Há apenas uma diocese que não tem secretariado diocesano, mas quase metade não tem um único colaborador”. Por isso se compreende que a falta de pessoas qualificadas é a necessidade mais premente, diz.
Noutra área, só duas dioceses fizeram o inventário do seu património em 100% das paróquias: Évora e Portalegre. No caso do Funchal, Vila Real e diocese castrense ele nem sequer está iniciado. Algarve, Lisboa, Porto e Viseu estão entre os 50 e os 65 por cento, enquanto Guarda e Leiria estão perto de 50% e as restantes dioceses abaixo disso. Mas apenas sete dioceses têm técnicos de inventário. E com o inventário, podem organizar-se exposições temporárias, lembra Fátima Eusébio.
Património que é uma herança para todos
A maioria das dioceses já disponibiliza ao público os respectivos arquivos, mas só seis têm técnicos com formação na área, acrescenta. Os museus, que devem constituir-se como uma área muito estratégica para a Igreja, serão uma extensão não só para preservar património, mas devem ser orientados também para proposta de anúncio evangelizador, defende a responsável. Para se ter noção da realidade, há apenas seis museus diocesanos: Algarve, Lamego, Braga, Santarém, Lisboa e Funchal – mas só os últimos quatro têm serviço educativo, uma dimensão hoje fundamental para criar novos públicos.
No caso das catedrais, Fátima Eusébio admite que tem de se caminhar para a cobrança de entradas – mesmo que de valor quase simbólico – fora dos horários de culto. Só dessa forma se poderão pagar despesas de conservação, diz. Oito catedrais já têm acesso pago, outras oito disponibilizam visitas guiadas com pessoas com formação e 13 têm espaço museológico. Algumas já tiveram obras no âmbito do projecto da Rota das Catedrais, mas também aqui é preciso fazer muito mais, como defendeu Carla Varela Fernandes, chefe da divisão para a Rota das Catedrais do Património Cultural -Instituto Público, durante as jornadas desta sexta-feira, realizadas antes do conselho nacional. [ver 7MARGENS]
Fátima Eusébio trabalha nesta área desde 2007, quando o então bispo de Viseu, Ilídio Leandro, a desafiou a criar do zero a estrutura do Secretariado Diocesano. Conhecendo bem o património da diocese, pois a ele tinha dedicado a sua tese de doutoramento, começou a organizar colóquios anuais sobre salvaguarda dos bens culturais da Igreja. E foi depois disso que recebeu o convite para o cargo que mantém, depois de há um ano ter passado a ser também a responsável nacional pela área.
“É muito desafiante trabalhar uma área que engloba tantos aspectos e que não passa só por promover eventos culturais, mas deve propor-se como um activo de evangelização”, afirma a directora do SNBCI. “Temos um património imenso e diversificado, destinado a pessoas crentes e não-crentes, porque é muito diversificado o tipo de gente que passa pelos nossos edifícios”, acrescenta. “O nosso património é uma herança. Teremos cada vez mais dificuldade em encontrar recursos financeiros e por isso devemos investir em que todo o trabalho seja feito com qualidade”, sugere.
No inquérito já referido, há também várias propostas que aparecem: além da realização das jornadas e do retomar do conselho nacional, Fátima Eusébio cita também o relançamento da revista Invenire, criada pela anterior directora do SNBCI, Sandra Costa Saldanha, o recomeço da Rota das Catedrais e a criação de espaços para exposições temporárias.
Realizado pela primeira vez em 2009 e interrompido a partir de 2013, o Conselho Nacional dos Bens Culturais da Igreja tem uma função consultiva do respectivo secretariado.
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