Expulsos pelo Daesh em Agosto de 2014
António Marujo | 24 Out 2024
No dia 6 de Agosto de 2014, o autodenominado Estado Islâmico, ou Daesh, assumiu o controlo das terras bíblicas da Planície de Nínive, no Norte do Iraque. “Quase todos os habitantes daquela região foram para Erbil, no Curdistão iraquiano; as famílias foram dilaceradas como pela explosão de um barril de pólvora”, contava há dois anos o padre Buols Thatbit, pároco em Karemles, aldeia a trinta quilómetros a leste de Mossul, ao Vatican News.
Na altura, cerca de 100 mil pessoas fugiram de suas casas e ficaram a viver em campos de refugiados improvisados. Dez anos depois, o bispo de Erbil, Bashar Warda, vem a Portugal contar como vivem hoje essas famílias de cristãos que foram forçadas a deixar tudo para trás. A convite da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), o bispo participará na “Noite das Testemunhas”, que a AIS organiza pela primeira vez em Portugal. Será na Igreja dos Redentoristas (Rua da Firmeza, 161) nesta sexta-feira a partir das 21h, e o bispo Warda irá também recordar o que tem sido o martírio dos cristãos no Iraque, país que o Papa Francisco visitou em Março de 2021, numa viagem considerada história e uma das mais importantes do seu pontificado.
No sábado, o bispo de Erbil falará na paróquia da Gafanha da Encarnação, a partir das 16h30, após o que celebra missa; no domingo, já em Lisboa, celebra missa na Igreja do Santo Condestável a partir das 10h30, a que se seguirá uma pequena conferência.
O que se passou há 10 anos, recorda a AIS, “deixou bem visível aos olhos do mundo a enorme vulnerabilidade em que se encontrava – e encontra – a comunidade cristã neste país do Médio Oriente”.
A planície de Nínive, que inclui cidades como Mossul ou Qaraqosh, contava com cerca de um milhão e meio de cristãos no Iraque. A segunda invasão do país, liderada pelos Estados Unidos, em 2004, e a ocupação do Daesh, em 2014, fizeram com que muitos cristãos abandonassem o país. Hoje vivem no Iraque apenas cerca de 300 mil cristãos.
Enquanto durou a ocupação, o Daesh destruiu igrejas, capelas, edifícios religiosos e casas de habitação. O padre Thatbit, que fez a cruz com a madeira da igreja de São Adday, colocada no lugar onde o Papa Francisco foi recebido em Mossul, recordava em 2022 que quando Mossul caiu nas mãos dos ocupantes, deixou de haver água e luz. “Antes, apesar da insegurança na região, a situação era bastante calma e os cristãos também tinham aumentado. Depois, em 2014, deu-se o colapso: a diáspora começou e continua até hoje”, contava ele ao Vatican News. “Quando se sai de casa para ir à escola, por exemplo, somos obrigados a passar por bairros ainda completamente destruídos, desertos. O tecido social dissolveu-se: muitos profissionais e médicos fugiram do país; as famílias foram obrigadas a separar-se, algumas ainda estão bloqueadas no Líbano, Jordânia, Turquia sem ter esperança sequer de poder emigrar para o Canadá ou Austrália, como gostariam.”
Na altura, uma campanha de solidariedade da AIS em todo o mundo permitiu dar abrigo aos 100 mil fugitivos – cristãos na sua maior parte, mas também yazidis, seguidores de uma religião com origem na antiga Pérsia. Muitos regressaram a partir de 2017, mas muitos mais procuraram outros destinos.
Uma exposição temporária de objectos religiosos profanados ou destruídos durante a ocupação do território ninivita acompanhará os três momentos do bispo de Erbil em Portugal.
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